PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado de 29 de julho de 2017
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
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Sábado de 29 de julho de 2017
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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ENTREVISTADA:
ENTREVISTADA:
MARIA GRAZIELA VICTORINO DE FRANÇA HELENE
Maria Graziela Victorino de França Helene nasceu em Piracicaba a 16 de outubro de 1951, filha do Dr. Geraldo Victorino de França, professor da Esalq e da sua mãe a professora Zilda Giordano Victorino de França que tiveram ainda os filhos Ivana Maria França de Negri, Maria Fernanda França Cabrini e Geraldo Victorino de França Júnior, que é o Bebe Bicentenário pois nasceu em abril de 1967, ele tem até um “diplominha” referente ao fato, “Minha mãe guardava, não sei se ele ainda o conserva”, afirma Maria Graziela.
Em qual escola a senhora iniciou seus primeiros estudos?
Eu morava em Campinas, meu pai trabalhava naquela cidade, estudei até a quarta série no Colégio Imaculada Conceição. Da quinta série em diante estudei no Colégio Nossa Senhora da Assunção, já em Piracicaba, para onde mudamos em 1963. Ali fiz os meus estudos, até completar o curso como normalista. Em 1969 formei-me como professora.
Sua infância foi vivida em Campinas?
A minha infância foi vivida em Campinas, embora estivesse sempre em Piracicaba, a família da minha mãe são todos de Piracicaba. Eu freqüentava muito a casa dos meus avôs. Mantive o laço com Piracicaba, nasci aqui e vinha sempre para cá, tenho uma ligação muito forte com essa terra!
Após a conclusão do curso, tornando-se professora, qual foi a sua próxima etapa?
Fui estudar artes plásticas, estudei em Campinas, aqui em Piracicaba estudei no ateliê do Professor Hugo José Benedetti por um período de três a quatro anos. Fui aluna também do professor Angelino Stella, com quem tive aulas de desenho. O Professor Benedetti gostava muito de retratos. Eu fazia obras em telas, gostava muito de fazer retratos. O primeiro retrato que fiz foi um auto-retrato. Fiz o curso de Belas Artes na Escola de Desenho e Pintura em Campinas.
Em 1967, Piracicaba completava 200 anos de fundação, foi um ano marcante para Piracicaba, e a senhora protagonizou eventos importantes na época?
O Baile das Debutantes era um acontecimento especial, para as participantes assim como para a cidade. Era um evento comum nos maiores centros urbanos do Brasil, sempre tinha um convidado especial, geralmente um galã que estivesse em evidência, no nosso baile a personalidade convidada foi o ator Hélio Souto, Estava fazendo grande sucesso nas novelas da TV TUPI e era casado com uma das filhas da família Morganti de Piracicaba. O Baile das Debutantes em que participei foi em junho de 1967. O presidente do Clube Coronel Barbosa era o Dr. João Tacla, A jornalista Alik Kostakis foi quem apresentou as debutantes. Èramos de 20 a 30 debutantes.
Naquela época era um cerimonial quase obrigatório para as moças da alta sociedade participarem do Baile das Debutantes?
Nós não iríamos freqüentar o clube a noite sem ser apresentadas à sociedade. Era o nosso primeiro baile! Nós, debutantes, ficamos muito ansiosas com relação a esse acontecimento. Era um momento mágico da vida da moça. A partir dessa apresentação poderíamos passar a freqüentar os bailes, sempre acompanhadas dos pais, todas éramos sempre acompanhadas pelos pais. Era uma época em que a família toda ia aos bailes. Os clubes eram freqüentados pelas famílias.
Infelizmente Piracicaba passou por um grande trauma quando desabou parte de um edifício em construção, o COMURBA ocorrido a 6 de novembro de 1964,quando se deu o fato em que local a senhora se encontrava?
