PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 19 de julho de 2014.
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
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Sábado 19 de julho de 2014.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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ENTREVISTADO: FRANCISCO DE ASSIS DANTAS
ENTREVISTADO: FRANCISCO DE ASSIS DANTAS
Simpático e sorridente, características que marcam aqueles que abraçam a profissão, Francisco de Assis Dantas nasceu em Ituverava a 5 de março de 1956, filho de Jorcelino Pereira Dantas e Maria Augusta da Silva Dantas pais de onze filhos: José, Otila, Alcino, Sebastião, Juvercília, João Natal, Cassiano, Luiz, Odila, Almiro e o caçula Francisco. Francisco de Assis Dantas casou-se a 13 de junho de 1980 com Marineusa Generoso Dantas, são pais de Daniela com 33 anos e André com 31 anos. Em 2013 Francisco de Assis Dantas representou o Brasil em um Congresso Mundial de Hotelaria e Alimentação em Genebra, reunindo 179 países. É Vice-Presidente da Federação dos Empregados do Comércio Hoteleiro do Estado de São Paulo.
O seu pai exercia qual profissão?
Meu pai tinha uma venda na beira da estrada, era pouso de boiadas. Havia um pasto que era alugado para deixar os animais, os peões pernoitavam até seguir viagem no dia seguinte. Havia um campo de boche, um campo de futebol, quando mudamos de lá eu tinha sete anos. O meu primeiro ano de escola eu estudei lá. A professora era Dona Teresa, mais conhecida como Terezinha. Tinha um fazendeiro que morava nas proximidades, o Seu Antonio Henrique, foi ele quem construiu a escola dentro da sua fazenda. Meu pai vendeu o armazém e adquiriu um sítio de 21 alqueires na região de São José do Rio Preto, no município de Nhandeara. Isso foi em meados de 1962. Lá meu pai cultivava a terra, os filhos ajudavam. Eu era o menor, ia a pé até a escola que ficava a quatro quilometros de distância. Era a Escola Mista do Bairro Córrego da Areia., onde estudei até o quarto ano primário. A seguir fiz o curso de admissão em Nhandeara para poder fazer o ginásio. Nós faziamos o percurso até a escola a pé. Naquela época a área rural era bastante habitada. A criançada ia junto até a escola, com chuva, sem chuva, não havia merenda escolar, minha mãe preparava um caldeirãozinho com arroz, feijão, ovo frito, carne e eu levava para a escola. A escola funcionava meio período, quando retornava ao sítio, meu serviço era cuidar dos animais. Alimentá-los. Com nove a dez anos já fazia isso. Meu pai tinha um cavalo branco, o Gaúcho. Meu pai tinha um carinho muito grande por aquele animal. Naquela época não existia brinquedo industrializado, nós improvisávamos. As vezes iamos rolando um pneu para a escola. Usávamos o embornal (ou “emborná”) feito de tecido de saco de açucar, era o equivalente a mochila que os estudantes levam atualmente. Na época não existia a mochila que conhecemos atualmente.
O senhor chegou a concluir o ginásio?
Conclui. E fui trabalhar na roça. Nesse período minha mãe teve um AVC, ela tinha a doença de Chagas . (Alargamento das ventrículos do coração levando a insuficiência cardíaca). Meu pai para poder cuidar melhor da minha mãe, vendeu o sítio e adquiriu uma casa em Campinas, no Jardim São Vicente. Isso foi em 1972. Os irmãos mais velhos vieram primeiro e por algum tempo foram morar com dois irmãos do meu pai que já residiam em Campinas. Eu tinha a experiência de ter trabalhado no sítio. Em Campinas fui trabalhar em uma banca de revistas situada na Praça Carlos Gomes, o prprietário era o Seu Romeu. Era conhecida como Banca do Romeu. Sempre gostei de ler. Meu sonho era ser mecânico. Em 1974 minha mãe faleceu. Seis meses depois meu pai faleceu. Ficamos em casa trê filhos e uma filha, os outros irmão já eram casados. O meu sonho de continuar estudando parou por ali. Minha irmã, Odilia conheceu um rapaz chamado Ismael, e vieram a se casar. O Ismael trabalhava como garçom no Restaurante Rosário em Campinas. Meu irmão Cassiano também trabalhava como garçom.
