PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 12 de NOVEMBRO de 2016.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/ 
ENTREVISTADA: MARIA DO CARMO BROCHINI ALVES MARINO

Maria do Carmo Brochini Alves Marino nasceu na cidade de Rio Claro a 17 de julho de 1934. Seus pais são Pascoal Hercules Brochini e Guiomar Baumgartner Brochini, tiveram nove filhos: Maria do Carmo, Mário Jesuino, Maria Helena, José Sérgio, Pascoal Roberto, Maria Isabel, Antonio Fernando, Luiz Nicolau Virgilio, Paulo Henrique.

Qual era a atividade do pai da senhora?

O meu avô Virgilio Brochini casado com a minha avó Irma Barbogian Brochini, vieram da Itália em viagem de núpcias para o Brasil. Ele e o meu pai que construíram toda a indústria da Caracu. Meu pai fazia desenho técnico, fazia as plantas e meu avô também. Quando chegaram da Itália, desembarcaram no porto de Santos, meus avôs foram para São Carlos e de lá vieram para Rio Claro. Construíram uma casa na Avenida 7 entre a Rua 9 e Rua 10. A casa que eles construíram existe até hoje. Eu nasci nessa casa. Ali meus avós criaram todos os filhos, meu pai comprou uma casa na Rua 9 entre a Avenida 7 e Avenida 9. Depois meu pai adquiriu uma casa e reformou, existe até hoje. É um sobrado com duas casas no fundo.

Com quantos anos a senhora começou a estudar?

Naquele tempo não existia pré-primário. Eu tinha seis anos, queria estudar, chorava porque queria ir para a escola. Até que minha mãe decidiu ir comigo falar com o Professor Marciano Toledo Pizza que era o diretor da Escola Estadual Coronel Joaquim Salles. Hoje há uma escola com o nome desse diretor na entrada do antigo Horto de Rio Claro. Minha mãe foi ver com o diretor se eu poderia ser aluna assistente do primeiro ano. O Professor Marciano Toledo Pizza afirmou que não podia me matricular, a lei do ensino não permitia, por causa da minha idade, eu era muito nova. Sentei-me na escada que havia para ir à diretoria e fiquei chorando. Meu pensamento era não ir embora, iria ficar ali naquele dia. O Professor Marciano ficou com dó e me colocou como aluna assistente. As aulas já tinham começado há seis meses, eu tinha que ser educada! Em um instante fiquei alfabetizada, ele me matriculou, com sete anos fiz o segundo ano primário. Guardo até hoje o boletim escolar, do quarto ano primário. Minhas notas são 90, 95, 100 ( a nota máxima era 100). Guardo esse boletim porque amei a escola.




A seguir a senhora continuou seus estudos?

Fui estudar piano com a Professora Francisca Lemenhe, era compositora, com dez anos comecei a tocar na igreja, lembro-me que foi no dia 10 de maio, eu não fazia o ginásio, entrei na Escola Técnica de Contabilidade. Meu pai tinha muitos filhos, não podia pagar a escola de piano e a escola técnica. Ele disse-me: “- Você deixe de estudar piano!” Dona Francisca Lemenhe, se eu tocasse uma notinha errada, da cozinha ela falava “-Preste atenção Maria do Carmo!”. Quando eu disse-lhe que teria que parar de estudar piano, ela se pôs-se a chorar e disse-me “-Dou-lhe aulas de graça, mas você não irá sair do piano!”. Eu sai da Escola Técnica e passei a freqüentar a escola do Estado, saiu uma lei que sem o ginásio eu não me formaria em piano. Deixei a Escola de Contabilidade e fui estudar na Escola Joaquim Ribeiro, de Rio Claro, naquele tempo tinha o “vestibulinho” para entrarmos. Fiz seis meses de curso para prestar esse exame, entrei para o ginásio, com a finalidade de fazer o conservatório, continuar estudando com a Dona Francisca Lemenhe, carinhosamente chamada de Dona Chiquinha. Ela me incentivou muito. Meu pai passou a tomar conta de uma igreja, a parede era de barro, tinha quase um metro de largura de parede! Ele fundou a Congregação Mariana dessa igreja, fez funcionar a igrejinha! E essa igrejinha ele reformou e ela está lá até hoje. Só trabalhando a noite após o trabalho dele na Taracom. Chamava-se Igreja da Venerável Irmandade da Nossa Senhora da Boa Morte e Assunção. O Padre, hoje Monsenhor, Jamil Nassif Abib gostava muito do meu pai, confiava nele, todas as reformas ele chamava o meu pai para fazer. O meu pai reformou os vitrais que tinham sido colocados em determinada altura, e o Padre Jamil os colocou mais abaixo. Eu tinha até a pouco tempo, um recibo dos tijolos que o meu pai adquiriu para reformar a igreja. O Padre Jamil pediu os documentos que eu tinha, eu estava preparando e não entreguei a tempo para ele, quando saiu o histórico da igreja, não entrou o trabalho do meu pai, por falha minha, eu não entreguei com antecedência os programas e os santinhos que ele pedia. Toquei desde os 10 anos naquela igreja, formei um coral de 40 vozes masculinas. Fui fazer a primeira Faculdade de Canto Orfeônico na PUC em Campinas. Para poder reger o coral direito e fazer arranjos nas músicas.

