Sem dúvida! Acredito que já é dada alguma coisa. Já foi muito pior. Isso precisava ser mais prático, levar a criançada para ver. Nós fizemos em uma época um trabalho no viveiro de mudas da prefeitura, recebíamos todo dia os alunos de uma classe de uma escola. Houve uma época em que até recebíamos duas, uma pela manhã e outra a tarde. Foi um trabalho maravilhoso, chegamos a receber 10.000 alunos por ano. Mostrávamos ao aluno desde a semente, todas as fases da muda, e depois mostrávamos no viveiro mesmo algumas árvores adultas. Eles ficavam absolutamente encantados. Ver uma sementinha de uma paineira depois olhava para aquela paineira. Dizíamos que dentro daquela sementinha existia aquela árvore.
A árvore pode ser plantada e conservada eternamente?
Precisamos entender, que como nós, a árvore tem um tempo de vida. Nós não vivemos 70,80, 90 anos? Claro, tem alguns que vivem 120 anos! Nós temos um tempo de validade!
E essas árvores que vivem séculos?
São algumas espécies! A sequóia, por exemplo! No Brasil temos o jequitibá. São árvores de longevidade enorme. São árvores imensas, deve tomar-se cuidado em que local irá plantar. Cai no que? No planejamento! Da mesma forma que você planeja os ecos-sistemas florestais, você tem que planejar o plantio na área urbana. Não pode se plantar o que a pessoa quer. Quantas vezes você passa em alguma rua e vê palmeiras plantadas na frente da casa? Se olhar para cima verá a fiação elétrica ou telefônica! Irá dar problema! Por isso dizemos que quem tem que plantar é o município!
O interessado em plantar uma árvore pode realizar uma consulta junto aos especialistas da ESALQ, de uma cooperativa agrícola?
Isso poderá ser feito na prefeitura mesmo, na própria Secretaria de Meio Ambiente. Eles se encarregam de ir até o local e plantar sem custo nenhum aos solicitantes.
É muito comum o condutor de algum veículo procurar estacionar o mesmo sob a sombra de uma árvore. Mas em frente a sua casa ele não quer que se plante nenhuma árvore, por diversos motivos. Um deles é varrer e colher as folhas que caem.
É a famosa Lei de Gerson (Onde todos querem levar apenas as vantagens). Falta a cultura de entendermos a necessidade de uma arborização maciça na cidade. A forma como a cidade é feita cabe tudo: postes, fios, sinalização de trânsito, só não há espaço para a árvore. E quando tem que tirar alguma coisa, a primeira coisa que se diz é: “ –Tem que tirar essa árvore!”
Até alguns anos a maioria dos calçamentos das vias públicas nas grandes cidades era feito com paralelepípedos. Para suavizar o andar dos veículos em muitas vias foi lançada sobre o mesmo uma camada de asfalto. Qual é o impacto da mesma em relação a penetração da água das chuvas?
Eu não conheço nenhum estudo que diga que com paralelepípedo o solo terá uma absorção de água de “x” milímetros por metro quadrado. É evidente que com o asfalto a absorção será nula.
Em Paris as calçadas são em terra nua para melhor absorção de água?
Paris tem 400.00 árvores. Toda árvore de Paris tem um chip! O técnico chega com um aparelho, encosta e mede. Pude ver que em volta de algumas árvores são terra nua com pedrisco. Ou então fazem grades enormes no mesmo nível da caçada, o que dá segurança ao pedestre, só que essas grades permitem que a árvore receba água. A água chega até as raízes da árvore. Infelizmente em nosso país há uma covinha para a árvore e em torno dela tudo impermeabilizado. A árvore dessa forma irá cair mesmo! Existem inúmeras soluções técnicas. È que é muito mais fácil fazer uma covinha e ir embora. O custo é muito menor, nós estamos em um país pobre. Não temos que pensar só na arborização urbana, a cidade precisa ter espaços, áreas verdes, temas de lazer, onde essa água possa entrar quando chover. Não se pode contar apenas com a tubulação. Temos o asfalto, um bueiro diminuto, um tubo pequeno para o volume de água gerado pela chuva.
A seu ver o adensamento urbano deveria ser mais bem pensado?
