PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 29 de junho de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADA: DEBORA FERNANDA DA SILVA NUNES

Debora Nunes é atleta da Seleção Brasileira de Tae kwon do. Uma vencedora dentro e fora dos palcos de luta. Nas competições esportivas internacionais tem os famosos “membros da delegação” que em grande parte nada tem a ver com o esporte, apenas vão para desfrutar as mordomias da viagem, infelizmente alguns são vistos apenas nas viagens. Isso ocorre nas mais diversas modalidades esportivas. Sabe-se que o atleta deve receber dois capacetes, um azul outro vermelho, por medida de economia talvez, lhe é fornecido apenas um capacete de uma única cor. O Brasil tem grandes valores em todas as áreas esportivas, tem recursos financeiros, o que não existe é um emprego racional e efetivo desses recursos com o propósito de alavancar outras modalidades de esportes. O esporte assim como a cultura fortalecem uma nação. Quem deve tomar frente desssas iniciativas é o poder público e não a poderosa mídia dos grandes centros. Não existe uma preocupação com as reais necessidades do atleta, é um quase “se vire como pode”. Quando o atleta com esforço sobre-humano consegue galgar um lugar de destaque muitos querem pegar carona no sucesso alheio. É o velho ditado: “Quando o filho é bonito todo mundo quer ser o pai”. Muitos atletas iludem-se achando que ao atingir o auge se realizarão, na realidade são apenas integrantes de uma grande engrenagem, de certa forma são manipulados. Mais conhecida como Debora Nunes, filha de Claudete da Silva Nunes e Francisco Nunes nasceu a 19 de junho de 1983 em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, tem 1,75 metros de altura. Tem uma irmã de 20 anos e um irmão de 25 anos. Debora fez seus estudos na Escola Municipal Grande Oriente do Rio Grande do Sul e no Colégio Estadual Dom João Becker. Iniciou seus estudos na Universidade Feevale localizada no município de Novo Hamburgo.

Que curso você realizou na Feevale?

Iiniciei curso de Educação Física, mudei para São Paulo, continuei fazendo a faculdade na UNIP. Tudo através do esporte, sempre com bolsa de estudo. Acabei concluindo o curso aqui na UNIMEP em Piracicaba.

Você pratica qual esporte?

Tae kwon do .(Taekwondo também grafado taekwon-do ou TKD).

O que a levou a praticar esse esporte?


Minha mãe sempre quis que eu fizesse algum esporte de defesa pessoal. Sempre fui muito franzina, muito magrinha, as vezes voltava para casa chorando, vitima de alguma brincadeira ou discussões próprias de crianças. Um dia minha mãe disse-me: “- A partir de hoje você não vem mais para casa chorando!” Fui em busca de uma arte marcial, iniciei no judô, após uns seis meses não quiz mais. Um vizinho treinava Tae kwon do, disse-me: “Não desista não! Venha treinar comigo, vê se você gosta!”. No inicio relutei um pouco, ele foi me convencendo, iniciei com ele, seu nome é Francisco Godoi, foi meu primeiro professor, ele devereia ter uns quarenta anos. Ele convidou umas amiguinhas minhas, e montou uma turminha na garagem do prédio. Inicialmente improvisamos uns uniformes que nem eram da modalidade, às segundas, quartas e sexta-feiras ele dava o treinamento.

Como funciona essa arte marcial?

É uma arte marcial olímpica que trabalha muito a questão de chutes, pés. Mão muito pouco. Hoje com a implantação dos coletes eletrônicos você chuta em uma potência e afere o ponto. Não há mais a necessidade dos árbitros darem os pontos. Cada categoria tem uma potência. O soco passou a fazer parte também.

Vocês usam algum tipo de protetor?

Usamos protetor de peito, de canela, de antebraço, protetor genital, luva, capacete e protetor bucal.

Hoje o que a leva a praticar o esporte?

Eu tinha o sonho de participar de uma olimpíada. Em 2008 fui para a olimpíada. Em 2005 fui convidada para morar em São Paulo. Inicialmente morei no alojamento do Clube Rosa Mística em São Bernardo do Campo. Esse clube dava apoio para o clube de São Bernardo do Campo. Morei lá oito meses.

O que a trouxe do Rio Grande do Sul para São Paulo?

Em Porto Alegre eu treinava e trabalhava na Academia Lee, o mestre chama-se In Kyu Lee. Dava aula, trabalhava na recepção. Abria a academia, fechava a academia. Isso foi após eu estar treinando com o Francisco “Chinês” Godoi, eu estava super bem, ele então me disse: “ Debora, você tem muito potencial, só que aqui comigo não irá crescer, não tenho como fazer exame de faixa, com graduá-la, mas vou te levar para a academia onde eu treino”. Foi assim que fui para a Academia Lee. Isso foi em 1996.