A senhora morava em Campinas nessa época em que fazia a faculdade lá?

Eu trabalhava na Caracu durante o dia, no escritório em Rio Claro e a noite ia e voltava de trem para Campinas.



Quem eram os proprietários da Caracu?

Eram o Seu Francisco e o Seu Nicolau Scarpa. O Scarpa foi meu padrinho de casamento.




Então a senhora conheceu o Chiquinho Scarpa?

Conheci bastante, eu tomava conta do arquivo das plantas, das fábricas, quando ele vinha ia direto comigo para pegar as plantas. Com dois meses de serviço na Caracu, na época eu tinha 16 anos, fui promovida a auxiliar da Procuradora da Caracu, Wanda Brunini. Ela trabalhava na empresa já há 25 anos, nunca tirava férias, ele disse às irmãs da Igreja Nossa Senhora da Boa Morte, que ela nunca tirava férias, mas na minha mão ela deixava o escritório. Ela tirou férias e a Irmã Elvira veio e me contou esse fato. Francisco Scarpa é pai de Chiquinho Scarpa e Nicolau Scarpa é pai de Nicolauzinho Scarpa. Dona Alicia Mosso Scarpa era esposa de Nicolau Scarpa. Um dia a Dona Alicia telefonou-me perguntando se eu poderia levar a sua filha Analicia na Casa das Novidades, e deixá-la escolher uma agulha de crochê e de linha, ela deveria aprender para saber mandar. Isso para ver como ela tomava cuidado com a educação da filha.

A Caracu era um produto muito comercializado?

Eu era conferente do caixa, conferia as cargas. Naquela época não havia latinhas, eram apenas garrafas eu fazia o controle das garrafas que entravam e saiam. O João Tróia era o correspondente, ele fazia o boletim onde colocava todas as ocorrências do dia. Ia para o escritório em São Paulo, onde trabalhava o Nicolauzinho. Eles tinham uma chácara denominada Chácara Scarpa, hoje foi dividida, em uma parte foi construída a Igreja Bom Jesus. Venderam outra parte da chácara, mas existe ainda essa chácara em Rio Claro.

A senhora conheceu a mansão deles em São Paulo?

Conheci muito a avó do Chiquinho Scarpa, a Dona Joaquina, um dia fui até a casa dos meus tios em São Paulo, junto com duas primas minhas, fomos visitá-la. Fomos de taxi. Ela não deixou que nos voltássemos de taxi, deu dinheiro para nós três, fez o motorista dela nos levar até a casa do meu tio, no Cambuci. Ela durante a nossa visita fez questão de mostrar até o guarda-roupa dela. Era uma mansão, que existe até hoje, assim como existe ainda a Chácara Scarpa. Eles eram proprietários da Fazenda São Bento também, que fica entre Rio Claro e Santa Gertrudes, o pai deles foi muito amigo do meu avô Virgílio. Essa amizade continuou com o meu pai e os filhos dele. A Dona Joaquina chamava o meu pai de “Fióide”, fique quer dizer “Filhinho”. Quando o Seu Francisco foi candidato a prefeito de Rio Claro, ela chamou o meu pai e disse-lhe: “-Por favor, aconselha o Francisco a não entrar para a política”. Ele à custa da Caracu canalizou um riacho que servia de esgoto a céu aberto. Disso eu sou testemunha, era eu quem recebia as notas e pagava. Ele tinha sido eleito com um bom número de votos, e foi um bom prefeito, a cidade de Rio Claro não esquece o nome de Francisco Scarpa.




