PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 28 de abril de 2018.
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 28 de abril de 2018.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADO: ÉSIO ANTONIO PEZZATO
Ésio Antonio Pezzato nasceu a Rua Visconde do Rio Branco, 1281, Piracicaba, a 3 de dezembro de 1952, é filho de Lásaro Pezzato e Maria Virginia Rizzi Pezzato.
Você pratica atividade física regularmente?
Tenho uma boa disposição física: vou a Pirapora do Bom Jesus (Pirapora) a pé, já fui 51 vezes, desde 1968, são 120 quilômetros. Quando era mais novo levei uma cruz de 100 quilos, sem rodinha atrás. Arrastando pelo chão, eram 10 metros de vigota de peroba 12 por 6. Naquele tempo não tinha pinus. Demorei 8 dias para chegar em Pirapora. Foi do dia 10 de janeiro a 17 de janeiro de 1980. Ando todos os dias 15 quilômetros, às vezes 30 quilômetros no dia. Vou de Piracicaba até Rio das Pedras e volto, saio às 5 horas da manhã às 10 horas estou de volta. Já fui mais de 200 vezes.
Você levava mochila?
A mochila ia dependurada na cruz. Comida havia nas paradas, tinha que levar muita água.
E Santiago de Compostela?
Para Santiago de Compostela, cidade e município no noroeste de Espanha, fui duas vezes, estou me preparando para ir a terceira. São 814 quilômetros, fiz em 30 dias, agora vou fazer em 32.
Qual é a sensação que você sente nessa caminhada?
Seu mundo está lá! Você encontra o mundo no Caminho de Santiago de Compostela. Pessoas de todas as idades, diferentes classes e poder aquisitivo, ali somos todos iguais. Cada cidade pelo caminho tem albergues. No total, entre pequenas vilas, lugarejos e cidades existem 180 lugares de parada no caminho. Em pelo menos 170 tem lugar para se hospedar. Alguns são pagos outros são gratuitos. Tem banho, alimento às vezes eles fazem, tem cozinha, vou até a tenda compro os ingredientes e faço a minha comida. Encontrei um casal que mora no Oriente Médio já há 18 anos, começamos a conversar e logo descobrimos que somos brasileiros, em seguida que a filha deles mora em Piracicaba! Estava em lugar chamado Sebrero, passa um moço por mim, com um castelhano diferente, pergunta-me se posso olhar sua bicicleta. Logo percebi que era brasileiro, perguntei-lhe onde morava no Brasil, ele achou que eu não conhecesse a cidade, disse que era de Piracicaba. Perguntei o nome do seu pai. É filho do Dr. Zago!
Plano geral do Caminho de Santiagp de Compostela
E bolha no pé?
Eu não gosto! Não dá porque eu não gosto! (risos). Mas levo todo aparato: Rifocina, agulha com linha, Uso tênis e chinelo havaiana, com meia. O cajado ajuda a seguir em descida e impulsiona na subida.
E quando termina a caminhada, o que você sente?
Ao mesmo tempo em que é uma vitória, é horrível! Você acorda pela manhã e não tem que andar! Você fica 30 dias ou mais andando, você esquece-se de veículos, que tem que olhar para atravessar a rua. Aqui a vida continuou. Ela parou para mim lá. Você não irá encontrar Santiago lá. O Santiago que você encontrará é aquele que esta dentro de você. É um caminho que tem 1200 anos.
Seu pai trabalhava em qual atividade?
Meu pai faleceu no dia 26 de outubro de 1987 aos 73 anos, ele trabalhou na Companhia Telefônica Brasileira CTB, ficava inicialmente na Rua XV de Novembro, ocupava até a Rua Rangel Pestana, ao lado ficava o Curso Preparatório da Dona Amália. Depois a Companhia Telefônica mudou para CIPATEL, a Rua Voluntários de Piracicaba, 666. Do lado oposto, onde depois foi construído o novo prédio da CIPATEL Companhia Telefônica de Piracicaba.Minha mãe é um furacão! Trabalhou como empregada doméstica na casa da Dona Branca Motta de Toledo Sachs e depois trabalhou na Fábrica de Tecidos Boyes até quando ela se casou e teve a minha irmã mais velha. Somos quatro filhos: Regina, Dalva, Ésio e Maria Helena.
Você estudou em quais escolas?
