PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 06 de julho de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: LUIZ ANTONIO ARTHUSO
Luiz Antonio Arthuso é nascido a 20 de abril de 1957 na cidade de Rio das Pedras. Filho de Antonio de Jesus Arthuso e de Ana Modesto Arthuso, é casado com Maria Luiza Packer Arthuso. Luiz Antonio e Maria Luiza tem dois filhos, Luiz Alexandre e Ana Luisa.
O senhor atualmente ocupa qual cargo na Receita Federal?
Eu tenho o cargo de Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil. O cargo de Delegado da Receita Federal é o cargo de chefe da unidade. A receita aqui tem o delegado, os chefes dos serviços, chefes das equipes, e os funcionários. Isso gera um pouco de confusão. O delegado de polícia tem esse cargo. O meu cargo é de auditor, como delegado exerço a função de auditor chefe, ou chefe da unidade. A receita federal tem duas carreiras, uma carreira de auditoria da receita e outra de analista.
Seus estudos iniciaram-se onde?
Fiz o curso primário em Rio das Pedras no Grupo Escolar Barão de Serra Negra, o ginásio estudei na E. E. “Prof. Manoel da Costa Neves” (MACONE).Em seguida fui estudar no Colégio Comercial Municipal Contador Waldomiro Domingos Justolin, depois fui para a Unimep onde estudei Economia de 1975 a 1978. Em 1989 voltei pra terminar a Facldade de Ciencias Contábeis. Em 1992 fiz o mestrado em Administração na Faculdade Metodista de São Paulo. Não havia o mestrado aqui naquela época. Ia uma vez por semana e voltava. Quando meu pai faleceu eu tinha onze anos, ele foi pedreiro, depois foi desenhista na prefeitura, ele auxiliava o Engº Civil Ciro Barbosa Ferraz. Minha mãe era do lar, lembro-me que ela e minha tia bordavam em casa. Nasci na Rua São Paulo, 43, é uma rua de apenas duas quadras. Em !957 quando nasci o Gramani era o prefeito, ele tinha feito tanto o encamento de água, o egotoe os paralelepipedos na rua.
Nessa época tinha trem em Rio das Pedras?
Quando o trem ia passar eles fechavam a porteira no centro da cidade. Aos sábados e domingos era comum ir ver a chegada do noturno as nove horas da noite, a coisa mais dificil era o trem da Sorocabana chegar no horário. Quando estavamos em Indaiatuba saiamos as seis horas da noite para chegar as nove horas da noite, era uma aventura, principalmente quando era a Maria Fumaça.
O senhor chegou a andar de trem?
Muito! Minha tia morava em Indaiatuba e praticamente todo mês íamos à Indaiatuba de trem. Isso foi no período em que eu tinha de seis a doze anos. O trem parou de correr em 1975 com o transporte de passageiros, depois tiraram o de cargas. A linha férrea só foi tirada em 1984.
A estrada para Piracicaba era essa mesma?
Essa que vem pela Rodovia Cornélio Pires teve a ligação com Rio das Pedras construida por volta de 1960 a 1961, asfaltada. A estrada de terra na realidade é essa que é a continuação da Avenida Rio das Pedras, saia onde é o Borsato, no Bom Retiro. É bem mais curta, praticamente a metade do caminho. A tendencia natural é que se faça uma grande avenida ligando Piracicaba a Rio das Pedras. Isso já foi discutido entre os prefeitos Machado e Galvão. Sentei a mesa para discutir isso com eles. Tem uma série de custos, despropriações, mas é uma questão de tempo. Hoje Piracicaba e Rio das Pedras estão praticamentes juntas. O Anel Viário onde está o Ceasa já é Rio das Pedras. O Ceasa está em Rio das Pedras. Quando se vai pela Unimep o Córrego da Batistada é a divisa do municipio.Quando eu era criança pescava no Tanque da Companhia, hoje não existe mais, era onde hoje tem a escola no Cambará. Um pouquinho para baixo era o tanque, eles aterraram ali. A Sorocabana fez o tanque ali, por gravidade levava até a estação, para encher as Maria Fumaças de água.
O senhor tinha alguma atividade profissional além dos estudos?