Quanto tempo o senhor permaneceu trabalhando na banca de revistas?
Foi em torno de um ano. Em seguida fui trabalhar na Fábrica de Móveis Zanolini, situada no centro de Campinas, na Rua José Paulino, 515. Entrei como ajudante, fui promovido para a pintura, laqueava os móveis com o uso de revolver de pintura. Fui transferido para um departamento onde o pessoal fazia os entalhes de madeira. O Seu Orlando foi quem me ensinou a trabalhar. Aprendi a fazer entalhes, de ajudante passei a entalhador. Trabalhei um período como entalhador. O Ismael, na época ainda namorado da minha irmã, dizia que eu ganhava muito pouco na fábricade móveis. Nos anos dourados os garçons ganhavam muito bem. Ele me convidou, fui trabalhar como cumim no Restaurante Rosário (Ajudante de garçom; aquele que auxilia o garçom, ou maitrê, antes e depois de por a mesa.).
O que servia o Restaurante Rosário?
Até hoje, o Restaurante Rosário é um dos melhores restaurantes de Campinas. Os proprietários eram Sr. Jair e Sr. Euclides. Funcionavam o restaurante, a pizzaria e o Bar Rosário todos freqüentados pela elite da cidade. Nós usávamos o termo “Mise en place” (pronuncia-se “miz on plas”) é um termo francês que significa “pôr em ordem, fazer a disposição”. O termo também é utilizado para a montagem da mesa, quando se deve colocar os talheres, taças e pratos, bem como os outros utensílios, que serão utilizados para degustar e saborear os alimentos. A mise en place é sobretudo função do garçom. O Restaurante Rosário era uma escola de fato, na época já era usada gravata borboleta, só que não adquirida com o nó pronto, era uma gravata comprida que os garçons davam o nó transformando-as em borboleta. Os garçons usavam gravata preta e os comuins gravata branca. Todos usavam calça preta, smoking branco, sapato preto, meia preta, camisa branca de piquet, uma faixa preta na cintura.
O cliente olhando de frente para o prato de que lado ficam os respectivos talheres?
A faca fica do lado direito e o garfo do lado esquerdo. O garfo apoia a carne com a mão esquerda e a faca corta com a mão direita. Em uma mesa básica coloca-se um copo para àgua, à direita do prato, no centro da mesa. Era habito antigamente servir uma sopa de entrada então era colocada a colher. Vinha o garfo de peixe, faca de peixe, garfo e faca de sobremesa.
Em uma mesa quem deve ser servido primeiro?
Se uma mesa tem criança é servida em primeiro lugar. Depois a senhora e por ultimo o senhor. Outra coisa que deve ser observada é a idade dos integrantes da mesa. Se tiver jovens e idosos na mesa, primeiro deve serem servidos os idosos.
Quanto tempo você permaneceu no Restaurante Rosário?
Sai logo que completei dezoito ou dezoneve anos Para passar a ser garçom no Restaurante Rosário só havia duas possibilidades: ou um gaçom pedia a conta ou falecia. Não havia vaga. Quem trabalhava no Restaurante Rosário era altamente conceituado na cidade. Ganhava-se muito bem. Como cumim ia para casa de taxi todas as noites após o trabalho. Eu queria trabalhar como garçom, a melhor opção que encontrei foi através de um maitre de restaurante chamado Cláudio, ele era gerente de uma casa noturna em Campinas, chamada Apocalipse o proprietário é uma pessoa de extremo bom gosto, chama-se J. D’ávila, ele montou uma casa muito requintada no auge da discoteca, era frequentada pela alta sociedade de Campinas. Nessa boate, quando chegávamos para trabalhar, o Cláudio Brito alinhava os garçons, olhava as unhas, pegava algodão, passava na barba, se ficasse preso o algodão tinha que ir fazer a barba. Tinha que levantar a calça para ver se estava de meia preta. A fase da discoteca passou ele transformou o Apocalipse em uma boate altamente requintada, só com bebidas importadas, shows de grandes nomes como Jô Soares, Ary Toledo, Cauby Peixoto e outras estrelas da época. Com isso conheci muitos artistas de renome nacional. Atualmente o J. D’ávila é o empreendedor da Limelight em São Paulo.