O primário eu fiz no Sud Mennucci e terminei no Grupo Escolar Alfredo Cardoso em 1963. Minha primeira professora foi Therezinha Ferraz do Canto Kraide, a do segundo ano foi Maria Boloni Sávio, do terceiro ano foi Maria Aparecida Machado e a professora do quarto ano foi Dalva de Oliveira. No preparatório foi Dona Maria Tarsia, Entrei para o ginásio, onde tive muitos professores, lembro-me do nome de todos.
Conheceu o Professor Benedito de Andrade?
Conheci, ele não foi meu professor, Fizemos parte do júri de um concurso de poesias. Ele me fez um elogio que está na contracapa do meu primeiro livro.
Quantos livros você já publicou?
Tenho quinze livros publicados. Umas 40 antologias. Tenho mais de 300 prêmios literários em muitos Estados do Brasil e fora do Brasil também, em Portugal, Almancil e Seixal. Já fiz a loucura de subir em um banco em uma rua de Lisboa e declamar Guerra Junqueiro (Abílio Manuel Guerra Junqueiro).
Guerra Junqueiro (Abílio Manuel Guerra Junqueiro).
E faturou uns trocados?
Viram o meu chapéu, colocaram umas moedas dentro! Declamei “Fiel” e “Melro”. ( Ésio declamou entre outras, essas duas poesias, no Recanto dos Livros, espaço cultural do Lar dos Velhinhos, com entrada franca,evento que realiza-se uma vez ao mês, sempre trazendo convidados de alto nível cultural. Participam moradores e todos aqueles que buscam momentos de cultura e diversão. Nessas declamações a platéia composta por homens e mulheres foram as lágrimas).
Qual é a sua profissão?
Sou professor de literatura, não dou mais aula. Trabalho como funcionário público faz 21 anos. Tenho mais de 40 anos de contribuição com a previdência, já tenho tempo de trabalho para aposentar-me. Trabalho por hobby, ficar em casa o dia inteiro não tem o que fazer.
E fazer poesia?
Poesia não dá dinheiro!
É um fenômeno brasileiro?
É mundial! A época não é mais de poesia. Agora quem faz sucesso são cantoras que mostram o corpo, homens que viram mulheres, mulheres que viram homens. Grandes compositores como Chico Buarque, Caetano Veloso não tem suas músicas tocadas nas rádios. É tocado o que estamos ouvindo, a televisão tem uma influência enorme nesse fenômeno. Um livro custa muito caro, vamos imaginar que um livro custe 40,00 reais, uma televisão custa 2.000,00 reais, você assiste com a sua família 7 a 8 horas por dia, durante 10, 15 anos. Essa televisão sai por centavos. Duas pessoas lendo um livro de 40,00 reais passam a custar 20,00 reais para cada leitor. Não falta o poeta! Não falta o livro! Falta o leitor! Como eu posso em uma cidade com 400.000 habitantes como Piracicaba, fazer a edição de um livro “Os Caipiras”, um livro interessante onde conto toda a história de Piracicaba, uma edição de 1.000 livros deveria acabar, não é? Meus livros mais vendidos foram “O Evangelho” e “Os Caipiras”. Mas temos que considerar que é pouco! Em uma noite de autógrafos vendo de 100 a 150 livros, e eu sou conhecido! Única pessoa em Piracicaba que tem o epíteto de poeta.
Você é o sucessor de Lino Vitti, o “Príncipe dos Poetas Piracicabanos”?
Se não sou o sucessor estou no caminho que ele trilhou, ele me ensinou, foi meu mestre. Lino Vitti foi eleito Príncipe dos Poetas Piracicabanos pela Academia Piracicabana de Letras. Desde o falecimento do Lino, há dois anos, não foi realizada uma eleição para Príncipe ou Princesa dos Poetas. Alguns acham que essa eleição não deve ocorrer, outros apóiam a eleição. A meu ver, deve ser realizada uma nova eleição, onde seja analisado o passado da pessoa. Se alguém tiver o passado maior e melhor do que o meu eu vou ficar quieto.
Você tem uma memória espantosa, muito acima do que vemos normalmente. Você tentou investigar cientificamente a origem dela?
Eu acho que sou normal!
Que você é normal todos nós sabemos! Pelo menos eu não conheço alguém que declame horas a fio!
Eu também não conheço! Sei minhas 400 poesias de cor! Hoje apresentei “O Evangelho”, só que apresentei apenas 250 versos! (Sem ler, apenas declamando). No total “O Evangelho” são 1.500 versos! Assim como “Navio Negreiro”, declamei uma parte, existe outra parte! “Vozes, D’África”, “Livre América” sei inteiras. Sei dezenas de sonetos, meu, de Vinicius de Moraes, Olavo Bilac, Augusto dos Anjos, Machado de Assis, sei um pouco de bastante coisa.