O planejamento urbano deveria ser mais bem pensado. Não temos mais quintais. Não faz tanto tempo tínhamos quintais, com árvores frutíferas: mangueira, jaqueira, laranjeira. Você tinha um lugar onde essa água entrava. Hoje os lotes de terrenos já são menores, a pessoa impermeabiliza o quintal. Minha casa era grande, minha mãe colocava a roupa para coarar no sol sobre a grama, essa grama absorvia água. Temos poucos parques, poucos sistemas de lazer para receber essa água de chuva.
Estamos falando de uma cidade que é tida como modelo.
É tida como modelo, nós brigamos muito para que muita coisa fosse deixada, e ainda o pessoal que está responsável por isso tenho a certeza de que briga muito por isso. Mas ainda é muito pouco. Tem regiões na cidade que temos inundações recorrentes. Isso é a tal de silvicultura urbana, esse planejamento. Quando você tem uma cidade com uma boa arborização, bem planejada, com árvores grandes, locais permeáveis, que essa água consiga entrar, teremos um micro clima melhor. Existem estudos da ESALQ, do Professor Demóstenes, por exemplo, que mostram isso. Ele mediu a temperatura em vários pontos da cidade, a área central e a ESALQ chega a dar de 8 a 10 graus centígrados de diferença de temperatura.
Isso significa que podemos baixar a temperatura da cidade plantando árvores?
Plantando árvores e deixando espaços livres, áreas verdes. Por exemplo: estacionamento, totalmente asfaltado, ali vai dar uma temperatura enorme.
Isso faz com que tenha sentido o que o pessoal com mais tempo de vida diz: “Está mais quente do que o ano passado!
Tem uma razão. Claro. As coisas na natureza não são absolutas. Se as cidades fossem melhor planejadas, teríamos cidades mais agradáveis. Hoje quando vai se fazer um loteamento a lei diz que dez por cento tem que ser conservado como área de lazer, o resto é tudo impermeabilizado. São ruas, 5% de área institucional. O material, o concreto, o cimento segura muito o calor, esquenta, o asfalto esquenta.
Em que ano você aposentou-se?
Foi em 2011.
Depois disso você enfrentou um curso de nível elevado?
Fiz um curso de pós-graduação em recursos hídricos na Escola de Engenharia de Piracicaba. Sou apaixonada por esse assunto.
O que lhe traz mais satisfação dentro da sua profissão?
Trabalhar com bacias hidrográficas. Essa relação da floresta com a água. Quando você pega uma bacia e consegue fazer ali um trabalho sério, medindo a água e vendo aquelas árvores crescendo, acompanhando tudo isso, você irá ver essa água aumentar.
Você realizou um trabalho para uma personalidade muito expressiva?
Foi para o Dr. Fernando Penteado Cardoso. Foi um trabalho na Fazenda Mundo Novo, situada em Brotas. Era uma área em que eles faziam as reuniões de gerencia, fiz um trabalho de paisagismo em uma área de mais ou menos 4 a 5 alqueires paulistas (24.200 metros quadrados cada alqueire). Ali tinha quadra, piscina, uma área em que faziam leilão de gado, tudo foi planejado, quando as pessoas vinham onde eram acomodadas, precisavam de sombra, as reuniões de gerência, como esse pessoal iria aproveitar aquele espaço. Ali foi feito um paisagismo com características de parque, a necessidade era que fosse um tipo de um parque para ser utilizada aquela área.
Quantos parques você chegou a fazer?
Foram muitos, acho que até perdi a conta de quantos foram. Parque é muito relativo. O que você chama de parque? O Parque da Rua do Porto foi feito inúmeras vezes. Participei de muitas coisas dele.
Foi você quem implantou o Parque da Rua do Porto na primeira vez?
Na primeira vez trabalhei na implantação. O projeto veio de fora da cidade, foi elaborado por um arquiteto de São Paulo. Depois ele foi destruído porque fizeram uma feira agro-pecuária logo em seguida. O parque foi implantado novamente. Plantei muita árvore lá, perdi a conta.
Mesmo assim é um parque que tem espaço para plantar mais árvores?
Têm! Só temos que definir que uma coisa é uma floresta, outra coisa é um parque! Um exemplo é a ESALQ, onde você tem áreas de vegetação densa, tem áreas livres, há um jogo de sombra e de luz.
Tem que existir a vegetação correta para o devido lugar?