Eu estava no Colégio Assunção, estudando. Essas coisas chegam rapidamente até o nosso conhecimento, as próprias freiras comentaram sobre o assunto. Havia entre nós uma grande preocupação com os parentes, nessa época nossa família morava na Rua Riachuelo. Foi um acontecimento muito forte, a cidade ficou de luto por muito tempo.
A seu ver, os festejos do Bi-Centenário de Piracicaba, foi uma grande virada de página na nossa história?
Com a queda do COMURBA a cidade praticamente parou. Não se construíam mais edifícios, as pessoas estavam temerosas. Aliado a isso havia um turismo negativo, muitas pessoas vinha visitar Piracicaba para ver o que tinha sobrado do edifício, as lajes ainda dependuradas, um espetáculo bizarro, vinham para fotografar o prédio destruído e o que havia restado. ( Por razões técnicas ou de outra natureza, a metade do prédio que restou,com enormes lajes pendentes, perdurou por anos incorporando-se ao cotidiano da cidade). Eu não me conformava com isso, pensava que com tanto lugar bonito na cidade iam tirar fotografias do palco de uma tragédia. Os festejos do Bi-Centenário foram intermináveis, não encerrou em 1967.
Símbolo do Bi-Centenário de Piracicaba, o cata-vento na faixa foi idealizada pelo grande mestre Arquimedes Dutra
Em sua juventude, qual era o lazer comum entre os jovens?
Havia, no nosso caso, muitas reuniões na Esalq, os professores e suas famílias reuniam-se em festas: juninas, de Natal, havia muitas festas. A Sra. Anneliese Brieger esposa do Professor Brieger era muito participativa, animava essas festas. Aprendi a tocar piano, na época toda menina tinha que aprender a tocar piano! Aprendi também a tocar acordeom e violão. Na época violão era considerado um instrumento mais utilizado pela boemia. Era tido como instrumento musical masculino, por isso era difícil as mulheres tocarem. Mas nós conseguimos! Gosto muito de música clássica internacional e brasileira, como Ernesto Nazareth, Zequinha de Abreu, Villa Lobos, Chiquinha Gonzaga. Gosto de boa música. Tive professores particulares e freqüentei também a Escola de Música de Piracicaba “Maestro Ernst Mahle. Mais tarde meus filhos também frequentaram essa escola.
Um fato marcante para a cidade e em especial para a senhora ocorreu em 1967?
Deu-se através da minha mãe. Após o Baile das Debutantes, o Dr. João Tacla abriu o concurso para Miss, isso foi no final de junho. Ele telefonou para a minha casa e falou com os meus pais se eu poderia ser a candidta do Clube Coronel Barbosa, cada clube da cidade tinha sua candidata, foram oito candidatas. Eu tinha só 15 anos! Para mim foi uma honra muito grande. Meus pais concordaram. No inicio fiquei um pouco apreensiva, depois acabei gostando, o Professor Arquimedes Dutra, Dr. Nelson Meirelles, pessoas importantes da cidade, eram os jurados. Foi um período muito intenso, minha mãe tinha dado a luz recentemente ao meu irmão mais novo, minha tia Ermelinda Germano, cuidava do meu irmão, era madrinha dele. Tia Rosina Antonia Jordão de Mattos (Toninha) ajudava,ela é mãe do Dr. Jairo Ribeiro de Mattos, do Paulo, João e Dalva, eles também frequentavam esses bailes, minha tia Vivica, se revezavam para me levar aos lugares, nunca ia sozinha, era menor, issso aos ensaios, ao encontro com o corpo de jurados. A minha roupa foi feita pela minha tia Antoninha. Ela fez o desenho, criou, e fez a roupa para o desfile de Miss. Fez uma capa bonita. Esse vestido que usei foi copiado depois, vi muitos semelhantes em diversos bailes em que eu ia.
A senhora aos 15 anos, em 1967 foi eleita Miss Bi-Centenário de Piracicaba?
