PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 17 de maio de 2014.
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 17 de maio de 2014.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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http://blognassif.blogspot.com/
CECAN -CENTRO DO CÂNCER DA SANTA CASA DE PIRACICABA ( INSTITUTO DE ONCOLOGIA CLÍNICA DE PIRACICABA)
Karin Izabel Fitas Loureiro nasceu na cidade de São Paulo a 27 de agosto de 1975, filha de Antonio Augusto Loureiro e Emília Fitas Loureiro. Foi aluna do Colégio Santana, fez magistério no Cefam- Centro Específico de Formação e Aperfeiçoamento do Magistério formou-se em Tecnologia de Processamento de Dados pela Universidade de Guarulhos.
Em que ano você veio para Piracicaba?
Foi no ano de 2005, vim trabalhar no CECAN convidadda pelo Dr. André Moraes para trabalhar na parte de pesquisa clínica.
No que consiste essa pesquisa clínica?
São estudos para a administração de novos medicamentos. Todo medicamento existente no mercado já passou por estudos clinicos. Existe várias fases de estudo de uma droga nova, são fases: 1, 2, 3, 4 e 5. Normalmente fazemos estudos das fases 3 e 4. A maioria dessses estudos envolvem outros países, é um intercâmbio internacional. Geralmente um medicamento já em uso é comparado ao uso e resultados de um novo medicamento. Esses estudos são aprovados pela ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária, pelo Food and Drug Administration (FDA) norte-americano. O Estudo clínico ao mesmo tempo em que é feito no Brasil também se realiza em vários outros países. Há um trâmite regulatório imenso. Um exemplo, a paciente tem câncer de mama, já realizou um tratamento, é oferecida uma outra opção, se a paciente concorda, é feito um contato com uma central, normalmente fora do país, é dado um número aleiatório (randômico) a paciente, o medicamento vem por lote e numeração. Determinada pessoa que recebe esse número, será sempre o mesmo número no mundo todo. Todos os dados do paciente é informado a essa central, menos a identidade. Todos os exames, de sangue, imagem , são analisados no exterior.
Quantos centros de estudos nesses moldes existem no Brasil?
São muitos. Em Barretos, Jaú. Em São Paulo quase todas as faculdades tem esses centros de estudos.
Quantos pacientes o Cecan atende por mês?
Entre quimioterapia e radioterapia por mês são atendidos por volta de 600 pacientes.
Qual a faixa etária dos pacientes atendidos pelo Cecan?
A partir dos 18 anos de idade. Aqui só atendemos pacientes adultos.
A incidência maior de câncer no homem atinge qual parte do seu organismo?
A próstata. Na mulher a mama.
O câncer de próstata tem cura?
Pode ser curado, desde que se faça o tratamento, seja diagnosticado o quanto antes possível, através de exames regulares, assim como o câncer de mama. A mulher ao menos uma vez ao ano deve ir ao ginecologista, pode detectar logo no inicio um câncer de ovário ou de mama.
O Cecan atende aos pacientes da Santa Casa?
Atendemos todos os pacientes da Santa Casa, que necessitem do tratamento para câncer, isso envolve pacientes particulares, conveniados , pacientes do SUS.
A partir do diagnóstico positivo é feito o tratamento que no Cecan envolve quais procedimentos?
A confirmação da existência do câncer se dá através da biópsia. Os pacientes que chegam aqui já fizeram a biópsia. Eles então recebem a quimioterapia, que pode ser venosa ou oral. Ou é feita a radioterapia, que é na própria região afetada. Há pacientes que fazem ambos tratamentos. Muitas vezes é feita a quimioterapia, para diminuir o tamanho da área afetada e depois fazer a cirurgia. De acordo com o resultado da cirurgia o paciente pode retornar para continuar o tratamento.
Há quanto tempo você trabalha no Cecan?
Ha nove anos.
Nesse período você tem visto muitos pacientes com sobrevida?
Bastante! Depende do diagnóstico, depende da doença e o que interfere muito, é a vontade da pessoa de viver. Desde que estou aqui a cada dia aprendo mais, e fica evidente a importância da garra que o paciente tem em querer viver. Isso faz a diferença. E também o apoio da família. Cerca e 70% dos pacientes que atendemos é através do SUS. Muitos deles vem até aqui sem ninguém acompanhando-os. Muitos são com poucos recursos financeiros, tem habitos como tabagismo, fazem ingestão de alcool. Estão bem debilitados. Alguns nunca se cuidaram da forma correta. Outros não tem noção da importância do mal que os acomete. Dizem “tenho aquela doença” não querem dizer o nome. Algumas famílias pedem que não seja dito ao paciente que ele está com câncer. Ele não sabe.
No seu ponto de vista você acha que o paciente tem que ter consciência da doença que têm?
Na minha opinião ele deve saber. Caso o paciente saiba que sua sobrevida é de três ou quatro meses ele irá tomar algumas atitudes que nunca teve coragem de tomar.
A sua função dentro do Cecan qual é?
Sou coordenadora de pesquisa clínica e gerente de Relações Humanas.
