A dermopigmentação é o ato de pigmentar ou colorir a pele. Também chamada de tatuagem, em francês tatouage ou tattoo em inglês. O termo tem sua origem em línguas polinésias na palavra tatau. Era o som feito durante a execução da tatuagem,onde se utilizavam ossos finos como agulhas e uma espécie de martelinho para introduzir a tinta na pele. Pesquisas arqueológicas afirmam que já foram feitas tatuagens no Egito entre 4.000 a.C e 2.000 a.C. Nativos da Polinésia, Filipinas, Indonésia e Nova Zelândia, tatuavam-se em rituais ligados a religião. Na Idade Média baniu-se a tatuagem da Europa. Em 787 ela foi proibida. Qualquer cicatriz, má formação ou desenho na pele não eram vistos com bons olhos. No século XVIII, porém, a tatuagem se tornou bastante popular entre os marinheiros. Com a circulação dos marinheiros ingleses, a tatuagem e a palavra tattoo entraram em contato com diversas outras civilizações novamente. Em 1879 o governo da Inglaterra adotou a tatuagem como uma forma de identificação de criminosos. A partir daí a tatuagem ganhou uma conotação fora-da-lei no Ocidente. Durante a Segunda Guerra Mundial, a tatuagem foi muito utilizada por soldados e marinheiros, que gravavam o nome da pessoa amada em seus corpos. Para identificação, nos campos de concentração os segregados eram tatuados no antebraço com números de série, ou outras identificações. Prática muito utilizada para identificar o povo judeu no período nazista. Com a evolução dos meios de comunicação, a tatagem passou a ser uma opção pessoal. São inúmeros os motivos que levam uma pessoa a marcar em seu próprio corpo um símbolo que ela poderá manter pela vida toda. O cantor Chico Buarque junto com Rui Guerra são autores da música cujo título é Tatuagem, composta em 1972 para a peça teatral Calabar:
Quero ficar no teu corpo feito tatuagemQue é pra te dar coragemPra seguir viagemQuando a noite vemE também pra me perpetuar em tua escravaQue você pega, esfrega, negaMas não lavaQuero brincar no teu corpo feito bailarinaQue logo se alucinaSalta e te iluminaQuando a noite vemE nos músculos exaustos do teu braçoRepousar frouxa, murcha, fartaMorta de cansaçoQuero pesar feito cruz nas tuas costasQue te retalha em postasMas no fundo gostasQuando a noite vemQuero ser a cicatriz risonha e corrosivaMarcada a frio, a ferro e fogoEm carne vivaCorações de mãeArpões, sereias e serpentesQue te rabiscam o corpo todoMas não sentes.
Adilson Vicente Scarpelim é um nome pouco conhecido em Piracicaba. Mas se for chamado pelo apelido de Garoa, veremos que é uma pessoa bem popular, principalmente entre aqueles que apreciam a arte da tatuagem. É interessante notar que de calça e camiseta Garoa não parece estar tatuado. Só quando retira sua camiseta é que percebemos o seu apreço pela atividade que realiza seus ombros, tórax, costas e braços estão estampando figuras, usando a própria pele como tela de pintura.
Garoa, você é um tatuador profissional, reconhecido pela qualidade do seu trabalho, não só em Piracicaba como em outras localidades onde já atuou. Quando foi despertado seu interesse pela arte de tatuar pessoas?
Trabalho com arte desde criança, no início pintava telas, quadros, camisetas. Era um hobby. Com o tempo fui direcionando esse talento para essa área, que mais complexa. Essa atividade acabou gerando um recurso financeiro maior do que obteria com quadros e camisetas. A partir dos dezesseis anos de idade eu passei a ter acesso a materiais apropriados, eu também tinha evoluído minhas aptidões para o desenho. Considero que a partir desse período é que eu estava fazendo arte. Até então eu estava fazendo o que é chamado de laboratório, ou seja, experiências. Praticamente sem nenhum compromisso maior. Eu nasci no dia 5 de julho de 1964, em Piracicaba, na Vila Rezende, mais exatamente no então Bairro do Paieiro, situado na Avenida Armando Dedini (Essa avenida passa em frente ao Shopping Piracicaba Hotel Íbis, ao lado do Shopping Piracicaba). Para começar meus estudos eu tinha duas opções, iniciar o primeiro ano com seis anos e meio de idade ou esperar que completasse os sete anos de idade. A idade regulamentar para iniciar os estudos era 7 anos de idade. Na ocasião o Sesi 165, uma escola da Vila Rezende, através da sua direção resolveu realizar um teste comigo. Esse teste implicava entre outras coisas, desenhar a minha família. Fiz tão bem o desenho que os responsáveis pela escola consideraram que eu tinha estrutura para começar a freqüentar o ano letivo com seis anos e meio de idade.