Ao ser eleita assumi uma grande responsabilidade, tinha que representar a cidade em muitos eventos, o fotógrafo Cícero sempre estava documentadando esses eventos. Além dos meus pais, em todos os lugares ia uma comitiva comigo. Ia representar Piracicaba em cidades vizinhas, o prefeito na época era o Comendador Luciano Guidotti. Jornais de São Paulo e outras cidades noticiaram a minha eleição, bem cmo publicaram fotografias, realizaram matérias. A repercussão foi grande. Na época a mídia escrita e falada noticiava a vinda de autoridades até Piracicaba. “O Estádio Municipal foi utilizado para o pouso do helicóptero do Governador do Estado acompanhado de um ministro do Senegal e sua esposa, General Syzeno Sarmento comandante da Segunda Região Militar, um representante do Presidente da República Arthur da Costa e Silva e outras autoridades. A comitiva foi recebida pelo prefeito Luciano Guidotti, pelos deputados Athiê Jorge Coury, Pereira Lopes, Domingos Aldrovandi, Francisco Salgot Castillon seguindo diretamente para o palanque oficial armado na Praça da Catedral, onde se realizou o desfile militar, assistido por grande multidão. Bandeirolas do Brasil e do Estado de São Paulo eram agitadas pelos populares, que se acotelavam em todo o trajeto da parada. O grande cortejo contou com a participação de Tiros de Guerra da região, como o de Limeira, São Carlos, Americana, Rio Claro, elementos do 5º GCAM, do 2º RO de Itú, as Bandas Marciais da Força Pública de Piracicaba e de Campins. Logo após o desfile o governador e sua comitiva rumaram para o Centro Cultural e Recreativo Cristovão Colombo onde cortou perante grande massa popular a fita inaugural da Exposição Filatélica e Numismática. O governador carimbou oficialmente o selo de Piracicaba sendo a exposição aberta a seguir à visitação pública. A mostra que ficará aberta até o próximo dia 8.” Essa notícia foi divulgada por um jornal local.
COMEMORAÇOES DO BI-CENTENÁRIO DE PIRACICABA EM 1967
CINQUENTA ANOS DEPOIS A MESMA FAIXA, CETRO E COROA DESCANSAM NO TRONO DA ETERNA RAINHA DO BI-CENTENÁRIO
Quem eram os jurados que julgaram as candidatas a Miss Bi-Centenário de Piracicaba?
Eram o Dr. Nelson Meirelles e esposa, Dr. Hugo de Almeida Leme e esposa, Dr. Francisco Antonio Coelho e Sra.,Professor Nélio Ferraz de Arruda e Sra. Capitão Antonio Bruno e Sra.
Em seu intimo havia a certeza de que sairia a vencedora?
Acredito que todas tinham como esperança ganhar em primeiro, segundo lugar. Fui confiante, queria representar bem o clube, como de fato consegui.
A emoção foi muito grande?
A emoção foi muito forte! Uma alegria muito grande, vendo toda aquela festa, todo aquele aparato, a coroa, é um sonho realizado! A coroa é de prata, foi feita especialmente para a Miss Bi-Centenário, o presidente dos festejos, Dr. Rubem mandou gravar uma placa e colocou na coroa com o meu nome. O cetro foi o grande artista Eugênio Nardin que fez. A faixa foi idealizada pelo grande mestre Arquimedes Dutra, uma das particularidades é que na faixa está o símbolo do Bi-Centenário de Piracicaba, o cata-vento. Arquimedes Dutra dizia que como o cata-vento está sempre em movimento, simboliza o movimento e o progresso da cidade. E de fato, de 1967 para frente, como houve muitas festividades, a cidade teve um progresso muito grande. Até então estava estagnada, a tragédia do COMURBA tinha abalado profundamente a população. Foi uma época muito triste. Ao que parece, o ano do Bi-Centenário resgatou o espírito progressista e positivo da cidade. Esse espírito nascido em 1967 continuou nos anos seguintes. A cidade passou a ter mais festas, a ser mais alegre, foi como correr atrás da alegria deixada esses anos todos que haviam passado. Aonde eu ia tinha alguém me fotografando.
