FREI SAUL PERON

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 26 de dezembro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADO: FREI SAUL PERON

O Natal é uma data em que comemoramos o nascimento de Jesus Cristo. O Papai Noel, a figura do bom velhinho foi inspirada num bispo chamado Nicolau, que nasceu na Turquia em 280 d.C. O bispo, homem de bom coração, costumava ajudar as pessoas pobres, deixando saquinhos com moedas próximas às chaminés das casas. O presépio também representa uma importante decoração natalina. Ele mostra o cenário do nascimento de Jesus, ou seja, uma manjedoura, os animais, os reis Magos e os pais do menino. Esta tradição de montar presépios teve início com São Francisco de Assis, no século XIII. Essas informações são bem conhecidas. O que desperta a atenção é a de a cada dia a figura do Papai Noel estar mais próxima ao recorde do Guiness Book como “Maior Vendedor do Mundo”, sendo relegado a um segundo plano o verdadeiro sentido Natal. Só os pequeninos, e nem todos, acham que Papai Noel existe, mas a voracidade do consumo o materializa na mente de muitos adultos. O nosso entrevistado é muito estimado pelos piracicabanos que o conhecem. Pela sua franqeza e forma lúcida com que expõe suas convicções torna-se um baluarte em defesa do sentido original do Natal.
O nome civil do senhor qual é ?
Saul Peron, sou filho de Guerino Peron e Cezira Cadari Peron, uma família muito conhecida em Piracicaba, especialmente na Vila Rezende. Nasci no dia 5 de novembro de 1934, potanto já fiz 75 anos na localidade rural onde uns chamam de Guamiun por causa do córrego, também conhecida por Santa Fé que fica entre Vila Nova e Cruz Caiada.
Quantos filhos seus pais tiveram?
Cinco filhos. Até os quarenta anos de idade meu pai trabalhou na agricultura, mudando depois para Piracicaba, onde montou um armazém de secos e molhados, me parece que se chamava Empório São Benedito, na Avenida Dona Francisca, Vila Rezende, proximo onde hoje é o Restaurante Monte Sul.
Era uma zona praticamente rural?
Da casa do meu pai, quando se olhava na direção de onde hoje é o bairro Jardim Monumento, onde está o Mosteiro, a Igreja Nossa Senhora dos Prazeres, plantava-se arroz. Onde hoje é o Hospital dos Fornecedores de Cana praticamente determinava o limite das casas construídas. Quando menino eu conheci a Avenida Dona Francisca com meia dúzia de casas, era piso de terra, cercas de pau a pique. A única rua calçada era a Avenida Rui Barbosa, o bonde ia até o seu ponto final, passava pela Casa Valler e fazia seu ponto final onde hoje é um Posto de Saúde Municipal, pena que não tenha sido preservado. Hoje são mais rigorosos com relação á preservação das obras edificadas. Tomba-se um patrimônio, passando a responsabilidade integral de preservação e manutenção ao seu proprietário. É um procedimento comum pelo que sei no Brasil. Algumas experiências em Minas Gerais fizeram com que o bispo pedisse o apoio dos padres para que fosse feito o “destombamento” que permitisse que ele cuidasse das igrejas que estavam prestes a caírem.
O senhor estudou no Grupo Escolar José Romão?
Estudei por dois anos em um grupo escoar que ficava onde na época denominava-se Bimbóca, hoje Avenida Manoel Conceição. Era uma escola mista, e a escola ficava situada entre uma dúzia de casas, inclusive do Vitti. O Romão já existia, mas nós morávamos ali em baixo nessa época.
Ainda menino o senhor chegou a trabalhar na lavoura?
Trabalhei no sítio. Naquela época não havia impedimento para que o menor trabalhasse.
O senhor é favor ou contrário ao trabalho do menor de 16 anos de idade?
Eu acho que o menor não deve ser explorado. A criança não deve ser usada, manipulada. Há a possibilidade de se adquirir uma mão de obra barata sem oferecer segurança, muitas vezes obstruindo a ida da criança para a escola. No meu tempo não havia isso, ia-se á escola, na volta ia para a roça. Era uma atitude comum na época, em todos os lugares. O menor não ser explorado é uma situação evidente, que ele tenha uma oportunidade para estudar é mais evidente ainda. O poder público deveria providenciar uma maneira que permita á família uma sustentação. Um pai com dois ou três filhos pequenos, não tem um bom emprego, fica difícil. Em contrapartida o trabalho do menor proporciona a evasão das escolas.
