PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
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A Tribuna Piracicabana
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Entrevista 1: Publicada: Ás Terças-Feiras na Tribuna Piracicabana

Entrevista 2: Publicada no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

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Entrevistado: MAESTRO VICENTE GIMENES

DATA: (30/julho/2008)

O objetivo que o ser humano persegue é alcançar certo equilíbrio, no qual nem o interior nem o exterior predominem, mas ambos sejam igualmente complementares um ao outro. As pessoas têm se tornado tão voltadas para fora que não conseguem, nem mesmo por um simples momento, sentar em silêncio. O medo é encontrar o vazio e uma vez que ele seja encontrado, a vida perde todo o interesse, todo o sabor, todo o sentido e significado. Muitos fogem de si mesmo. E chamam de divertimento a essa fuga. Culturalmente nosso povo não põe a educação como um objetivo central da vida. A Finlândia criou, com medidas simples e focadas no professor, o mais invejado sistema educacional Quem entra numa escola na Finlândia se espanta com a simplicidade das instalações. O segredo da boa educação finlandesa realmente não está na parafernália tecnológica, mas numa aposta nas duas bases de qualquer sistema educacional. A primeira é o currículo amplo, que inclui o ensino de música, arte e pelo menos duas línguas estrangeiras. A segunda é a formação de professores. O título de mestrado é exigido até para os educadores do ensino básico. Vivendo praticamente no anonimato, dono de uma cultura invejável, cercado pelos seus inúmeros títulos, diplomas, troféus, medalhas e títulos. Uma vasta biblioteca, e alguns instrumentos de valor sentimental ou mesmo curiosos, como por exemplo, o cilício, uma série de pequenas correntes que eram atadas ou mesmo utilizadas nas sexta feiras como instrumento de suplicio do postulante á carreira religiosa. Um instrumento de flagelo Para a religião católica, evitar o sofrimento nem sempre é bom. Pelo contrário, a dor pode ser bendita e glorificada. A renúncia aos prazeres mundanos, ou até a busca de sofrimento físico, são considerados louváveis se vistos como forma de se entregar a Deus. Maestro Vicente Gimenes é nascido no município de São Paulo, mas é Cidadão Piracicabano, Cidadão Barbarense, Cidadão Saltinhense, Cidadão Riopedrense, Cidadão Sãopedrense.
O senhor nasceu onde?
Nasci em 13 de novembro de 1916, na localidade de Belém, hoje denominada, Franco da Rocha, na época Município de São Paulo, e uma choupana feita de barro e coberta de sapé. Com três anos de idade meus pais foram para a cidade de Igarapava. Mudamos para Araçatuba quando eu tinha uns quatro anos de idade. A Estrada de Ferro Noroeste estava no fim da sua construção. Meu pai João Gimenes mudou-se para lá porque a cidade estava em franco progresso, ele como carpinteiro, tinha muito serviço, toda casa que era construída precisava ser feito o madeiramento. Minha família era muito religiosa, fui coroinha na capela da vila até meus treze anos de idade. Vim para o Seminário Seráfico São Fidélis em Piracicaba, trazido pela minha mãe, Trindade Garcia Gimenes. Minha mãe nasceu em Argel, na Argélia. Meu avô, não queria que ela tivesse a nacionalidade africana, com menos de um ano de idade ela foi registrada como nascida na Espanha! Terminei meu curso onde estudei: português, geografia, história, ciências, civilidade, religião, música, canto gregoriano, italiano, francês, latim, grego, noções de regência e rudimentos de teatro. Tive o início musical com Frei Leonardo encarregado da música figurativa. A formação completa de Canto