O dinamismo do prefeito Luciano Guidotti colaborou também?
Sem duvida! Ajudou muito! Era um prefeito muito amado pela população. Eu percebia, quando ele ia pelas ruas, o povo gostava muito dele.
Após ter sido eleita houve os festejos da coroação?
Após as atividades protocolares, houve o baile, um baile muito bonito, a primeira dança já como rainha foi com o meu pai. Depois eu dancei com o meu primo Jairo Ribeiro de Mattos.
Como foi retornar a vida normal de estudante sendo a Miss Bi-Centenário?
Minhas colegas me parabenizaram as freiras também gostaram muito, eu conversava muito com elas. Eu tinha uma cabeça muito boa. Continuei a minha vida normal.
Todo esse glamour se não for muito bem administrado pode interferir negativamente pela exposição da pessoa ao público?
Certamente! Houve uma grande exposição na mídia local e regional. Participei bastante de festas. Foi um período em que o carnaval de Piracicaba era tido como o melhor do interior paulista. O afluxo de artistas de renome era muito grande. Conheci vários artistas, como a Pepita Rodrigues, a diretora de cinema Aurora Duarte, irmã do Anselmo Duarte. Fui convidada a fazer cinema, eu disse que não era meu objetivo. Eu queria ser professora, fazer artes plásticas, queria estudar.
O encantamento das telas de cinema ou televisão não a atraiu?
Nem um pouco! Eu gostei mesmo é de ficar em Piracicaba, junto dos meus pais, da minha família. Não queria deixar a minha família de forma alguma e nem sair da minha rotina. Quando fiz 18 anos fui convidada para ser candidata a Miss São Paulo, eu também não quis.
O que o seu pai achou da sua recusa?
Meu pai ficou contente! Nem meu pai e nem a minha mãe queriam que eu fosse candidata.
O excesso de exposição tem que ser administrado?
Com certeza! Quem está em uma situação dessas tem que estar permanentemente atenta, sempre fui uma pessoa centrada, soube impor respeito e também sempre tratei as pessoas muito bem, com muita educação.
O fato de ter sido eleita Miss Bi Centenário de Piracicaba não a deixou deslumbrada?
Foi muito bom, aproveitei todos os momentos, foi importante para mim. Eu gostei muito. Sempre junto com a minha família conheci outras pessoas, outras cidades, eu tinha essa estrutura, o apoio dos meus pais. Isso para mim era importante.
Com o passar do tempo o seu curso foi concluído e qual foi a próxima etapa?
Depois de concluir meu curso, comecei a expor. Ali que conheci o meu futuro marido. Eu estava expondo no Salão de Belas Artes, o professor Hugo Benedetti expôs um quadro onde eu tinha sido retratada, o meu futuro marido também gostou do quadro e depois me procurou.
Quantos quadros são da sua autoria?
Não saberia dar um número exato, mas já pintei bastante e fiz muitos desenhos, diga-se de passagem, que desenho até hoje. Desenhos com lápis, crayon, faço desenhos com mais rapidez. Faço algumas telas também, só que demoram um pouco mais.
Essas obras estão no mercado de arte?
Tenho alguns quadros no Museu Histórico e Pedagógico Prudente de Moraes, alguns quadros eu dei como presente à algumas pessoas, nunca comercializei a minha arte. Fazia também algumas esculturas, como a que tenho aqui denominada como “A Espera” em terracota. Tem como inspiração a minha irmã quando estava esperando o meu sobrinho, essa escultura ganhou a menção honrosa.
Como era o Professor Hugo Benedetti?
Um bom professor, nós saiamos, em várias alunas, para fazer pinturas ao ar livre. Fizemos muitas pinturas da Esalq. Era uma turma grande que pintava. Fazíamos as paisagens da cidade, era muito gostoso.
O seu marido conheceu a sua arte, e através da arte quis conhecê-la?