Quantos médicos atendem no Cecan?
São oito médicos.Na parte de quimioterapia temos 11 enfermeiros e técnicos. Na Radioterapia temos 6 técnicos. Dois dosemetristas e dois físico-médicos. São eles que fazem os cálculos de doses a serem ministradas nos pacientes.
O tratamento do câncer é de um custo elevado, como vocês mantém esse tratamento?
Recebemos através do SUS, dos convênios.
O Cecan tem uma boa imagem junto a população e a seus pacientes.
O Cecan recebe o paciente para tratamento, ele não vem até aqui para falecer. Temos que atende-lo com alegria, dar carinho, acolhimento ao paciente. Ele tem que se sentir bem aqui. Sem medo ou receio. Tentamos sempre fazer o tratamento confortável. Ele precisa disso. Como cuido do departamento de Relações Humanas procuro incentivar o bom humor entre nosso pessoal. Implantamos entre os funcionários e pacientes um brechó, com a autorização dos responsáveis pelo Cecan. Em um sábado realizamos a venda simbólica dos bens que cada um voluntariamente deu. Com o resultado apurado na páscoa enfeitamos a clinica com motivos alusivos a data e conseguimos dar um chocolate para cada paciente, isso é muito importante para ele: sentiu-se lembrado! No Natal fizemos um bingo. No dia das mães fizemos um evento, chamamos o pessoal da Mary Key que sempre nos apoia, fizemos a semana da beleza, todos voluntários. Enquanto a paciente estava esperando durante a quimioterapia, era feita a unha dela, uma maquiagem, uma massagem. Você sente pela expressão do rosto da paciente que ela está gostando. No ano passado fizemos um show junto com a Regina Gomes, falando da vida de Elis Regina. Foi realizado no Teatro da Unimep. Vieram vários músicos para acompanhá-la no show, um deles toca no conjunto do Roberto Carlos. No mês de junho, durante todo o mês realizo festas juninas, dentro da clínica. Fazemos umas barraquinhas, tudo é decorado como alusões a data, faço pipoca, chá de gengibre, tem paçoca. Fica o dia todo para o paciente comer. Eles adoram. Cria um clima diferenrente do cotidiano. Chegamos a dançar quadrilha com os pacientes. Vestimos um paciente de noivo, uma das médicas foi a noiva. É muito gratificante a reação deles. A alegria deles é enorme com o mínimo de atenção que recebam.
Existem pacientes que permanecem internos?
Não, eles vem e saem todos os dias. Aqui só realizam consultas e tratamento. Procedimentos cirurgicos são realizados dentro da Santa Casa.
Quando um paciente tem um câncer a família fica também doente?
Tem muitas famílias que ficam. Há pacientes que ficam com depressão. A psicologa faz o seu trabalho, muitas vezes tem que cuidar até da própria família do paciente. Para a mulher existe alguns momentos em que ela se abala muito, principalmente quando perde os cabelos. Para algumas é o momento mais difícil do tratamento. Mexe com a vaidade, com a auto estima feminina. Tem algumas voluntárias que vem ensinar a colocar o lenço, como fazer um visual diferente.
O homem é mais depressivo do que a mulher nesses casos?
Eles não demonstram tanto, não exteriorizam, mas na minha opinião são mais depressivos do que a mulher.
Você demonstra uma energia muito forte para trabalhar com essas situações, isso é uma característica pessoal sua?
Acredito que sim, e trabalhando aqui sinto mais motivação em ajudá-los. Existem muitas pessoas necessitando de ajuda, um pequeno gesto já é muito importante para eles que estão muito sensiveis. Tem o caso de um paciente que está fazendo radioterapia hoje, ele mora em uma determinada cidade próxima, o transporte da prefeitura da localidade passa na casa dele as quinze para quatro horas da manhã. Outro dia ele chegou antes das seis horas da manhã e o transporte veio buscá-lo só as sete horas da noite.
E a alimentação desse homem?
Alguns pacientes trazem algo para comer, outros não trazem nada. Simplesmente eles não têm nada para trazer para comer. Muitas vezes pedimos à Santa Casa, eles mandam, a título de caridade. As vezes o paciente passa mal, não em função do tratamento, mas sim porque estava sem comer nada. As próprias enfermeiras acabam comprando um suco, uma bolacha para dar ao paciente.
O Cecan é uma entidade terceirizada da Santa Casa?
Exatamente, mantemos um contrato com a Santa Casa.
O paciente residente em Piracicaba tem transporte que faz sua locomoção?
A prefeitura se encarrega disso. Nossa assistente social, Karina Vieira se encarrega de providenciar isso tudo. Alguns pacientes vem uma vez por mês, pegam o remédio e tomam em sua própria casa.
Há pacientes que persistem em manter habitos que prejudicam sua saúde?
Tem paciente que faz radioterapia, quimioterapia, acaba de realizar o procedimento de tratamento e vai para o lado exterior do prédio fumar pela traqueostomia. (Traqueostomia é um orifício artificial criado cirurgicamente através da frente de seu pescoço e em sua traquéia). A primeira vez que vi não acreditei naquilo. Infelizmente isso existe.