Aos treze anos comecei a trabalhar na fábrica de gaiolas do Paulo Pascon. Eu ia estudar no ginásio de manhã e a tarde fazia gaiolas. Parei de trabalhar na fábrica de gaiolas aos 16 anos. Fui trabalhar com o meu tio em uma ofina de marcenaria. Depois trabalhei uns quatro ou cinco meses na cerâmica que o Seu Augusto , Seu Olívio e Seu Euclides Barrichello tinham, eram três irmãos. Onde hoje é a seção de pintura da Painco era a Cerâmica Santa Rosina. Onde hoje há uma chaminé no Bom Jardim era a Cerâmica Barrichello. Fazia tijolos. Eu trabalhava no escritório, tirava notas, Depois fui trabalhar na Painco, comecei na escrituração fiscal, depois fui fazer a contabilidade da Painco. Fiquei na Painco de outubro de 1973 até maio de 1978. Em 1978 vim trabalhar em uma pesquisa da Unimep, acho que foi o primeiro passo na tributação. O estudo sobre a reforma tributária de 1.966. Trabalhei com Lineu Mafezzolli que é professor até hoje, com o Machado que foi prefeito, com o Barjas, Pedro Ramos, ficamos um ano trabalhando, acabou saindo um livro de finanças públicas pela Secretaria de Economia e Planejamento. Quando acabou a pesquisa voltei trabalhando junto com o Godoy, Perecim e o Geraldo Cillo. Devois fui trabalhar na Convem com o Toninho Abdalla. Eu ja tinha prestado um concurso como fiscal da previdência, tinha passado em 1980, em 1981 prestei o concurso da Receita, na época de Controlador de Arrecadação Federal. Quando entrei, no final de 1982, fui trabalhar em Limeira. Em Piracicaba trabalhei na agencia de outubro de 1984 a outubro de 1985. O chefe era o Altafim, antes dele era o Shirley Prado, o nome do prédio que ocupamos hoje é Shirley Prado, em homenagem a uma pessoa que todos gostavam.
Qual era a gaiola mais famosa?
Acho que era a fabricada pelo Angelo Cobra, para o curió.
Existemuitos macetes para confeccionar uma gaiola?
Existe os caminhos da arte de produzir gaiola. A parte que as pessoas menos entendem é como você consegue arquear a gaiola. A madeira é cortada, é cozida na água, ficava meio dia cozinhando na água, tinha que tomar muito cuidado com as fibras, tinha que ser fibras retas, após cozida era colocada em um molde onde era pregada e ficava uns 15 a 20 dias secando até adquirir aquela forma. Dava bastante trabalho. O processo de fabricação dessas gaiolas arqueadas, que a gente chama de cambota, demorava praticamente um mês. Eram produzidas em série, começava a a fazer, enquanto isso passava a fazer outros modelos. Eram vários modelos de gaiolas feitos ao mesmo tempo. Cada uma em um estágio. A madeira utilizada era o pinho, as vezes cedro. Eu brinco, que ele era um grande reciclador, praticamente desde quando eu trabalhei até quando ele morreu ele tinha o estoque de carreteis de madeira de fios que foram utilizados nessas torres de energia elétrica da região, ele foi adquirindo aquele carreteis e demontando, com isso ele tinha madeira a vontade para fazer gaiolas. E barata.
Piracicba foi famosa por fabricar gaiolas.
Foi muito famosa. Hoje não vemos mais isso, mas até uns 15 anos, as lojas do mercado de São Paulo exibiam cartazes dizendo “Gaiolas de Piracicaba”, acredito que algumas nem eram mais feitas em Piracicaba. Assim como a pamonha, a cachaça, era dada a origem como sendo de Piracicaba. Acho que produziamos umas 200 gaiolas por mês. As vezes apareciam alguns clientes conhecidos, dois dos quais me lembro eram o Oberdan Cattani que atuou como goleiro outro era o Nílton De Sordi. Foi o De Sordi que trouxe os pintassilgos da Venezuela para criar o canário vermelho, ele cruzava com as femeas do canário do reino gerando a cor vermelha. Eles apareciam lá, tinhamos a oportunidade de conversar com eles.
O cultivo da cana-de-açucar reduziu drásticamente o numero desses passaros nativos?
Eu acredito que hoje vemos um grande número de pássaros na cidade, mas para mim, o que acaba com os passarinhos não é a cana, mas a pulverização de inseticidas e dissecantes por meio de avião. A queima da cana também prejudica muito. O grande problema da cana é que ela tira o habitat, por exemplo na cultura do café a árvore é perene. Mesmo assim as aves acabaram migrando para os vales onde ficaram as árvores. A pulverização por avião é extremamente danosa para o meio ambiente, principalmente para os passaros.
O fato de trabalhar nessa idade trouxe algum prejuízo ao senhor?