Ele me viu na exposição. Seu nome é Octavio Helene Júnior, na época ele era juiz substituto em Piracicaba. Nos casamos, ele fez carreira, passamos por diversas cidades do interior do estado, ele voltou a Piracicaba, foi diretor do fórum, depois foi para São Paulo, ficou no Tribunal, foi desembargador do órgão especial e aposentou-se quando completou a idade determinada.
Em que ano vocês se casaram?
Foi em 4 de janeiro de 1975, na Igreja Imaculada Conceição, em Piracicaba. Tivemos cinco filhos: Otávio, Ricardo, Graziela, Eduardo e George.
Como foi deixar Piracicaba, onde existe toda uma estrutura familiar e ir para São Paulo?
Antes passamos por diversas cidades, em São Paulo acabei me acostumando com a cidade e seu burburinho. A família do Otávio mora lá também. Nas cidades menores a vida é mais restrita, eu pintava bastante nessa fase. Tive muitos filhos, cuidava deles. Não deixei a música, com isso minha vida sempre estava com alguma ocupação. Gosto muito de ler, textos, poesias, mas não escrevo, prefiro me expressar através da arte, das cores, das formas.
Qual é a sua visão de Piracicaba da época em que foi Miss, aos 15 anos, e a Piracicaba atual?
Falo que Piracicaba envelheceu também, mas cidade não envelhece, ela só progride, mas não perdeu o encanto. Piracicaba é uma cidade que todo mundo gosta. Quando vemos o Rio Piracicaba, nos emocionamos. (Nesse momento Da. Graziela deixa transparecer forte emoção, sinal do carinho que tem pela cidade). O Engenho é bonito!
A mãe da senhora teve uma influencia fundamental na formação da sólida estrutura familiar?
Teve! Ela era uma pessoa muito culta. Tinha uma visão ampla, dizia: “Tal escola não é suficiente, tem que aprender mais coisas !”. Ela encaminhou-nos para a música, para as artes, sempre comprava livros, desde pequena líamos Monteiro Lobato, todos os classicos infantis. Depois Shakespeare e todos os autores famosos estavamos lendo. Já falei muito bem o inglês e o francês, depois perdi um pouco o traquejo. Na minha época o francês era muito valorizado. Hoje falam muito espanhol. Havia escola de francês. A propria origem do Colégio Assunção tem influência francesa. As freiras nos deram uma boa educação, não era uma coisa tão rígida, mas elas ensinavam. Orientavam, ensinavam a dizer não quando algo não era bom. Trabalhavam com a formação de carater. Eu estudava de manhã e voltava a tarde pelo fato de ser normalista, ficava dois períodos no colégio. Voltava a tarde para fazer os meus estágios, eu gostava muito de criança. Tudo que fosse necessário relativo a desenhos eu fazia. Ajudava nas festas, fazia decoração. Venho de uma família muito religiosa, minha mãe, minha tia, eu, frequentávamos as missas na Catedral de Santo Antonio assim como na Igreja dos Frades.
E os bailes de carnaval de Piracicaba como eram?
Eram maravilhosos! Até 1967 eu ia nos bailes voltados ao publico infantil, eu não podia ir a noite. De 1967 em diante eu precisava da autorização do Juiz de Menores, mesmo assim ia com os pais. Até 18 nos tinha que ser acompanha por uma pessoa adulta. Compravamos aquelas mesas, ia a família inteira. Era muito bom, a confraternização entre primos, primas. Vinha muita peça de teatro, muitos artistas, Johnny Mathis, Roberto Carlos, Wilson Simonal, Jair Rodrigues, os cantores da Jovem Guarda vinham para cá, lotavam o Teatro São José. Roberto Carlos vinha sempre a Piracicaba.
A senhora lembra-se das lojas do comércio piracicabano da época?
Havia a loja do Seu João Guidotti, era voltada a eletros-domésticos, O Cardinalli, A Casa Portuguesa que era uma loja finíssima. Em dezembro ganhei presentes de Natal da maioria das lojas, meus pais ficaram contentes e surpresos. Eu ia até as lojas, agradecia, tirava fotografias.