Nessa época a senhora já estava em uma posição elevada dentro da empresa?

Estava!

A senhora tinha uma idéia aproximada de quantos caminhões saiam por dia, carregados de cerveja Caracu?

Não sei dizer. Só sei que vinham caminhões do Brasil inteiro.: Mato Grosso, Paraná. Vinha de todos os lugares. A Caracu tinha um nome muito forte, era proprietária também da cerveja Pilsen que foi vendida para a Antártica. Era feita por um mestre cervejeiro alemão muito bom. Tínhamos amizade com esse pessoal pelo fato de o meu pai ser chefe das construções, nós conhecíamos todos os chefes. Cada funcionário do escritório que fazia aniversário, fazíamos o que era chamado de “Cerração”. A Caracu dava um barril de chopp. (Na verdade schopp é apenas o nome de uma medida de volume, em alemão, com o tempo em nosso país essa medida acabou passando a ser o nome desse tipo de bebida).  Nós comprávamos salgadinhos, o aniversariante comprava salaminho, azeitonas, e parávamos uma hora antes de terminar o expediente dos chefes e do escritório, reuniamos todos em uma sala que era utilizada para reuniões com o presidente da empresa quando ele fazia reuniões conosco. Essa “Cerração” era uma  grande amizade que tínhamos.

A senhora se lembra quantos funcionários tinha a Caracu?

Não me lembro! O Seu Ernani Fittipaldi era o chefe do Departamento Pessoal. Todo natal eles davam presentes à todos os funcionários, eles eram proprietários de uma tecelagem em Sorocaba, quando havia missa lá eu ia representar a Caracu em Sorocaba. Eles davam três ou quatro cortes de tecidos para todos os empregados, o processo começava em julho, eu tinha que pegar uma programação, colocar nome de cada funcionário, quantos filhos cada um tinha, a dona Wanda mandava fazer roupas para os meninos e para as meninas, era uma costureira que fazia, começava a fazer em julho para distribuir em dezembro. Era distribuído o 13º salário, as roupas, e para cada funcionário quatro ou cinco corte de tecido. Naquele tempo era muito utilizado o tecido de algodão.

Quem trabalhava lá tomava Caracu à vontade?

Tomava! Meu pai era chefe, ganhava toda a semana Caracu e refrigerante.


Na fábrica o funcionário podia beber?

Tomavam também., quando havia a cerração. Quem estava trabalhando não podia beber. Só após o horário de trabalho. A empresa deixava tomarem, mas havia um controle. Sós os chefes que tomavam, os funcionários não bebiam dentro da empresa. Essas bebidas que eram consumidas dentro fábrica, ficavam em geladeiras.

Quem criou a Caracu?

Foi Nicolau Scarpa, pai de Nicolau Scarpa Filho e avô de Nicolau Scarpa Junior. O outro dono da cervejaria era Francisco Scarpa, casado com Dona Patsy, pais de Chiquinho, Fátima e Renata.  

Quantos anos a senhora trabalhou na Caracu?

Quando fiz dez anos de serviço, pedi a minha demissão sem ganhar um tostão. Por razões profissionais divergentes das de um funcionário graduado da empresa e seu procedimento que causava prejuízo à mesma. Não quis ser conivente com o que tinha a convicção de estar sendo feito de forma a lesar a empresa. Preferi perder os anos de casa a agir de forma incorreta. A empresa tinha filais no Rio de Janeiro e em Santos.

                                                       Vista da Fazenda Scarpa

A senhora saiu da Caracu e foi trabalhar com o que?