Gregoriano eu tive com Frei Alberto, formado no Conservatório de Viena. Com o mesmo frade tive aulas de latim. Do Seminário Seráfico São Fidelis, fui para o Seminário Diocesano de Campinas, cujo reitor era Emílio José Salim, fundador da Faculdade de Filosofia de Campinas. Nesse seminário além dos demais estudos tive aulas de grego com o célebre Padre. Ludovico, em conjunto com os meus colegas, que são os padres Talassi, vigário em Rafard e Padre Romário, já falecido. Tive aulas de canto gregoriano com Monsenhor Moura. Saindo do Seminário Diocesano, passei alguns dias em São Paulo onde recebi orientações sobre canto gregoriano do Maestro Furio Francesquini professor de música no Seminário do Ipiranga. Voltei para Piracicaba, para fazer o Noviciado com os padres capuchinhos. Após concluir esse período fui fazer o curso de Filosofia em Mococa. Nesse curso tive aperfeiçoamento da língua latina, rudimentos da língua hebraica, com Frei Fidelis. Passei a fazer o curso de Teologia. Quando faltavam três anos para a ordenação sacerdotal, tomei a decisão de não ser sacerdote. Permaneci morando em Piracicaba, obtive o registro definitivo no Ministério de Educação e Cultura para lecionar greg, latim e música. Terminei o curso de canto. Em 1954 conclui o Curso Superior de Canto Orfeônico.
O senhor é regente?
Em 1970 recebi o certificado de compositor e regente da Ordem dos Músicos do Brasil. Na ocasião foi feita uma homenagem onde estavam presentes: Francisco Petrônio, Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Vanderléia.
Quais foram os corais que o senhor já regeu?
Foram: o Coral do Seminário Seráfico, de 1934 a 1935, sendo meus cantores: Otávio Ribeiro, Angelin, José Roveli, depois passou a ser Frei Paulino. Regi o Coral Santa Cecília, misto, na Vila Anastácio, São Paulo. Regi o Coral dos Filósofos e Teólogos de Mococa. Sou um dos fundadores do Coral Pio XI em Campinas. Organizador do Coral Santa Cecília da Igreja Bom Jesus, fundado pelo Padre Amaral, depois Bispo de Taubaté. Fui um dos organizadores do Coral Santa Cecília de Botucatu, com o Padre Pisani. Regi os corais de São Pedro, Santa Bárbara D`Oeste, das normalistas do Colégio Santa Bárbara, da Vila Rezende, Coral “Mário Dedini”(das indústrias Dedini, composto só por vozes masculinas). Coral Diocesano da Catedral, isso foi no tempo do primeiro Bispo de Piracicaba Dom Ernesto. Um dos fundadores e organizador do Coral São Luiz fundado em 24 de fevereiro de 1952. Coral das Indústrias Philips. Coral de Saltinho. Formei o orfeão da Escola Dario Brasil, com discos gravados em São Paulo. Regi o Orfeão das Normalistas do Sud Menucci que fora fundado e organizado por Fabiano Lozano. Reorganizei o Orfeão Piracicabano com uma música executada no velho Teatro Santo Estevão. Comecei a tocar na matriz de Santo Antonio, hoje Catedral em 1943.
O senhor é compositor oficial dos hinos de algumas cidades?
Sou compositor oficial do Hino de Santa Barbara D´Oeste, de Saltinho, de Borebi.
O senhor participou da fundação de vários colégios?
Sou um dos fundadores do Colégio “Emílio Romi” de Santa Bárbara D`Oeste juntamente com o Professor José Noronha e Professora Lourdes Grisoto. Também do Colégio São Pedro juntamente com o Professor José Noronha e professor Benedito Cotrim sou um dos fundadores. Participei da fundação do Colégio “Monsenhor Gerônimo Gallo” com os professores Ivo Ducatti, Grillo, Di Lello. Em Rio das Pedras juntamente com Dona Iza e Professor Jussiê, além de outros mestres, fundamos o Colégio de Rio das Pedras.
O senhor possui vários arranjos para músicas sacras e profanas?