Ao contrario, ali aprendi não só a trabalhar como também a dar valor para o dinheiro. O Paulo tocava na banda, incentivado por ele, pelo meu tio Adão Brandila, como eu não tinha dinheiro para estudar datilografia fui aprender música. Eu tocava clarineta e sax, a banda era composta por 28 a 35 componentes. Hoje ela chama “Banda Antenor Cortelazzi” , o Seu Antenor Cortelazzi era o grande incentivador da banda. Na época era chamada “Corporação Musical Santa Cecília”. Aquela sede que tem da banda foi construída pelo pessoal mais antigo, isso foi em 1966, 1967. Eu comecei a tocar na banda em 1971. Tocávamos dobrado, maxixe, valsa. Depois passamos a tocar em carnavais, tocamos na Sociedade Cultural Riopedrense, a partir de 1973 começaram a fazer os carnavais populares nas ruas. Depois toquei na Banda Municipal, a última vez acho que foi em 1987.
Seguia uma partitura ou tocava de ouvido?
Seguia a partitura. Estudei com Seu Antenor um ano e pouco. Lembro-me quando entrei na banda. O pessoal mais antigo que fazia parte, morreram quase todos.
Como era o uniforme?
Logo que eu entrei tinha um uniforme que era uma calça preta, camisa branca, gravata preta, jaqueta banca com cordões amarelos e um quepe vermelho. Tocávamos em toda a região. Música é arte, não é competição, não nos preocupávamos muito com prêmios. Sempre estávamos viajando, vinha para Piracicaba, ia para Santa Bárbara, Americana, Monte Mor, Tietê. Era muito comum aquela cidade em que nos apresentávamos depois ela vinha se apresentar em Rio das Pedras. No aniversário de uma cidade ou outra ficávamos rodando as cidades.
O senhor tocou no coreto que existia em Rio das Pedras?
Toquei quando a sede era onde é a atual concha acústica. O coreto ficava no meio e a praça circulava o coreto. Em 1971 quando comecei a tocar ainda havia o coreto. Foi reformado em 1974 ou 1975.
O senhor vinha muito à Piracicaba?
Comecei vir para Piracicaba quando comecei a estudar, vinha todos os dias para a faculdade, praticamente andava de carona, todo mundo me dava carona. Comento que adquiri um passe para trinta dias, após 4 anos ainda não havia consumido o talão de passes. Muitas vezes eu estava no ponto do ônibus o pessoal chamava. Outras vezes pegava carona na própria escola. Havia uma solidariedade muito maior do que existe hoje. A cidade era bem menor, todo mundo se conhecia. A cidade deveria ter uns 15 a 16 mil habitantes. Rio das Pedras começou a crescer primeiro com a crise forte do café, a geada que deu no Paraná em 1975, muita gente acabou constituído o bairro conhecido como Serra Pelada. Eu imagino que o pessoal do nordeste do Brasil começou a vir para Rio das Pedras em 1988 a 1989.
A Receita Federal mudou sua postura nas últimas décadas?
O que eu sempre comento é o seguinte, todo serviço público, assim como a nossa vida, passou a ser algo totalmente corrido, a demanda que a Receita tinha era muito pequena em relação a que nós temos hoje. O trabalho que nós temos para ser feito é maior e a quantidade de recursos humanos que nós temos é menor. Para você ter uma idéia a Receita tinha em 1968 quando ela foi criada juntando quatro departamentos, 12.000 auditores (fiscais) no Brasil. Hoje ela tem 10.000 auditores. Ela trouxe do IAA – Instituto do Açúcar e do Álcool incorporado em 1985 e da Previdência fusionada em 2007, mas mesmo assim estamos abaixo que tínhamos em 1968.
Isso se deve a informatização?
A informatização tem sua influencia, sempre digo que é algo absurdo, a ponto de ser citada nos livros do Bill Gates da Microsoft, pela grande quantidade de situações que ela tem informatizada. A quantidade de dados que a Receita tem é algo fenomenal.
O que o senhor diz a respeito do T-Rex, um supercomputador?
Na verdade há muito folclore. Existe sim todo um trabalho da Receita para trabalhar com o que chamamos de Inteligência Artificial. Isso para entender como determinado grupo, determinado setor, tende a trabalhar. Nós trabalhamos com gestão de risco, não dá para afirmar: fiscalizamos todo mundo. Temos 6,5 milhões de empresas no país. A receita é dividida da seguinte forma: são 10 regiões, que são 10 superintendências. Uma é o Estado de São Paulo. Outra é Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Tocantins, Distrito Federal. Outra pega Acre, Amazonas, Rondônia, Roraima, Pará. Outra atinge Maranhão, Piauí, Ceará. A quarta região pega Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas. A quinta região é Sergipe e Bahia, a sexta região é Minas Gerais, a sétima é Espírito Santo e Rio de Janeiro, a oitava é o Estado de São Paulo, a nona Paraná e Santa Catarina e a décima que é o Rio Grande do Sul. Dentro de cada superintendência há a divisão de delegacias, inspetorias e alfândegas. São Paulo que é a maior de todas tem 26 delegacias, quatro alfândegas e uma inspetoria. Piracicaba e uma dessas delegacias.