A incidência de câncer está cada vez maior?
Está. A meu ver o stress, a alimentação, a qualidade de vida, isso tudo contribui. O alto nível de consumismo impulsiona o ritmo de vida. O ser humano busca cada vez mais a aquisição de bens sem desfrutar plenamente o que já conquistou. As pessoas se auto impõem um ritmo de trabalho alucinante.
O tratamento realizado pelo Cecan em Piracicaba pode ser considerado equivalente aos procedimentos realizados nos grandes centros?
A tecnologia permite que o mesmo tratamento realizado em renomados hospitais de São Paulo sejam identicos aos procedimentos feitos pelo Cecan. O corpo clínico é altamente qualificado.
Na nossa região há muitos casos de câncer de pele?
Por muito tempo descuidou-se da proteção contra os raios solares. Atualmente a população está mais bem informada, cuida-se melhor. Usam protetores solares, bonés, chapéus. Hoje temos condições de diagnosticar a doença e tratá-la, antigamente a pessoa ia a óbito sem saber o motivo. Há um volume maior de informações, a medicina é mais acessível.
O Cecan pode ser acessado pela internet?
Estamos elaborando nosso site, acredito que até julho deverá estar disponível ao público.
Há uma pré-disposição para o Cecan informar melhor a população sobre o câncer, prevenções e tratamento, em particular em grupos que solicitem esse tipo de informação?
Acredito que sim, nós não temos uma estrutura voltada para esse tipo de trabalho, porém é passivel de estudo formarmos um polo que possa divulgar o mínimo necessário. Grande parte da população não tem a mínima noção do que é uma radioterapia. Um procedimento que geralmente é feito em apenas quinze minutos, por um período pré-determinado. Por exemplo, trinta aplicações uma a cada dia, em um período de trinta dias. São tratamentos dados em dosagem pré-calculadas e dispersos nos correr dos dias. A radioterapia é feita muito para aliviar a dor.
No seu ponto de vista, convivendo com tantos pacientes, você acredita que a pessoa que tem um espírito elevado, popularmente chamado de “alto-astral” é um bom caminho para combater o câncer?
Acredito muito nisso. Já vi muitos pacientes com garra vencerem a doença. Analisando casos percebo que pessoas rancorosas, que guardam mágoas, coincidentemente constituem um número maior de portador de câncer. O inverso também ocorre, pacientes com famílias esfaceladas, problemáticas, mas que mantém o espírito de solidariedade, de auxiliar ao próximo, vencem barreiras enormes.
Vocês fazem o transpante de medula?
Temos profissionais habilitados para isso, mas nessse caso encaminhamos o paciente para São Paulo ou outras regiões que realizem esse procedimento.
Há como clubes de serviços, entidades beneficentes contribuirem com o Cecan?
Pelo fato de atendermos a população nas faixas de A até Z, os voluntários podem contribuirem com o que quiserem. Sempre haverá alguma coisa em possam ajudar. Hoje por exemplo, ganhei duas caixas grandes de bolacha. Vou embalar em pequenas porções e dar aos pacientes. Geralmente os doadores são pesssoas anonimas, familias de pacientes que são tratados aqui, os Doutores da Alegria nos ajudam sempre, estão presentes em todos eventos que realizamos.
Como é a história dos Super Herois?
Pessoas com roupas de super herois iniciaram o seu trabalho na luta contra o câncer infantil, viram que funciona, decidiram fazer visitas para adultos. Você não tem noção da reação dos pacientes. Toda sexta-feira eles vem até aqui, normalmente 10 horas da manhã. Os pacientes ficam fascinados. Até mesmo os mais idosos. É uma animação enorme. Os pacientes adoram. É um momento de descontração, o paciente esquece que está em tratamento. Tem quimioterapia que demora seis a sete horas, com o paciente sentado na poltrona, se você fizer um bingo das 9 horas da manhã até o meio dia o paciente não percebe o tempo passar. Alguns acabam o tratamento e permanecem jogando. Outro não é o dia de ele vir ele vem para participar do bingo. A carência deles é enorme. Na minha opinião a população pode ajudar mais.
Quem quiser colaborar pode procurar você aqui no Cecan, que fica anexo a Santa Casa de Piracicaba?
Pode me procurar que dependendo do que a pessoa for fazer eu ajudo. Vamos criar, fazer.
Uma contadora de histórias pode vir até aqui?
Apoio e ajudo no que for necessário.
Existem muitas famílias que apoiam o paciente, mas existe também famílias que abandonam o paciente?
Existe sim, são famílias que internam o paciente e o deixam internado na Santa Casa. Muitas vezes o paciente tem alta eles nem vem buscar.
São pessoas carentes?
Acredito que todos são carentes de afeto, mas nesses casos são pessoas que também são carentes financeiramente. Há paciente que vem sozinho, nunca vimos ninguém da sua família. Atualmente a demanda para tratamento é muito grande.