Você chegou a freqüentar algum ambiente fora de Piracicaba?
Já fui! Uma vez dei uma palestra em Santos, era para durar 50 minutos, fiquei quatro horas falando, ninguém me deixava parar. Presente estava um Desembargador Dr. Eldar, a palestra começou as 8 as 11:30 ele levantou a mão, pensei que ele fosse fazer alguma pergunta, ele disse-me: “-Meu filho! Nunca vi inteligência igual! Cada pergunta que foi feita aqui você sabe aonde a pessoa nasceu, o dia em que ela nasceu, o ano em que ela morreu, o meio em que ela viveu. Você dá exemplos, você não fala, dá todo um jantar completo da pergunta que foi feita. Não conheço isso!¨ Respondi-lhe: “-É que eu gosto!”, ele disse-me: “-Eu também gosto! Mas eu não sei!”
O que você acha que está faltando? Divulgação?
Falta divulgação! Foi anunciado a muitos veículos de comunicação de que estaria no “Recanto dos Livros” no Lar dos Velhinhos, no entanto nem toda a mídia veiculou o evento. Considero-me ainda assim privilegiado, tenho muitos amigos nas mais diversas mídias, que divulgam. Mas e quem não tem essa facilidade? Talvez tenha poetas melhores do que eu e ninguém sabe.
Não é contraditório um país como o nosso, carente de cultura, ter disposições como a sua para levar cultura e não encontrar apoio?
Eu vim até o “Recanto dos Livros”, graciosamente, mas alguém ofereceu café, salgadinhos (Os voluntários ofereceram um modesto cafezinho). A mídia, quer o retorno financeiro, vira um ciclo. Não tem almoço de graça!
Se alguém quiser adquirir algum dos seus 15 livros ou das 50 antologias como deve fazer?
Não tenho mais! Vi aqui no “Recanto dos Livros” algumas obras minhas. Não tenho mais livros para vender, sou uma pessoa agraciada, vendo todos os meus livros. Tenho um blog na internet http://esiopoeta.blogspot.com.br/ lá tem todos os meus livros, tem livros inéditos, literatura de cordel, tem livro de poesia de forma fixa, são poesias que existem no mundo poético, mas como o soneto é uma forma fixa, 4,4, 3 e 3, a balada francesa é um poema de forma fixa, se a linha métrica dela for de 8 versos, 8 sílabas métricas, então deve ter 8 estrofes, 8 por 8. E tem que ter 3 estrofes de 8 e 1 de 4 que é o envio, a oferenda, a oferta. Se ela tiver versos de 10 sílabas, ela tem que ter estrofes de 10 sílabas. Existe todo um esquema rimário, Para a de 10 sílabas, por exemplo, é a,b,b,a,a, c,c,d,d,c. Se é de 8 nunca pode ser em oitava rima, oitava rima é aquele clássico de Camões: a.b.a,b,a,b,c,c mas tem que ser a,b,a,b,b,a,b,a,a,b,a,b,c,d, cd, Sendo que o último verso tem que ser sempre igual nas quatro estrofes. Existe o Canto Real que são cinco estrofes, de 11 versos, e o envio final que pode ser de 5 ou de 6 versos, existe o triolé que tem 8 versos. Existe o Pantun que é um poema criado na Malásia e Victor Hugo trouxe para a literatura francesa. Para o Brasil quem trouxe o Pantun foram Alberto de Oliveira, Olavo Bilac, Gustavo Teixeira.
Qual é a sua opinião sobre Gustavo Teixeira?