Piracicaba era quase uma grande família?
Era! Todos se conheciam, era interessante que os pais iam juntos com os filhos aos bailes, e às vezes os pais se divertiam mais do que os filhos! Meus pais dançavam mais do que eu nos bailes. Atualmente vivemos outros tempos. Um fato curioso, mas próprio da época, é que ficávamos sentadas junto aos pais e era o rapaz quem tirava a moça para dançar. Tinha algumas moças que tomavam o que chamávamos de “chá-de-cadeira”, ninguém tirava para dançar! Algumas vezes estava junto a mesa o presidente ou um diretor do clube, sentada a mesa eu já sabia que não iria dançar, geralmente o rapaz ficava intimidado. Eu então dançava com o meu pai, com o Jairo.
Existia a famosa “taboa”?
Existia também, que era quando a moça recusava-se a dançar com o rapaz que a convidava. Geralmente os rapazes eram muito educados, não havia desavenças maiores.
A senhora dirige veículos?
Dirijo normalmente. Meu primeiro carro foi um “Fusquinha” branco ano 1978! Foi meu marido que deu, tenho até hoje! Tenho o maior carinho por esse carro.
Como é seu olhar sobre a internet?
Uso com moderação, Não tenho facebook. A internet para mim é mais uma ferramenta para pesquisa. Tenho uma característica pessoal que cultivo desde muito jovem, procuro manter minha privacidade. Sempre fui assim. Isso eu aprendi com a minha mãe. As mulheres da família da minha mãe sempre foram mulheres muito religiosas, fortes, altivas. Elas também se mantinham reservadas. Viviam a vida delas. Gosto de interagir com as pessoas, mas dentro de um limite! Que não seja invasivo.
A Miss Bi-Centenário gosta de cozinhar?
Adoro! Fiz muitos cursos de culinária.
Qual é o prato que os filhos pedem com muita vontade?
Geralmente eles gostam de tudo que eu faço, muitos assados, a famosa “macarronada da mama”, risotos.
A senhora chegou a andar de bonde?
Quando era pequena! Eu ia com meu tio Vicente, Tinha um bonde que saia do centro e ia até a Agronomia era um local onde eu adorava passear quando era pequena. O meu pai nos levava muito lá, só que ele nos levava de carro. Uma particularidade que ficou gravada, era a forma como o cobrador do bonde colocava as cédulas de dinheiro entre os dedos, elas era dobradas pelo meio e ficavam no vão de cada dedo cédulas de valor pré-determinado. Eu ficava olhando, o cobrador andando de um lado para outro no estribo do bonde. Outra coisa que eu achava muito interessante eram os encostos dos bancos que giravam conforme o destino do bonde. Quando o bonde chegava ao seu destino final, como tinham duas frentes, bastava girar o encosto e os passageiros estavam olhando de frente para o trajeto. A meu ver o bonde deveria continuar a existir, mesmo que fosse com a finalidade turística, com um trajeto apropriado.
Qual é a sua opinião sobre a juventude atual?
Acredito que a juventude atual não pode ser igual a que existiu anteriormente, ela está vivendo outro tempo, tem a internet, essa velocidade da informação. A dinâmica é maior. Só acho que deviam se preservar um pouco, zelar pela sua intimidade. As pessoas colocam no facebook coisas que ali não é lugar para ser colocado. Isso não é restrito a crianças ou adolescentes, adultos também agem dessa forma. Penso que temos que respeitar a nós mesmos, dar-se valor, para respeitar o outro também. Ai há uma troca.
O nome disso é caráter?
Sim! E tem que ser formado desde pequeno. Ter uma boa formação.
A seu ver, no momento em que estamos passando, os exemplos que vemos estampados em todas as mídias, não são edificantes?
É verdade! Mas nesse caso credito que cada um deve fazer a sua parte. Eu faço a minha parte, construo uma coisa boa para mim, para a minha família. A família é importante demais. A minha família foi muito importante na minha formação.