O senhor acredita que essa proibição do menor de 16 anos de idade ser proibido de trabalhar, sem que o Estado ofereça a contrapartida é uma solução pela metade?
É sempre assim! É difícil uma solução total.
O senhor foi para O seminário Seráfico São Fidelis com que idade?
Eu devia ter de 15 para 16 anos de idade.
Foi uma mudança de vida radical?
Eu procedo de uma família muito religiosa. Nós morávamos no sítio, os meus avôs eram lideres da comunidade, quando havia missa lá, os celebrantes eram a maioria das vezes eram acolhidos em casa. Desde pequeno tive sempre um bom relacionamento com os frades, e a boa maneira de ser deles me encantou. A experiência familiar para o jovem é fundamental.
Ao ir para o seminário os estudos do senhor iniciaram-se como?
Começava-se com o ginásio, depois o equivalente ao colegial, nós denominávamos de Clássico. Antes de ingressar havia dois anos de preparatório, era a base. Três anos de ginásio, dois anos de curso clássico, e o noviciado, onde era feita a formação religiosa. Em seguida mais três anos de filosofia pura. Estudamos francês, italiano, grego clássico, grego bíblico, latim. Naturalmente se dava grade importância ao português.
Quantos anos o senhor estudou?
No Seminário Seráfico foram quatro a cinco anos, de lá fui para Mococa por dois anos, um ano em Taubaté, voltei ara Mococa onde permaneci por três anos, depois mais quatro anos e meio em São Paulo.
Era um longo período de estudos!
Naquele tempo do começo ao fim passava-se por 13 a 14 anos de estudos.
A oratória é importante na função religiosa?
No meu conceito a oratória é um dom pessoal, um carisma.
Qual é o segredo de um bom orador?
Eu penso que é a habilidade e convicção daquilo que você vai falar. É claro que tem que ser usada técnica específica. Quando você está fora do seu ambiente é natural ocorrer um pouco de inibição. Tenho facilidade em falar, desde que seja dentro do meu campo. Tem pessoas que fala sobre tudo de forma bastante natural, e pode ocorrer em erros.
Quando você está expondo um assunto, naquele assunto provavelmente seu domínio é acima da grande maioria que o escuta. Pode ocorrer de haver entre os ouvintes alguém que está com posições divergentes, e que nem sempre quem está apresentando tem uma resposta convincente. Em palestras de um nível mais elevado isso pode ocorrer com mais freqüência. Temos pessoas muito cultas, com grande capacidade, mas quando se apresentam em público pronunciam-se muito acima do entendimento da platéia.
Porque a Missa do Galo acabou?
As coisas mudam! Por que Missa do Galo? Porque era celebrada á meia-noite, hora do galo cantar. Naquele tempo ao se celebravam missas á noite, elas eram celebradas a noite. A missa tinha todo um encanto, por ser rezada a meia-noite. Era a missa festiva do Natal. Há padres que guardam essa tradição até hoje, se não me engano a Matriz da Vila Rezende manteve esse costume até muito pouco tempo. Naquele tempo você rezava a missa e ia embora para casa á pé. Quando eu era menino por muitos anos participei da Missa do Galo, celebrada pelo Monsenhor Gallo! Na nossa igreja será ás 20h00 minutos, vem uma enormidade de fiéis. Depois irão para sãs casas onde celebrarão em família com a ceia. Fato que acho muito importante, por reunir os membros da família.
Um fato que tem ocorrido ultimamente é a dificuldade de se adquirir presépios, e a farta variedade da figura de Papai Noel em situações inimagináveis.
O Natal está totalmente descaracterizado. O que vale hoje é o consumismo. Praticamente tudo que se encontra “brilhando” no comércio vem da China. Qual é o Natal na China? O cristianismo tem uma pequena parcela da população que pratica e sofre perseguições. É comércio e acabou. Isso existe em todas as partes do mundo. Se você for ao Japão poderá ter a impressão de que é o país mais cristão que existe! Natal para nós não é comércio! Sempre trabalhei, e consegui obter sucesso principalmente em cidades menores, incentivando os comerciantes a montarem presépios em suas vitrines. Inclusive alguns comerciantes chegaram a fazer a novena de Natal. Em uma cidade grande como Piracicaba isso se dilui. Eu tentei dar um colorido diferente á igreja, através de enfeites, de presépios, mensagens. Tentei fazer um pouco de frente aquilo que está ai. É um consumismo desnecessário.