Fiz arranjos e composições a 4 vozes mistas de músicas sacras e profanas, entre elas está o arranjo a 4 vozes mistas de “Piracicaba” de Newton de Mello. Esse arranjo foi executado por corais de São Paulo, Alemanha, Suíça, França, Estados Unidos pelo coral “La Chanson” de Friburgo, Suíça.
O senhor lembra-se das línguas que aprendeu ainda jovem?
(Com ar indignado ele pergunta) Se eu me lembro? Claro que sim! Nesse momento Maestro Vicente dá uma volta ao mundo falando em diversos idiomas: espanhol, italiano, latim, grego, francês! Só fica um pouco tímido para falar em hebraico!
O senhor deu aula de línguas no Sud Mennucci?
Lecionei grego, latim, espanhol e música no Sud Menucci!
O senhor chegou a usar habito no seminário?
Usei. Até transferir-me para o Seminário Diocesano de Campinas.
Por que o senhor acha que não seguiu a carreira religiosa?
Vocação é um mistério! A certeza existe na cabeça do indivíduo, só que a realidade nem sempre obedece a essa certeza.
Qual é a diferença entre regente e maestro?
Quem rege é regente. Não é maestro. Maestro tem que ter curso superior de música. Eu tenho o curso superior de música, feito em São Paulo, do tempo do Canto Orfeônico João Batista Julião, com orientação de Villa Lobos.
O que atrai o senhor na música?
Ainda como coroinha eu já cantava a ladainha. Minha voz de menino era admirada por aqueles que a ouviam.
O senhor toca órgão?
Toco! O órgão da Catedral veio da cidade de Santos. Lembro-me quando foi montado esse órgão. O montador do órgão chamava-se Rigatto. Para a inauguração veio um grande maestro de São Paulo. Após a inauguração, o primeiro que colocou a mão fui eu!
Qual a diferença entre orfeão e coral?
Orfeão geralmente é cantado após decorarem a música. Coral lê a musica!
O que sente um maestro ao reger um coral?
O maestro transmite o sentimento para os cantores! O maestro quando rege dá o seu sentimento! Ele dá o colorido da execução! A personalidade do maestro é que faz o coral.
Quantos ensaios devem ser feitos por semana?
Geralmente dois ensaios.
O senhor conheceu o Teatro Santo Estevão?
Regi o Coral Piracicabano no Teatro Santo Estevão! A Cidinha Mahle era minha cantora na época!
O senhor conheceu o Comendador Mário Dedini?
Conheci! E executei com o Coral São Luiz várias músicas dentro da casa dele, ali na Rua Santo Antonio! Apesar de ser um homem de posses não era orgulhoso!
O senhor esteve com algum Papa?
Eu estava visitando o Vaticano e tinha uma comissão francesa que havia marcado audiência com o Papa. Eu via aquela turma, vi que fizeram uma fila, entrei na fila, me deram um cartão de acesso! Percebi que durante o trajeto até onde estava o Papa olhavam para mim com ar de interrogação, como dizendo: “Quem será esse sujeito?”. Ao chegarmos ao destino, foi feito um semicírculo, nesse momento entrou João Paulo II. Imediatamente eu gritei em latim: “Dá-me sua benção! Para mim e para minha família!”. Ele deixou a todos e perguntou-me se eu falava latim. Perguntou-me de onde eu vinha. Disse-lhe que era brasileiro e de Piracicaba! Ao despedir-se de mim o fez em italiano. Em latim quando se chega a algum lugar deve-se cumprimentar dizendo Ave! As palavras dirigidas pelos gladiadores ao imperador, antes de entrarem em luta eram: “Ave Caesar, morituri te salutant” que significa: “Salve César, os que vão morrer te saúdam”. Eu acho que o Papa deveria despedir-se e latim: Salve! (Até logo!). Posso dizer que falei com o Papa em latim!
O senhor lembra-se da missa em latim?
Lembro-me sim! “Introibo ad altare Dei” (Entrarei ao altar de Deus). “Ad deum qui laetificat juventutem meam” (A Deus, que alegrou minha juventude). Era isso mesmo, não é? Pergunta o maestro com a expressão do coroinha do tempo em que Araçatuba era sertão.


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