Piracicaba tem um porto seco?
Não existe mais, não havia movimento para levar isso em frente. Era uma concessão pública. Economicamente não era viável, acabou sendo encerrada. Temos alfândega em Viracopos, Santos, Cumbica e uma alfândega em São Paulo que distribui as coisas da cidade de São Paulo. Há uma inspetoria que é a fiscalização aduaneira na cidade de São Paulo. Cada delegacia tem subordinada a ela as agências. Têm aqui as agencias de: Americana, Capivari, Rio Claro e Tietê. Cada agência tem sob seu controle algumas cidades. Somando tudo temos sob a delegacia de Piracicaba 25 cidades. Em extensão territorial não é tão grande, mas em termos de valores é muito significativa. Hoje no Estado de São Paulo em termos de arrecadação somos a décima delegacia. Com a instalação do parque automotivo em Piracicaba devemos subir alguns passos no ranking da arrecadação. A delegacia de Piracicaba é maior do que a delegacia de muitas capitais de estados.
O maior contribuinte é a pessoa jurídica?
Hoje a pessoa física paga o que foi descontado do salário dela, quem acaba recolhendo isso é a pessoa jurídica. Dos seis milhões e meio de empresas existentes no Brasil, setenta por cento da arrecadação está concentrada em doze mil empresas. Esse é um foco que acompanhamos permanentemente. As demais trabalhamos com gestão de risco. Não significa que ela será abandonada, ela será olhada dentro dos desvios que podem ocorrer. Até porque uma grande parte das pequenas empresas, os tributos delas são substituições tributárias, quem pagou é a grande. Por exemplo, a indústria automobilística, quem pagou foi a fábrica, a concessionária paga muito pouco. Ela ira recolher impostos de serviços, mas não da venda do veículo novo.
Na opinião pessoal do senhor, não como delegado, mas como economista, o senhor não acha que há um conflito em uma empresa de pequeno porte arcar com tributos na mesma proporção de uma grande empresa?
Essa é a opinião minha não é da Receita. Temos que tomar certo cuidado para não estabelecer certa concorrência que se torna desleal. Quando se dá muito incentivo para quem está começando, estará criando um desequilíbrio para o outro que é maior. Em minha opinião, deveríamos ter uma legislação para aquele que é muito pequeno e uma só para todos os outros. Isso evitaria uma série de distorções e desvios. Nós temos uma legislação tributaria extremamente complexa. As empresas alegam que a carga tributária é muito alta, só que o que ela gasta para administrar a empresa em termos de tributo é um valor muito grande. A pergunta é: “ Por que não muda?” Porque politicamente fazendo algumas mudanças, chegamos na questão da divisão do bolo tributário, entre união, estados e municípios, principalmente entre a união e os estados, quando você mexe de um jeito sempre alguém irá perder alguma coisa. Esse alguém nunca é o Estado de São Paulo. A grande dificuldade em mexer na legislação tributária é que todos os outros estados querem tirar mais alguma coisa do Estado de São Paulo. Por mais que o Estado de São Paulo abra mão, isso acaba ocorrendo porque acabou concentrando a riqueza no Estado.
O americano tem taxação única?
O americano tem dois grandes impostos, o imposto de renda que é nacional, é muito mais alto, as pessoas físicas pagam muito mais lá, e tem o imposto de consumo, que varia de estado para estado, não é uma taxa fixa. Vai de 5 a oito ou oito e meio por cento. Sempre perguntam: “-É possível fazer isso?”. Digo: “- Estamos falando de uma cultura anglo-saxônica!”. Não estamos falando de uma cultura latina. Nos Estados Unidos se o individuo for pego com uma mercadoria sem nota ele será preso. Mesmo que seja uma pessoa física andando na rua. Eles fazem isso exemplarmente. Aqui a saída foi mudar o modelo, esse modelo foi ficando extremamente complicado, está na hora de se mexer nisso. A questão é ter condições políticas de passar algo compatível, quando se tenta fazer isso sempre tem algum estado querendo levar vantagem.