O artista geralmente passa a ter seu trabalho reconhecido de forma mais expressiva após morrer, e você quis sair dessa circunstancia?
Eu resolvi não ficar esperando que isso ocorresse!
Outras pessoas da sua família também desenham?
Eu tenho uma sobrinha, a Caroline, que desenha muito bem. Meu irmão, que é o pai dela, incentiva o seu trabalho. A técnica que ela utiliza é baseada em grafite (lápis). Ela tem como eu tive em minha infância, muito contato com livros, revistas, isso desperta na criança, no adolescente o interesse. No caso da Caroline, ela teve sempre á sua disposição papéis e lápis á disposição para usar á vontade. Isso acabou desenvolvendo sua veia artística. Meu filho Juliano desenha muito bem, também. Eu não acredito muito na existência de talento de uma pessoa para arte. Acredito na prática e na oportunidade. Logicamente que deve haver interesse da pessoa por aquilo que ela tem á mão.
A profissão de tatuador é regulamentada?
Não. Mas existem portarias que regulamentam a fiscalização, em particular da vigilância sanitária. Pelo fato de trabalharmos utilizando objetos perfurocortantes, a secretaria olhou para essa questão e há uma fiscalização muito rígida, que considero muito importante. Isso valoriza o trabalho daqueles que trabalham de acordo com as normas da vigilância sanitária. Isso transmite tranqüilidade para aqueles que desejam serem tatuados.
Você tem uma aparência pessoal que não é muito comum entre os tatuadores profissionais, que tem um visual mais radical. Isso é fruto da sua formação educacional?
Com certeza! È fruto da educação que recebi, do meio em que cresci. Por muito tempo trabalhei como office-boy, fui guarda-mirim, aos 10 anos de idade. Por realizar a função de office-boy, na época, havia um contato próximo com executivos das grandes empresas estabelecidas na cidade. Era um trabalho de confiança, onde é exigido um bom comportamento e muito respeito e educação. O comportamento tem que ser bastante discreto. Acredito que essa é a origem da minha característica, de não ser uma pessoa espetaculosa. Não uso tatuagem no antebraço, piercing, isso não significa que eu reprove quem usa. Não tenho cabelo cumprido, apesar de o tempo ter levado uma boa parte! (risos). Algumas pessoas quando vão ao eu estúdio pela primeira vez, sofrem uma decepção em suas expectativas de encontrarem um profissional com visual gritante. Perguntam para mim: “Cadê o Garoa?”.
Como você analisa o fato de ter começado a trabalhar aos 10 anos de idade na Guarda Mirim?
Foi excelente! Na época a lei permitia. Nessa fase é que começam a serem formadas algumas características da moralidade, vão se formando os conceitos do indivíduo sobre a sociedade. Se não existir o contato com o mundo, com os princípios de responsabilidades, acabam se formando um vácuo, um vazio, na formação intelectual e moral da pessoa. O meu trabalho não afetava meu desenvolvimento físico, não era um trabalho braçal. Não atrapalhava meus estudos. E ainda eu tinha uma remuneração que ajudava. A lei que rege as normas a serem adotadas com relação ao menor é muito genérica. Ela acaba não cumprindo o seu papel social. Tem que ser estabelecidas emendas para regulamentar da melhor forma possível essa situação. È importante que os menores trabalhem em boas empresas, que sejam influenciados por essas empresas, com isso no futuro haverá um profissional já preparado para o mercado. Se tiver que esperar o jovem completar 18 anos de idade para então passar a se integrar no mercado de trabalho, somente após a sua formação acadêmica, cria-se um período em que não há pessoas para realizar atividades básicas. O que acontece é que se coloca uma pessoa com 20 anos de idade para realizar uma tarefa que qualquer garoto faz. Essa pessoa está em uma faixa etária em que deve realizar atividades mais importantes! Mais complexas. Com isso é tirada a oportunidade do menor ter uma formação adequada e cria um adulto frustrado por ocupar cargos que não o realizam plenamente.
Como surgiu o seu cognome de Garoa?
Surgiu quando eu tinha uns 12 anos de idade, fui morar em São Paulo, na casa de um primo, e quando eu voltava para Piracicaba, meus amigos perguntavam: “-Como é a terra da garoa?” Ficou essa coisa de garoa, garoa, pegando o apelido.
Quando surgiu a sua decisão de realizar tatuagens?