Eu não queria mais trabalhar! Na Unesp tinha uns professores que faziam tese de doutoramento, eu era a mais rápida datilografa no tempo em que trabalhei na Caracu. Um deles que me conhecia da Caracu perguntou-me se eu poderia datilografar uma tese. Era para fazer na minha casa, acabei pegando, mas sem cobrar nada. Batia as teses e não cobrava nada, era apenas pelo prazer em fazer. O diretor da Unesp João Dias da Silveira, queria que eu fosse trabalhar lá, o professor Heitor de Souza era chefe do departamento da Física. Eu trabalhava com matemática e física. O professor da área de matemática, Humberto D`Ambrozio, disse-me: “-Você vem aqui até a uma hora! Vai bater ponto hoje!”. Meu irmão trabalhava na Unesp aconselhou-me a ir. Em pouco tempo eu coordenava os dois cursos: de física e de matemática. O Dr. João Dias da Silveira saiu, veio o novo diretor, Aparecido, vinha muitos pedidos para empregar pessoas que eram formadas pela Unesp. Eu encaminhava os pedidos para os chefes, assim muitos dos que saíram formados, já saíram com emprego. O novo diretor aumentou o número de alunos por classe, para 50 alunos. Os professores saíram e foram para Goiânia, queriam me levar para lá. Eu já era casada.
Em que ano a senhora se casou?

Casei-me com Edmundo Alves Marinho no dia 22 de abril de 1967, em Rio Claro, na Igreja Boa Morte Assunção. Tivemos um filho: Rodrigo. Eu tinha conhecido um rapaz quando eu tinha 17 anos, namoramos oito anos, seu nome era Lourenço Francisco Lamonato, ele teve um acidente. Era filho de italiano, o Seu João, que trabalhava como gerente na Fiação de Seda Matarazzo, onde hoje funciona o Shopping de Rio Claro. O meu noivo, Lourenço era professor, dava aulas em São Paulo, ele vinha de trem para Rio Claro, em uma dessas viagens aconteceu um acidente que foi motivo do seu falecimento. Meu pai queria muito bem ele, sentiu muito a sua morte.
No magistério a senhora formou-se em que época?

Eu trabalhava ainda na Caracu quando me formei como professora primária. Depois passei a fazer faculdade, primeiro de Canto Orfeônico, depois fiz Arte Musical a seguir fiz Educação Artística. Fiz extensão Universitária de Antropologia Humana e Extensão Universitária de Higiene Mental. Também fiz Pedagogia em Amparo. Quando completei 18 anos de Unesp pedi a minha demissão. Eu trabalhava diretamente com o Professor Landim. Eu comecei a dar aulas em escolas particulares, trabalhava meio dia na Unesp, até que decidi sair da Unesp e dar carga integral no Estado e ficar com o Objetivo, o Integrado e o Puríssimo Coração de Maria.
A senhora deu aula no Colégio Objetivo?

Dei aulas no Objetivo de Rio Claro. Quando abriu o Objetivo fui convidada para dar aulas lá, de Educação Artística para alunos do segundo grau. Atuei 25 anos no magistério. Aposentei-me em 2002.
Qual era a atividade do marido da senhora?

Ele era industrial, proprietário da Indústria Metalúrgica e Fábrica de Móveis EM (E de Edmundo e M de Maria) foi acometido de uma doença grave, teve que fechar a indústria. Ele faleceu dia 23 de fevereiro de 1998.
A senhora continua tocando órgão até hoje?

Eu tocava na Igreja da Boa Morte em Rio Claro, tempo em que o Padre Jamil Nassif Abib era pároco em Rio Claro. Minha mãe tinha-o como a um filho. Continuo tocando durante as missas.
A senhora aderiu a informática?

Tenho meu e-mail, uso o facebook. Não gosto de ficar parada, meu pai era assim.
A senhora é descendente de imigrantes europeus?

A minha avó materna Joana Lundin Baumgartner era sueca e meu avô materno era Guilherme Baumgartner. Vieram da Suíça. 
Além da música a senhora gosta de alguma outra área da arte?

Gosto de pintura, eu pintava muito. Eu dava aulas na Escola Industrial nas matérias de mecânica e eletricidade. Ensinava as letras técnicas, que são letras mais elaboradas, fazia apostila, distribuía.
A senhora é uma pessoa muito feliz.