A senhora ouviu comentários sobre uma coisa, que já praticamente acabou, embora tenha provocado algumas tragédias em determinadas famílias, denominada “Baleia Azul”?
Já ouvi falar a respeito. É uma coisa absurda, não é só um problema físico, chega a ser um problema psíquico grave.
Esse “deixar-se influenciar” é um vácuo?
É um vácuo que existe, na falta de fé, há falta de oração nesse caso.
A senhora é religiosa?
Venho de uma família com base religiosa muito forte. A oração é muito importante, ela constrói o seu caráter. Você faz uma conexão com o divino que existe dentro de todo mundo. É só procurar! Minhas avós, tias, pais, sempre foram muito religiosas, além de ir a igreja tiveram sempre muita fé, então tudo que pediam conseguiam. Todos nós temos nossos momentos de dificuldades, tristeza, perda. Isso faz parte da vida. Procuro através da religião acreditar em coisas melhores, é um lenitivo, um conforto. Pode observar que as pessoas que não tem nada em que acreditar elas tem uma vida diferente. Até na saúde dessa pessoa. Afeta a saúde. A pessoa que medita, que ora, tem uma vida melhor. Não que ela terá uma longevidade maior, mas terá uma qualidade de vida melhor.
A tão em moda “depressão” existe se a pessoa se deixar abater?
Não deve deixar-se abater, temos que acreditarmos que estamos nesta vida por alguns anos, essa passagem é um aprendizado. Aprendemos coisas boas. Sofremos. Não existe nenhuma pessoa que não tenha sofrido na vida. Só que temos que tirar proveito de tudo que acontece na nossa vida. Temos que tirarmos uma lição. Quando fui Miss Bi-Centenário também tirei uma lição, de tudo que me foi oferecido só tirei as coisas boas. O que me ofereceram que achei que não era bom, eu descartei. Mesmo tendo muitos achando que seria uma vantagem para mim.
Naquela época era uma adolescente, já tinha esse discernimento?
Sim, com 15 anos já tinha essa consciência. Eu sabia que queria ter uma família, eu queria construir. A educação que recebi foi essencial. A rotina pode até ser entediante, mas é importante, se você não construir tijolo por tijolo, dia a dia, como irá construir um prédio? Temos que ser otimista, termos disciplina interior. É mais importante ser alguma coisa do que ter. Quando você tem, você perde, não terá aquilo para a vida toda. Quando você é , é para toda eternidade.
Cada povo tem sua forma própria de pensar, é a característica do povo. Japoneses, alemães, americanos, cada povo tem uma identidade, qual é a identidade do brasileiro?
Não tem! É um povo alegre, vive o dia. A pessoa tem que viver o presente, pensar no futuro, o passado é muito bom, recordar um pouco, mas a pessoa não pode viver do passado. Passado já passou. Não podemos desenterrar coisas ruins! Quando passou uma coisa ruim, você já enterrou, já cimentou, coloca um colorido ali, pronto, não desenterra mais. Aprende. Tirou alguma lição dali? Tirou algum proveito? Tirou! Então não desenterra! Quando podemos lembrar coisas boas é ótimo rememorar coisas boas. Mas não viver disso! Temos que viver o presente já com um olho no futuro! Quando encontramos uma dificuldade achamos ruim, mas na realidade ela serve para a pessoa crescer. Se conseguir superar você ganhou mais auto-estima, autoconfiança, para a próxima dificuldade. Aqui vamos subindo degraus. Cada degrau tem a sua dificuldade, a sua facilidade, tem tudo de bom, como tem as coisas que não são boas, mas você tem que resolver aquilo. Quem vai resolver o que está dentro de você? Você mesmo! Não tem uma pessoa de fora que irá resolver. Sabedoria é saber viver com as dificuldades, com as alegrias, tirar sempre uma coisa boa, uma lição. Um proveito de tudo que você viveu.