Quanto tempo você permaneceu no Apocalipse?
Trabalhei seis anos no Apocalipse.
O sindicato promove algum curso de qualificação profissional?
Nós já promovemos vários cursos de formação de garçom, garçonete, barmam temos mantido conversações com o sindicato patronal. Há uma necessidade muito grande da qualificação da mão-de-obra. Acontece um fenomeno na área. A carga horária são de oito horas diárias. Quarenta e quatro horas semanais. Isso é previsto pela CLT. Só que na prática isso nem sempre acontece. O garçon entra para trabalhar no almoço, ele acaba tendo um espaço das três às seis horas da tarde, volta, serve o jantar, chega em casa a meia noite ou uma hora da manhã. E aí é que vem o problema, grande parte das empresas acabam não pagando as horas extras, adicional noturno. O trabalhador nosso está a disposição da empresa aos sábados, domingos, feriados, de dia, a noite, a folga dele é no meio da semana. Eu não acompanhei o crescimento dos meus filhos em função do trabalho. Devido o longo tempo de permanência do profissional em seu ambiente de trabalho, no seu único dia de folga ele não tem disponibilidade ou disposição para frequentar um curso de aperfeiçoamentro. Nosso pedido ao sindicato patronal é que libere o profissional, em horario de serviço, remunerado, nem que seja ao menos um curto período diário para que ele faça um curso, que irá trazer benefícios diretos à empresa. Uma empresa com pessoal qualificado tem enormes vantagens sobre uma empresa que não tem nenhuma qualificação. O retormo é visivel.
Ao seu ver não é uma forma contraproducente para o empresário que age assim, uma vez que o garçom é o cartão de visitas do restaurante e ele já vai atender ao cliente extenuado por uma carga de trabalho bastante pesada?
No ano passado é que saiu um projeto de lei para aposentadoria por tempo de serviço especial. O garçom fica um número de horas muito grande em pé. Sem poder encostar em nada. Sem poder sentar-se. Isso causa muitos problemas de saúde, como varizes, problemas na coluna, tendenite no braço em função de levar as bandejas. O garçom tem que sempre estar sorrindo, entender um pouco de futebol, de novela, muitas vezes é um conselheiro. Há certas regras básicas de comportamento do garçom, não deve tocar no cliente, não usar perfume, tem que usar desodorante neutro.
Existem garçons que se tornam intimos de alguns clientes isso é bom?
Eu mesmo tive clientes que se eu saisse de determinado restaurante e fosse para outro o cliente me acompanhava. Isso é uma questão de empatia.
Como é de fato a história dos dez por cento acrescidos ás despesas do clinte junto ao estabelecimento?
Os dez por cento é um costume , uma tradição. Muitos denominam de gorjeta. Pessoalmente discordo dessa denominação. Vejo mais como uma comissão de venda, ela é compulsória. Não é expontânea. Existe um projeto a respeito que está tramitando. Desde que estou nessa profissão são cobrados os dez por cento mas não é legalizado. As empresas cobram, muitas vezes nem repassam aquilo para o trabalhador, isso existe justamente pela empresa não possuir mão de obra qualificada. Tem empresa que recruta um jovem, ele vai carregar uma bandeja, sem conhecimento nenhum. Ele não sabe que se estou comendo peixe devo beber um vinho tinto ou branco.
Como você transferiu-se para Piracicaba?
Os Shopping Centers começaram a aparecer no Brasil, isso em 1978,1979, em São Paulo havia o Shopping Iguatemi. Quando veio o Shopping Igatemi de Campinas o o J. D’ávila abriu uma lanchonete chamava-se Hobby`s, era muito requintada. A medida que os shoppings foram abrindo ele foi abrindo as lanchonetes, dia 21 de outubro de 1987 foi inaugurado o Shopping Piracicaba. Ele montou uma lanchonete aqui. Eu estava morando em Campinas. Eu nem conhecia Piracicaba. Uns 15 dias antes de inaugurar o Shopping Piracicaba vim para trabalhar na lanchonete, fiquei responsável pelo salão da lanchonete e treinando o pessoal daqui.