Eu me realizei em tudo que fiz, porque eu punha a minha alma no que estava fazendo. As minhas apostilas sempre foram muito didáticas, os livros adotados tinham um alcance desnecessário, longo. Meu marido me deu um mimeografo a álcool, tinha noites que eu não dormia, ficava datilografando a aula e passando no mimeografo.
A senhora acredita na recuperação do individuo?

Acredito sim. Eu vivi uma experiência dessa natureza em uma das escolas em que lecionei. Um aluno rebelde, quando tratado com carinho e firmeza pode tornar-se um excelente aluno. 


CARACU
Fundada em 1899, pelo major Carlos Pinho, ela representou o início do processo de industrialização de uma cidade que até então baseava sua economia na agricultura, com destaque para a produção de café, e nos empregos oferecidos pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro.

Em 1902, o major Carlos Pinho arrendou a fábrica para o alemão Julio Stern. O arrendamento transformou-se, no ano de 1910, em sociedade anônima, sob a denominação de Cervejaria Rio Claro – Companhia Industrial. Mais tarde, voltou a ser uma companhia limitada, tendo como diretor o Sr. Oscar Batista da Costa.

Na época, além da Caracu, produzia-se as cervejas Pilsen, Rio Claro e Extrato de Malte, os refrigerantes Maçã, Guarani, Café e Limonada, e a água mineral Artezia. O negócio registrou períodos de crescimento e dificuldades até 1929, quando os efeitos da crise econômica mundial eclodida a partir da quebra da bolsa de valores norte-americana foram devastadores para a empresa.

Por sorte, no ano seguinte, o empresário italiano naturalizado brasileiro, Nicolau Scarpa, adquiriu a indústria e deu início a um processo de modernização e consolidação da marca Caracu no mercado.

O comendador Nicolau Scarpa investiu em  máquinas capazes de produção em larga escala e construiu prédios para a gerência, diretoria, refeitório, conferência, setor de vasilhames e adegas, bem como um galpão para as caldeiras. Quando faleceu, em 1942, deixou um sólido patrimônio para os filhos Francisco Scarpa e Nicolau Scarpa Júnior, que foram para a Alemanha fazer cursos de engenharia e química especializadas no setor cervejeiro.

A eles deve-se o aumento da produção da Caracu, cerveja escura que substituiu no Brasil e britânica Guiness. Paralelamente ao aprimoramento tecnológico, os irmãos Scarpa deram sequência aos projetos de ampliação física iniciados pelo patriarca da família. Eles construíram o prédio da Avenida 4 com rua 8, que abrigava a fábrica de gelo e a ferramentaria, e o anexo de três pavimentos, onde ficavam a casa de máquinas e os resfriadores de água.

Na sequência, avançaram para o interior da quadra com 8 mil metros quadrados de área e ergueram outro prédio, todo de cimento armado, com três andares e arguido para comportar máquinas compradas no exterior. No local, instalaram ainda a nova carpintaria, o engarrafamento e o armazém.

Cada vez mais ousados, Francisco Scarpa e Nicolau Scarpa Júnior construíram um edifício de oito andares, o mais alto de todas as indústrias paulistas da época. No último andar, ficava o moinho da cevada e, logo abaixo, os tanques para produção de cerveja. Na parte de baixo, os demais setores, entre eles o de envasamento. Uma das características marcantes da construção – que existe até hoje – era a chaminé de 40 metros de altura, que durante décadas exalou o aroma de cevada por toda a cidade.

Ao completar 50 anos de fundação, em 1949, a fábrica possuía 307 funcionários e uma posição consolidada no segmento cervejeito. Um dos segredos do sucesso de seus produtos sempre foi a excelente qualidade da água ultilizada, originária de três profundos poços artesianos.

Por ocasião do cinquentenário, o jornalista José dos Santos Ferro escreveu um texto que demosntrava a importância da empresa para o município. “Dezenas de dezenas de milhar de garrafas de produtos da Cervejaria Rio Claro, principalmente de Caracu, que é soberana e ninguém ousa destronar, saem todos os dias do quadrilátero fabril, rumando por aí além, até onde haja um paladar que os eleja para constante uso.”