Se você observar, irá notar a necessidade do ser humano de registrar fases da vida. Os que mais sentem essa necessidade são os jovens, eles são mais abertos á novidade. O jovenzinho está sempre se cutucando, querendo fazer um sinalzinho. Na minha época, na escola, havia aqueles que usavam a ponta do compasso para fazerem algum tipo de marca. No afã das paixões, pode ser o nome de uma namorada, um coraçãozinho. Quando passei por esse período não fiquei só na ponta do compasso. Peguei agulhas e tintas e fiz em mim mesmo. Existe uma definição de uma socióloga que achei muito interessante. Ela diz que a tatuagem vem suprir as necessidades de rituais que faltam na nossa cultura. Temos poucos rituais que registram nossas fases de vida: batizado, crisma, casamento. È um número baixo de rituais. O ser humano tem uma necessidade intensa de registrar, marcar suas fases. Surge então o impulso de se tatuar. Hoje existem muitos casos em que a tatuagem deixou de simbolizar uma fase da vida do indivíduo e passou a ser adorno decorativo!
Além de ter começado fazendo tatuagem em você mesmo, quem mais foram as suas “cobaias”?
Meus amigos! Acho que fui o inimigo público número 1 do bairro! As mães não aprovavam tatuagens. O resultado obtido não era uma coisa tão bonita para ser apreciada. Era um trabalho grosseiro. Ficava mais como se estivesse manchando, sujando a pele do que algo bonito de se ver.
Quantas tatuagens você realiza por dia, em média?
Em torno de três por dia. Já faço tatuagens há 30 anos. Só que durante esse tempo, houve alguns intervalos na realização de tatuagens.
Em quanto tempo você realiza uma tatuagem relativamente simples?
Uns vinte minutos. Pode ser uma borboleta, uma flor. Um beija-flor.
Se um jovem menor de dezoito anos for fazer uma tatuagem é necessário ter autorização dos pais ou responsáveis?
Não pode ser feita tatuagem em jovem menor de dezoito anos de idade. Existe a Lei Estadual de São Paulo de número 9.828, do Deputado Campos Machado, que proíbe desde 1997, a aplicação de piercings e tatuagem em menores de idade, mesmo com o consentimento dos pais. Essa lei existe pelo fato de uma menor, que durante a sua adolescência foi se tatuando e houve negligencia por parte dos pais na orientação dessa menina. Isso foi em São Paulo. Ela procurou um deputado pedindo que ele a ajudasse a remover as tatuagens que ela havia feito, no período em que ela não tinha total consciência, não tinha muita responsabilidade, inclusive ela acusou os pais de não a terem orientado da forma correta. Ele viu a necessidade de fazer uma lei para proteger menores de seus pais que forem considerados irresponsáveis. Existe, infelizmente, tatuadores que agem de forma irresponsável, tatuando, marcando as pessoas de forma definitiva. De novo a lei vem de uma maneira generalizada, ajuda no sentido de inibir, mas prejudica quem com bom senso, com responsabilidade, quer fazer uma tatuagem pequena, em uma parte discreta, que não irá afetar em nada o futuro dessa pessoa. Quando me procuram, mesmo a pessoa sendo adulta, eu converso bastante e procuro esclarecer que aquilo não irá sair mais. (N.J. No artigo 129 do Código Penal Brasileiro, nos parágrafos 9 e 10 consta que: “Equipara-se à lesão corporal simples a colocação de tatuagens, piercing em qualquer parte do corpo, de menor de 18 (dezoito) anos de idade e maior de 14 (catorze) anos. Aumenta-se a pena de um sexto se a vítima é menor de 14 (catorze) anos de idade.”).
Tatuagem envolvendo o nome da pessoa amada, no caso de uma separação é possível de ser mudada?
Dá para fazer uma alteração no desenho. Faço muito isso, assim como correção de trabalhos que não agradaram a pessoa. A pessoa faz a tatuagem: “Maria ama José”, rompe com José e passa a namorar o Paulo. Eu posso transformar essa tatuagem em diversas outras figuras: um dragão, um ramo de flor.
Qual a pessoa com idade mais elevada que você já tatuou?
Foi o Seu Salvador, aposentado, já na terceira idade. Tatuei em Barra do Sahy, ele é de Rio Claro e mora lá. Ele tinha uma cruz, tatuada no braço, de forma primitiva. Essa cruz virou o rosto de uma índia.
Você já fez tatuagens em regiões inusitadas do corpo?
Já! Inclusive no lado interno do lábio de três rapazes.
Você fez tatuagem em uma modelo que posou para a revista Playboy?
Fiz, foi uma fada tatuada na altura da cintura. Foi a Simone Dreyer Peres, mais conhecida como Syang. Têm várias que freqüentam a revista Caras e que eu tatuei.
Houve um caso em que o tatuado tinha vitiligo?
Foi em uma pessoa que tinha grande constrangimento por ter manchas na região peniana.
Quais os cuidados para se fazer uma tatuagem?
É obrigatório que o tatuador use luvas, máscara, óculos. O ambiente deve ser esterilizado. Uso de material descartável. O que não for descartável tem que ser feito uma assepsia em autoclave.
Você teve um caso em que a pessoa tatuou na sola do pé?
A pessoa tatuou um olho na sola do pé, ele brincava que era para ver bem onde pisava!
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