A poesia dele é interessantíssima! Usa um vocabulário dificílimo. Tem os cacoetes, quando fala violeta vem borboleta. Isso na obra completa dele inteira. Acho que Ementário, publicado em 1908 é um livro bastante interessante, tem algumas poesias maravilhosas: Cleópatra; Na Várzea; Tempestade; Leda e Tântalo. Eu sabia de cor esses poemas. A obra dele só veio a ser publicada pela segunda vez em 1925, com Poemas Líricos. Mas são anacronicas, ele usou a mesma coisa de 1908, ele não cresceu. Em 1908 estava no fim o parnasianismo, em 1925 estava um parnasianismo ultrapassado. Em 1937 ele fez O Último Evangelho, uma coleção de 107 sonetos alexandrinos, uma técnica também ultrapassada, mas tem alguns sonetos maravilhosos! Alguns nem tanto. Nenhum poeta consegue ser bom em tudo. A arte de um poeta se resume a 10, 15 poesias. A não ser que seja um grande gênio. Machado de Assis foi um grande romancista e um poeta frustrado! Ele durante sua vida inteira queria ser poeta. A obra poetica dele é grande, ressalto “A Mosca Azul” ; “Circulo Vicioso”; “A Carolina”e “Soneto de Natal”. Olavo Bilac tem umas 10 poesias que são mais do que inspiração, é uma coisa etérea. Eu devo ter umas 4 ou 5 que são interessantes. Me coloco dentro da minha limitação. Sou um poeta que gosta de poesia. Procuro fazer aquilo que melhor eu consigo fazer. Se não faço melhor a culpa é minha, eu não sou gênio.
E Francisco de Castro Lagreca ?
Foi um poeta fantástico! Ele morava a Rua Bom Jesus esquina com a Rua XV de Novembro. Era a esquina mais famosa da cidade: de um lado Lagrega, de outro lado Dona Branca, do lado de baixo Arquimedes Dutra e Dona Zoraide e o Colégio Sud Mennucci. Eu tenho um pouco de Lagreca no tipo caipira que ele fez. Ele tem um poema que fez quando Pádua Dutra faleceu em 1939 que é um “monstro” de poema! Fez outro poema para a Revolução Constitucionalista de 1932, tem algumas páginas maravilhosas. Um grande poeta de Piracicaba é o Professor Newton de Almeida Mello autor do Hino de Piracicaba. Ele tem um livro chamado “Carrilhões”. É um livro maravilhoso. O chamado “véu da noiva” não são as águas que caem do Mirante, próximo ao Engenho Central. O “véu da noiva” é a névoa das noites piracicabanas, que sobrem do salto quando o rio está cheio. A expressão foi usada pelo poeta Brasílio Machado, quando, num de seus poemas, chamou Piracicaba de “Noiva da Colina”. Tendo a névoa matinal do rio se prolongando à maneira de um véu, escreveu em Madressilvas, seu primeiro livro, o poema Piracicaba, em versos alexandrinos, o qual assim se inicia:
Comecei como revisor no Jornal de Piracicaba a 14 de janeiro de 1972, fiquei até 1974, quando fui trabalhar para a Xerox do Brasil. Fui para o setor de cobranças, ganhando três vezes mais do que ganhava antes. Na época eu tinha um Fusca 1972, amarelo, placa RM6174.
Você é casado?
Sou casado com Ana Maria Morales Fogaça, filha de Leonidas Fogaça, herói da Revolução de 1932. Ana e eu temos os filhos: Thaís, Thales e Ésio.
Você tem retratos pintados por artistas famosos?
Fui muito amigo de Arquimedes Dutra que pintou o meu retrato; do Renato Wagner que pintou o meu retrato; do Pacheco Ferraz que pintou o meu retrato. Eu gosto da arte.
Você freqüenta escolas?
Recebo muitos convites para dar palestras em escolas, faculdades, universidades, clubes. As pessoas, parece que estão descobrindo o meu trabalho. Quando as pessoas me vêem declamar ficam hipnotizadas. (Enquanto Ésio declamou muitos ficaram imóveis, espantados, suas poesias como ópera tocaram fundo os sentimentos dos presentes, lágrimas furtivas, boca entre abertas, silêncio total).
Qual é um epitáfio próprio para um poeta?
Quero que ponha que sou poeta. “Aqui jaz o Poeta Ésio Antonio Pezzato”. Mas vai demorar! Só vou falecer no dia 20 de fevereiro de 2041, aos 89 anos.
Você tem alguma clarividência?
Tenho! Funciona!
Você usa pseudônimos para escrever?
Uso muitos! Inclusive de autora: Samantha Rios. Outros são: Manoel Cançado, Clara Cançado, Martinho Nogueira, Martinho Chaves,
Você já fez alguma poesia causticante que tenha provocado a ira de alguém?
Já! Eu era diretor social de um clube da cidade e publiquei uma poesia, erótica, mas não pornográfica. Uma senhora zelosa dos bons costumes, horrorizada ligou para o clube, dizendo que eu não poderia mais ocupar o cargo de diretor de um clube tão tradicional. (Ésio declama o poema, com maestria transmite o sentimento natural entre um homem e uma mulher, sem cair na vulgaridade).