No ano de 1967, a Cervejaria Rio Claro patenteou no Brasil a Skol, sob licença da fábrica dinamarquesa Carlsberg, que três anos lançara a marca na Europa. Em 1971, a cervejaria lançou a primeira cerveja em lata do Brasil, a Skol-Caracu, com embalagem produzida a partir de folha de flandres. Na época, a família Scarpa detinha 46% do controle acionário do grupo, 26% eram capital estrangeiro e os 28% pertenciam a acionistas diversos. Houve uma fase de grande crescimento, com fábricas em Rio Claro, Londrina, Rio de Janeiro e Santos.

A lata de alumínio, em 1989, e a garrafa “long neck” com tampa de rosca, logo em seguida, são outros exemplos do pioneirismo e dinamismo da empresa, que manteve suas atividades em Rio Claro até 1992, quando a Brahma – hoje integrante da Ambev – transferiu toda a linha de produção para Agudos.


Morre aos 103 anos o industrial sorocabano Francisco Scarpa

20/06/13 | Equipe Online – online@jcruzeiro.com.br

José Antônio Rosa

O industrial sorocabano Francisco Scarpa morreu ontem aos 103 anos em São Paulo, onde morava. A família pediu para que a causa da morte não fosse revelada. Scarpa sofreu um AVC depois que sua esposa, Patsy faleceu, no ano passado e, desde então, não se recuperou. Francisco Scarpa nasceu em Sorocaba a 6 de março de 1910, comandou um dos maiores conglomerados empresariais do país e atuava em inúmeros setores produtivos. De cerveja a óleo e sabão, passando por tecidos e criação de gado, Scarpa trabalhou praticamente com tudo, como costumavam dizer os que o conheceram. 

Uma dessas pessoas é o jornalista Walter Rinaldi Leite, que atuou como assessor de seu filho, Chiquinho Scarpa, na fábrica Nossa Senhora do Carmo. E ele relaciona algumas das atividades empresarias que o industrial comandou. “Foi diretor da Sociedade Brasileira de Máquinas, 1938; presidente da Companhia Cimento Brasil, no Rio Grande do Sul, 1943; sócio da Companhia Imobiliária Morumbi, da Companhia Agrícola Contendasi, da Fiatex, da Exportal, da Companhia Interestadual de Seguros e da Companhia de Seguro Auxiliadores; diretor-presidente do Banco República, da Empresa de Eletricidade Avaré, do Banco Continental São Paulo e da Rádio Cosmos; diretor das Cervejarias Skol Caracu (em 1972 tornou-se primeiro-vice-presidente da mesma cervejaria); diretor da Cervejaria Skol Paranaense, da Sistemas – Engenharia e Consultoria de Sistemas e da Companhia Eletrolux, entre outros”. 

Scarpa também foi prefeito de Rio Claro e deputado federal na década de 60. Sempre que perguntado como conciliava tantas responsabilidades, costuma dizer que “um dos segredos da vida é saber controlar o tempo”. O tino e a vocação foram herdados do pai e do avô que, junto com o comendador Pereira Ignácio, fundaram o grupo Votorantim. Scarpa administrou a fábrica de tecidos Nossa Senhora do Carmo, também conhecida como “Fonseca”, em referência ao português Manoel José da Fonseca que a instalou em 1881. 

Benemérito, adquiriu o terreno onde foi construída a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, na avenida General Osório, bairro Trujillo. Antes disso, criou a Fundação Scarpa. Também contribuiu para a construção da Faculdade de Medicina. Nos anos 50, durante a gestão do prefeito Artidoro Mascarenhas, o “doutor Pitico”, Scarpa emprestou dinheiro ao governo do município que, diante do aperto financeiro, não tinha como pagar o salário dos servidores. 
Consta que os juros da dívida foram doados a entidades assistenciais. Scarpa formou-se, na Alemanha, como mestre cervejeiro. Com esse know-how otimizou a produção da marca Caracu, uma das mais conhecidas do mercado que, mais tarde, se associaria à Skol. Francisco Scarpa deixa os filhos “Chiquinho”, Fátima e Renata. O local e o horário do sepultamento também não foram informados. 



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