Dependendo do tipo de solo, luz e sol você irá planejar o tipo de muda que irá por. Um local que tenha meia sombra não adianta querer colocar planta de luz. Tem que colocar planta que irá agüentar aquele sol. O mesmo ocorre com um local absolutamente sombreado, tem que colocar planta que agüente a sombra.
Quanto a polinização há fatores importantes nesse processo?
Existem plantas que você tem que ter um pé macho e um pé fêmea. Outras plantas são hermafroditas, são as que têm o sistema masculino e feminino na mesma planta. Algumas vezes você não tem a planta correspondente ao redor dela, mas logo a frente irá ter. A abelhinha se encarrega de fazer esse trabalho de polinização. Infelizmente algumas nascentes são sacrificadas para dar mais espaço ao plantio.
Há uma verdadeira febre de ciclovias, é um modismo?
Essa questão de bicicleta está muito em voga hoje. Não polui, é econômica, só que faz sentido quando se tem um circuito, eu não posso fazer uma ciclovia que não liga nada a lugar nenhum. Existe o plano de ciclovia para a cidade. Em inúmeras cidades da Europa as pessoas deslocam-se de bicicleta.
Você que conhece bem o exterior, a seu ver quem cuida melhor da natureza, o norte americano ou o europeu?
Acho que o americano cuida melhor. Tem inúmeros parques em muitas cidades. O pessoal de outros países está dando a devida atenção e cuidando da natureza. Na Espanha eles têm irrigação das árvores das calçadas. Você olha uma árvore na calçada, tem um caninho ao lado, é assim em todas elas, A Espanha tem um problema de água seriíssimo. Eles irrigam as árvores da calçada. Eles não podem ficar contando só com a chuva, senão as árvores não irão se desenvolver. Tem um sistema automático que a determinada hora molha as árvores. Quando você tem uma irrigação pontual não irá gastar muita água. Irriga a noite, não evapora.
O brasileiro é meio folgado nesse aspecto.
É folgado e meio!
O ideal é molhar as plantas sempre a noite?
O correto é molhar na hora que tenha menos sol, bem de manhã ou a noite.
Você foi eleita a Engenheira Florestal do Ano?
É uma indicação do órgão de classe. Da Associação Paulista de Engenheiros Florestais. Isso muito me honra.
Para Piracicaba é uma conquista e um reconhecimento?
Acredito que sim. Tem todo um trabalho, como já mencionamos, fui meio pioneira nessa área. Agora já vemos pessoas dizendo que irão fazer engenharia florestal, engenharia ambiental. Quando decidi escolher engenharia florestal há quase 50 anos, era bem diferente. Lembro-me que quando fui trabalhar na Prefeitura de São Paulo, tive uma reunião na prefeitura, uma pessoa perguntou-me: “- O que você é? Engenheira Florestal? Existe isso? O que uma engenheira florestal vai fazer em São Paulo?” É um conceito que está tão longe da nossa realidade, naquela época, no Brasil, não se falava em silvicultura urbana. Hoje existe uma matéria dentro do curso da ESALQ de ciências florestais, dada pelo professor Demóstenes. Hoje é tudo feito através de geo processamento, infravermelho. Existem levantamentos por infravermelho que você faz e pela cor você já sabe quais são os lugares mais quentes da cidade. Tínhamos um código de preservação ambiental que delimitava uma determinada área, houve uma grande pressão da bancada ruralista para diminuir essas áreas, tínhamos que deixar 50 metros de área verde de proteção à nascente, hoje são quinze metros. É muito pouco! A reserva legal era intocável. Tinha que deixar na sua fazenda a reserva legal, não podia mexer. Hoje você pode mexer na reserva legal, se tiver na reserva legal determinada planta que produza algum tipo de semente, hoje você pode comercializar essa semente. Ou seja, a reserva legal pode ser produtiva atualmente. Não temos muitos estudos a respeito, mas existem muitas essências utilizadas em cosméticos, perfumes, remédios.
O eucalipto passou por melhoramentos?