Já a convidaram para desfilar em passarela como modelo?

Já participei de desfiles, fiz curso de modelo, em função da altura, pelo fato de ser magra. Mas não é uma área que pretendi seguir carreira. Um dos motivos pelos quais desisti é que tinha que emagrecer três quilos. Pensei: “Estou fora disso, já sou magra, vou ficar esquelética!” Fui competir Tae kwon do, eu pesava 57 quilos, hoje meu peso são 67 quilos.

Você é bem magra, isso é bom ou ruim?


Para o Tae kwon do isso é ótimo ser alta e magra, é o biotipo. Perna longa, magra e alta, ganha na questão de envergadura , distância. Uma adversária menor tem muito mais dificuldade em me acertar do que eu acertá-la.

Qual é a potência do seu soco?

Soco a gente não afere, aferimos o pé. Existe uma escala de potencia introduzida pelos coreanos.

Se você acertar o pé de forma bem colocada pode causar danos?


Machuca! Graças a Deus nunca precisei usar e nem quero utilizar. Só em competição mesmo.

Dentro de competições você já chegou a provocar alguma lesão na adversária?


Quebrei o nariz de uma menina, quebrei o braço de outra. Isso acontece em decorrência do contato, o capacete deixa a face desprotegida. O nariz é um dos pontos mais vulneráveis. O maxilar também é muito exposto.

Quanto tempo você permaneceu treinando com In Kyu Lee?

De 1996 até 2005. Lá disputei muitos campeonatos estaduais. Antes de vir para São Paulo, teve um ano em que decidi disputar uma seletiva, tem que se fazer diversas seletivas para poder chegar na seleção brasileira. Busquei ranking no Sul para poder vir à seletiva. Buscar ranking significa realizar pontuação. Só que quando chegou o campeonato ou eu ia para a seletiva ou ia para o brasileiro representando o Sul. Eu só tinha dinheiro para ir a um dos dois. Pensando bem, e aconselhada pelo In Kyu, fui para o Campeonato Brasileiro, fui classificada em primeiro lugar na categoria até 55 quilos, issso foi em 2003.

Apareceram muitos interessados em patrocinar seu trabalho?

Nada! Só teve dirigentes querendo tirar fotografia ao meu lado.

Nessa hora eles prometem muita coisa?


Sim. Dizem que vão dar apoio, estão pleiteando um patrocinador novo. Eu acreditava, hoje já não acredito mais.

Porque o futebol atrai tanto enquanto outros esportes são tão carentes de recursos? É a mídia que provoca isso?

Acho que em parte é a mídia que determina e também o fator cultural. Quando uma mãe tem um filho a primeira coisa que ela faz é colocar o filho em uma escolinha de futebol. O sonho dela é que o filho siga praticando futebol.

Isso sem contar que com apenas uma bola podem participar até 22 crianças.


Tem isso também. Pode-se jogar em qualquer lugar.

Muitos pensam que irão ficar ricos jogando futebol.

Exatamente, é a esperança.

Qual é o tempo de vida útil de um praticante de arte marcial Tae kwon do?

Masculino vai até mais longe, uns 35 a 36 anos. Feminino é um pouquinho mais complicado, geralmente até uns 31 a 32 anos.

Geralmente são solteiras sem filhos?

O que acontece é isso, a mulher casa, tem filho. O homem consegue ter filho e continuar, para a mulher pesa esse lado família, o fato de ser mãe.

Você é casada?

Sou casada com Frederico Mitooka, mestre de Tae kwon do e técnico. Ainda não tenho filho.

Como é treinar com o marido?

É complicado, a cobrança é muito maior. Ele sempre exige mais de mim. A expectativa é sempre maior de que tudo seja melhor.

Você faz parte da Seleção Brasileira de Tae kwon do?

Já faz nove anos que sou titular da Seleção Brasileira. Em 2004 passei a ser titular, isso ocorreu porque uma atleta da categoria sofreu uma lesão, estavam reunidas, treinando para o mundial. Se não me engano foi em Londrina. Chamaram duas atletas, para treinar e participar de confrontos para ver quem iria no lugar dessa atleta. Uma menina do Pará e eu fomos convocadas. Treinamos juntas, depois fizemos uma seletiva onde eu ganhei e fui para o mundial em Madrid. Passei a integrar a Seleção Brasileira.

Quantos atletas fazem parte da Seleção Brasileira de Tae kwon do?


Dezesseis, sendo oito masculino e oito feminino. Existem dois técnicos que acompanham.

Em Madrid você ficou hospedada em hotel?

Fiquei em um hotel de excelente qualidade.

O integrante da seleção tem alguma remuneração?