Isso tudo empurra a pessoa para uma situação caótica?
De angústia inclusive! Os pais que não têm poder aquisitivo para adquirir presentes, as crianças que não irão receber praticamente nada, o vizinho que mora ao lado, tem coisas muito boas. O que deveria ser motivo de grande alegria para todo mundo para grande parte acaba sendo motivo de angustias e frustração. Até que ponto que as pessoas que estão nessa situação financeira, econômica e social têm condições religiosas de superar o problema e ter uma visão diferente do sentido do Natal.
A impressão de que se tem é que os confessionários á medida que esvaziam, enchem salas de psicólogos e psiquiatras. Qual é a opinião do senhor?
Fala-se. Comenta-se. São opiniões. Desconheço uma estatística que comprove isso cientificamente. É evidente que hoje a problemática é tão grande, que é importante que haja a confissão, mas é importante também que haja psicólogos, psiquiatras. Muitas vezes alguma pessoa que me procura para uma confissão, eu mando para o psiquiatra, para o médico. O problema da pessoa é muito mais de saúde psíquica do que problemas de pecado. Muitas vezes as pessoas não têm condições para pagar um psiquiatra, ela confessa seus pecados e eles são resultados de desajustes emocionais, familiares, sociais. Na nossa paróquia não diminuiu o número de confissões, pelo contrário, aumentou. Na última segunda feira fizemos uma confissão comunitária, havia praticamente 900 pessoas! É um rito especial. Vem pessoas de todos os cantos da cidade inclusive de outras cidades.
O senhor é um capuchinho convicto?
Sou convicto de que sou um verdadeiro frade!
Nas madrugadas, particularmente na televisão, há uma profusão de programas de cunho religioso, alguns até certo ponto hilários. Como o senhor vê isso?
Está profetizado na Bíblia! Haverá tempos em que surgirão falsos profetas de todos os lados que enganarão inclusive os santos.
O que significa no ano de 2009 o Natal, o nascimento de Jesus Cristo?
Significa tudo! Se Jesus Cristo não tivesse nascido nós não seríamos remidos. Nascimento, a vida Dele, a mensagem Dele, a morte e a ressurreição. O Natal é tudo, complementado com a Páscoa. Nada adiantaria Cristo ter nascido se não tivesse ressuscitado. Qual é o crédito da divindade de Jesus Cristo? É a fé na ressurreição! Ela não é a retomada de um cadáver, é o passar a existir em uma dimensão nova, fora do espaço, fora do tempo, fora da realidade humana concreta.
O senhor foi Frei Guardião aqui na Igreja dos Frades, e era tido como “durão”.
É meu caráter. Eu não mostro os dentes com muita facilidade. Se mudar, não sou eu. A incapacidade de gerenciar as próprias emoções são defeitos, limites do próprio caráter. Temos que trabalhar nosso caráter. São meus pontos de vista, se você me provar o contrário eu não tenho dificuldades em aceitar. Eu peço muitos conselhos ás pessoas! Não tenho também muita preocupação em ficar agradando, ou deixar de fazer alguma coisa porque o outro não concorda. Na minha vida nunca deixei de ter nenhuma iniciativa por medo do fracasso. Nem tudo deu certo. O fracasso é não tomar uma iniciativa por medo do fracasso.
O senhor escreveu algum livro?
Não. Tenho muitas palestras e conferências escritas. Acho que existe muito livro para ler hoje, eu não venço ler tanta coisa!


Comentários:
frei saul peron,
fiz minha primeira comunhão com o senhor em 1976, na capela São José, na Fazenda Taquaral, lá pelo fim da Av. Rio das Pedras…. quanta saudade!
sua benção,
Claudinei Pollesel
# postado por Claudinei Pollesel : 5:17 AM

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1 comentário

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