Hoje você é presidente do SINTCHOSPIR- Sindicato dos Trabalhadores no Comércio Hoteleiro, Bares, Restaurantes, Hotéis, Motéis, Lanchonetes, Apart-Hotéis e Fast Food de Piracicaba e Região.
Eu trabalhava no Shopping, em 1987 ainda era associação, não era sindicato, um amigo era associado e queria me trazer para cá. O presidente era Orlando Venâncio de Melo, uma pessoa com grande experiência na área, nessa época a sede do sindicato ficava na Rua do Rosário. A Associação foi fundada em 24 de fevereiro de 1986, foi reconhecido como Sindicato pelo Ministério do Trabalho em 22 de março de 1990. Conheci melhor o Seu Orlando, vi que era uma pessoa atenciosa, criamos uma amizade, ele me chamou para fazer parte da diretoria. Fiquei como diretor, mas não afastado, era diretor mas continuava trabalhando na empresa. Com o transcorrer do tempo passei a me dedicar cada vez mais ao sindicato. Faleceu o tesoureiro do sindicato, como primeiro suplente assumi a tesouraria.
Quantas cidades abrange o sindicato?
São as seguintes cidades: Àguas de São Pedro, Americana, Charqueada, Cosmópolis, Divinolândia, Ipeúna, Itobi, Leme, Piracicaba, Porto Ferreira, Rafard, Rio das Pedras, Saltinho, Santa Barbara D`Oeste, Santa Cruz das Palmeiras, Santa Gertrudes, Santa Maria da Serra, São José do Rio Pardo, São Pedro, São Sebastião da Grama, Tambaú, Tapiratiba, Vargem Grande do Sul. Temos um diretor afastado em Americana, em São Pedro, em Porto Ferreira. Em Leme temos um funcionário que administra. Aqui eu, Edmilson e Marcos, somos no total seis diretores afastados. Somos filiados a Força Sindical.
Quantos associados o sindicato têm em média?
Em torno de 3.500 associados.
Quais beneficios o sindicato oferece aos associados?
Temos serviço odontológico gratuito, há uma parceria com a Unidonto onde 4 profissionais trabalham nas dependencias do sindicato. Temos um laboratório de informática com aproximadamente 160 alunos que frequentam as aulas. É um curso gratuito com alunos adultos, jovens e crianças. Há um convenio médico com a Amhpla. Temos uma colonia de férias na Cidade Ocian, na Praia Grande com 52 apartamentos. Há convenios com auto-escolas, salões de beleza, farmácias, clínicas, há um manual com 20 páginas de profissionais e empresas conveniadas, só nas cidade de Piracicaba, Americana, Santa Barbara Dòeste, Leme, São Pedro, Águas de São Pedro e Porto Ferreira.
Hoje há uma informatização muito acelerada dentro da profissão de garçom?
Sim, sem duvida. Em alguns lugares o garçom atende com laptop se não dominar a tecnologia está fora do mercado de trabalho. O cliente faz o pedido, ele digita, uma impressora já imprime o pedido na cozinha.
Existe escola de garçom?
Garçom não é reconhecido nem como profissão! Não é regularizada!
Mas como pode ter registro em carteira de trabalho?
Temos coisas que não conseguimos entender. Não é regulamentada mas existe na CBO- Classificação Brasileira de Ocupações. (A CBO em seu histórico de ocupações inclui Garçom, Garçom (serviços de vinhos), Cumim, Barman, Copeiro,Copeiro de hospital, Atendente de lanchonete, Barista).
Quando é o dia do garçom?
Eu consegui negociar aqui em Piracicaba, na convenção coletiva para que toda empresa seja obrigada a pagar ao seu trabalhador um dia de serviço a mais no mês de agosto. No dia 11 de agosto considerado o “Dia da Pendura” é o Dia do Garçom, comemora-se também o dia da categoria hoteleira
Quantas bandejas você consegue carregar?
Trabalhando não ha possibilidade de usar duas bandejas, Uma mão tem que ficar livre para servir. Para recolher, quando é churrascaria, o pessoal usa uma bandeja grande vai calçando um prato no outro, faz uma armação, uma pilha de pratos, carrega o que aguentar, porque prato é pesado. À la carteeu consigo carregar seis pratos com alimentos, obviamente que depende do tipo de alimento, tem alimento que não é possivel ser levado nessa quantidade de pratos.