O melhoramento genético do eucalipto foi importantíssimo. Tem a importante participação do Departamento de Silvicultura que depois passou a ser Ciências Florestais, foi o Dr.. Eladio de Amaral Mello, diretor, que criou o curso de Engenharia Florestal. No inicio as mudas eram feitas pela semente, depois passaram a ser produzidas por micro-propagação. Quando se pega uma semente ela recebeu pólen de diversas origens. Não irá ter-se uma árvore exatamente igual. Na micro propagação não. Você escolhe, se tiver o fusti ( tronco) reto é disso que eu preciso. Se vou produzir poste, não posso ter galhos, cada galho tem um nó, ela tem que ter uma desrama boa. É eleita uma árvore como matriz. Você vai lá, pega as folhinhas e faz micro propagação. Você faz muda daquela folha! Aquela muda quando crescer será igualzinha a árvore original.
Você está clonando a árvore?
Está sendo clonada!
Qual é seu ponto de vista sobre as ervas medicamentosas?
Algumas pessoas passaram a estudar mais profundamente o assunto. Dr. Walter Accorsi foi um precursor.
Dentro das ciências florestais falávamos em fisiologia, atualmente fala-se em eco fisiologia. Fisiologia de uma planta é o estudo da mesma. Eco fisiologia é o estudo dessa planta dentro do ambiente. É a interação da planta genética mais o ambiente no crescimento das árvores. A floresta nativa temos que torná-la produtiva, lucrativa.
O avanço da tecnologia contribuiu muito para esse enorme salto?
Através desse estudo que o Professor Demóstenes faz você consegue determinar em uma cidade o quanto ela tem de área verde, de parques, quanto ela tem de área impermeável. Qual é a relação entre área permeável e impermeável. Temos aparelhos que junto a árvore determinam suas condições vitais. Como a árvore está internamente, se está oca. Como país pobre, temos um aparelho aqui outro no IPT em São Paulo. No Estado de São Paulo se tivermos 10 aparelhos é uma estimativa próxima da realidade. Falo muito de Madrid, porque fiz um curso e veio uma pessoa de lá que é responsável por essa área. Ele divide a cidade, irá nomear para cada setor um responsável, esse responsável vai ter um carrinho que tem todos esses aparelhos dentro. O técnico tem a ferramenta, são funcionários treinados. Ele olha todas essas árvores, tem uma planilha no computador, por exemplo, a arvore 1, está na rua “x” de frente ao número 10. Ele irá fazer um histórico daquela árvore. Ele pode chegar a conclusão de que as árvores 2 , 12 e a 15, não estão muito bem. As arvores 8, 29 e 32 estão ruins. As demais estão boas. Ele faz um planejamento de tal forma que as árvores boas ele irá fazer uma verificação a cada dois anos. As árvores que estão em uma situação mediana todo ano ele irá passar por lá. As que estão ruins ele irá passar a cada seis meses. Não acontece essas catástrofes que você vê aqui! Passaram seis meses, ele constata que a árvore está ruim, ela será substituída. A pessoa não precisa pedir fazer uma requisição com 10 carimbos. Sem contar o problema com a fiação, isso não existe, ela é toda embutida. A cidade de Madrid é grande, está dividida em “n” partes. O responsável em questão, chama uma equipe, corta a árvore comprometida e substitui. A árvore tem um tempo de vida, precisamos entender isso! Ela tem um prazo de validade! A arborização tem que estar sempre sendo renovada, o problema não é cortar, o problema é não plantar. Se houvesse um plantio sistemático, você teria árvores crescendo em várias etapas. O que tem que ser tirado deve ser tirado, tecnicamente está ruim tem que tirar. Se tiver fungo tem material podre! Essa lucidez que o curso de Ciências Florestais nos dá. Não é paixão! Quando você vê um governo sério fazendo um trabalho desses, as árvores sendo olhadas sistematicamente, irrigadas, adubadas, podadas corretamente, conduzidas, a árvore ornamental não é laranja, laranja você tem que podar senão terá que colocar uma escada de 30 metros para colher laranja lá em cima. Arvore ornamental tem que ter aquela copa que é natural dela.
E as árvores que são cortadas deixando apenas “os tocos” e o tronco?
Isso é um absurdo! Isso é mutilação da árvore!
O que afeta a saúde de uma árvore?
Há pragas e doenças. Praga você vê o bicho, a lagarta, o besouro. A doença você não vê, é o fungo, bactéria, vírus, pode estar até na folha da árvore. A olho nu você não irá ver nada, só no microscópio. De uma maneira bem popular essa é a diferença entre praga e doença.