Pela Lei Piva é destinado um salário para as atletas. Na época era de 600 reais. Em 2010 com a entrada da Petrobrás estipularam rankings e dentro de cada ranking cada um tinha um salário. O valor mais baixo acho que era R$ 1.200,00 e o mais alto R$ 3.000,00. Se você for pagar seu preparador fisico, seu fisoterapeuta, viagens, suplementação nutricional, material, verá que tem que tirar dinheiro do próprio bolso. A confederação é patrocinada pela Petrobras, foi informado que a Petrobrás liberou 10 bolsas das 16 que então patrocinava. Cortaram seis bolsas. Eu e outra atleta da nossa academia estamos dentro desses seis que foram cortados. Alegam diversos critérios que qualquer um poderia ser enquadrado nesses critérios. Não existe uma explicação clara dessa exclusão.

Você está com 30 anos, isso a deixa dentro da faixa etária competitiva?


Posso afirmar que sou uma atleta mais experiente. Se ganha na experiência.

Quais são seus planos para o futuro?


Poderia prolongar por mais alguns anos a minha participação em competições, mas não pretendo levar isso adiante por muito tempo. Pretendo trabalhar na academia, dar aulas. Acho que tenho muito a passar, do que já vivi. Considero uma forma valiosa com a qual posso ajudar. Contribuir com as novas atletas. Sempre me preocupei em fazer uma faculdade para quando chegasse a hora de deixar de competir ter novos horizontes.

Você tem quantas medalhas de ouro em seletivas?


Tenho nove medalhas de ouro em seletivas. Hoje as seletivas são mais importantes do que o campeonato brasileiro. Em 2004 ganhei a medalha de ouro no Campeonato Brasileiro.

O esporte a realizou financeiramente?

Posso afirmar que tenho uma vida mais tranqüila do que antes, quando iniciei. Tudo que consegui foi graças ao esporte.

Você transmite serenidade, isso é em decorrência do esporte?

Acredito que é uma característica pessoal, mas que o esporte também contribui muito para que isso ocorra. O Tae kwon do dá muito isso, a questão da disciplina, autocontrole, perseverança.

O fato de ser um ambiente onde se pratica arte marcial traz a imagem de um local onde a violencia está presente, e é exatamente o contrário.

Isso ocorre porque a pessoa não conhece o local. Há um ambiente harmonico.

Em algum momento você pensou como seria se tivesse seguido a carreira de modelo?


Possivelmente teria ganhado mais dinheiro, mas não teria vivido o que vivi. Nunca parei para contar quantos países conheci, mas foram muitos.

Como se deu a sua mudança para Piracicaba?


Foi após conhecer o Frederico em um campeonato na Grécia, lá nos conhecemos e fomos mantendo contato. Eu morava em São Paulo quando começamos a namorar. Ele me convidou para vir disputar os jogos abertos por Piracicaba. Lutei por Piracicaba por dois anos. Por outras cidades disputeis diversos anos, há muitas cidades que investem no esporte. Se não me engano, Piracicaba em Jogos Regionais é oito vezes campeã em Tae kwon do. Temos um núcleo de alojamento com 12 atletas no total. Tem gente do Ceará, da Bahia, Espirito Santo disputando por Piracicaba. E moram aqui na academia. Recebem uma ajuda de custo, a cidade mantém um núcleo, apoia diversos esportes.

Não há uma divulgação maçiça como ocorre com o futebol?

Mas existe uma cobrança muito forte de medalhas!

Hoje os pais se preocupam muito com os filhos, a questão da disciplina, para contribuir geralmente os pais trabalham e não tem como estar sempre por perto dos filhos. O Tae kwon do pode ajudar na formação do jovem?


Acho que sim. Parto do principio de que o Tae kwon do é uma filosofia de vida. O trabalho com as crianças envolve muita disciplina. Tem que haver repeito aos mais graduados. Tem que pedir para poder falar.

Qual é a idade mínima para iniciar?


Tres anos. Idade máxima não existe. Temos alunos de tres anos até com mais de sesssenta anos.

Quantas faixas existem?

É uma realização trocar de faixa. São nove faixas: branca, amarela, amarela ponta verde, verde, verde ponta azul, azul, azul ponta vermelha, vermelha, vermelha ponta preta e a preta. Depois tem primeiro, segundo, terceiro e quarto dan. Quarto dan já é mestre. Os nomes dos golpes, a contagem é tudo em coreano. Para entrar na sala é feita uma saudação pedindo permissão para entrar na sala. No final comprimenta-se os professores, assim como a cada um que estava na aula com você. Ha 10 anos fazemos trabalho principalmente com crianças. Quem quiser conhecer um pouco mais do esporte pode entrar em contato pela internet através do site www.dojannippon.com

Como boa gaúcha você gosta de churrasco?


Amo churrasco. Tomo chimarrão. Meu esposo é vegetariano. Ele tenta me convencer, mas parece impossível, está no meu sangue. Quando saio do Brasil gosto de experimentar as coisas, na China experimentei grilo assado, tem gosto de terra.


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