Ivani Fava Neves
Ivani Olívia Fava Neves, 82 anos, tem como um de seus maiores hobbies a pintura de rostos. Suas obras impressionam pela perfeição, muitas vezes confundidas com fotografias. É uma mulher extremamente bem informada: lê jornais diariamente, acompanha noticiários e utiliza o computador para organizar suas atividades assistenciais.
Dona de uma atenção especial ao próximo, Ivani sabe ouvir, aconselhar e orientar. Seu carisma conquista a todos com quem conversa. Mas, por trás da delicadeza, revela-se uma mulher de fibra, determinada, com um propósito claro na vida: ajudar o próximo de maneira prática e concreta. Conta com apoio incondicional do seu marido, o Engenheiro Agrônomo e Professor da ESALQ Dr. Evaristo Marzabal Neves.
Discreta, não se vangloria de suas realizações. Ao contrário, trabalha silenciosamente, sempre buscando novos recursos para beneficiar ainda mais pessoas. Sente-se realizada, mas sua simplicidade prevalece sobre qualquer vaidade.
Também é escritora, colaborando semanalmente com contos em um jornal local. Ivani Olívia Fava Neves é, sem dúvida, um exemplo de generosidade e talento — uma presença marcante na galeria dos Tipos Inesquecíveis.
A senhora dirige veículos?
Sim! Dirijo o meu carro!
Qual é o nome completo da senhora?
Ivani Olivia Fava Neves. Nasci em Guaimbê, perto de Lins, no dia 25 de agosto de 1942. Sou filha de José Fava e Tereza Volpatto. Meu pai era fazendeiro de café, foi vereador em Getulina, ele era político, por isso sou política por natureza. Meus pais tiveram seis filhos: Alzira, Anita, Luiz, Yvette, Ivani e Therezinha. Meu pai era uma pessoa muito simples, para conseguir tudo que ele teve, ele trabalhou muito! Naquele tempo, as pessoas trabalhavam, se dedicavam. Lembro-me de que matavam porco em casa, todo mundo limpava, ajudava. Morávamos no sítio, minhas irmãs andavam quilômetros para poder chegar na escola. Era diferente!
A senhora frequentou a escola em qual localidade?
Eu já era da fase em que morávamos em Guaimbê, que era quase vizinha do sítio. O Grupo Escolar eu fiz em Lins. Fiz o ginásio, e depois fiz a Faculdade de Serviço Social. Cursei a Auxilium, em Lins mesmo. Formei-me com uns 23 a 24 anos de idade.
Bandeira da cidade de Guaimbê
O gentílico de quem nasce em Guaimbé é Guambiense.
Após concluir a Faculdade a senhora foi trabalhar em algum lugar?
Eu trabalhei sempre! Eu faço serviços beneficentes desde muito nova. Comecei dando aulas de catecismo em um bairro de Lins, quando eu tinha uns 17 anos. Em Presidente Prudente, fiz um trabalho em uma paróquia, isso na época em que fazia a faculdade, o coordenador era o Padre Sigrist, parente do Frei Sigrist que fez um grande trabalho em uma comunidade de Piracicaba.
A senhora tinha vocação para o trabalho assistencial?
Eu não tinha vocação para ser Assistente Social! Foi a minha última opção! Por isso que eu falo que tem Deus na parada! A minha intenção era fazer Letras! No ano em que eu ia ingressar na faculdade, o Francês, que era um idioma que eu amava, saiu da grade curricular! Português eu achava muito árido, porque iria estudar latim? Vi que a minha opção, lá em Lins, seria estudar Serviço Social.
Como a senhora conheceu o seu marido?
Meu marido, Evaristo Marzabal Neves, também morava em Lins. Começamos a namorar quando eu tinha 16 anos de idade. Namoramos por oito anos. Nesse período ele veio cursar a ESALQ, nessa escola ele formou-se como Engenheiro Agrônomo e depois tornou-se professor, onde permanece até hoje. em Piracicaba, e eu fiquei em Lins. Fiz todo tipo de curso que aparecia, na cidade não tinha muito o que fazer, a não ser estudar. Depois que nos casamos na Catedral de Santo Antônio, em Lins, fomos morar em São Paulo. Eu trabalhei junto com ele em um local denominado Instituto de Planejamento IMPAR, situado na Rua Traipu, no Bairro Pacaembu. No início moramos na Rua Cardoso de Almeida, 1.346, era um apartamento. Mudamos para a Rua Aimberê – Perdizes, depois mudamos para a Rua Cayowaá – Perdizes. Nesse interim, fomos morar nos Estados Unidos, na cidade de Lafayette ,uma cidade no estado de Indiana.
Quanto tempo vocês permaneceram lá?
Moramos um ano e meio lá.
Na época não era tão comum as viagens para o exterior e muito menos morar, o que a senhora achou?
Nossas famílias eram muito próximas, encontrávamo-nos, sempre, tínhamos uma ótima convivência, e de repente estávamos só nós dois em São Paulo, eu estranhava. Moramos um ano e meio em Viçosa, acho que meu caminho foi muito árduo, porque nesse meio de tempo perdi três nenês. Pouco tempo depois, perdi o meu pai, nasceu o meu filho Marcos. Eu adotei a minha filha, Flávia. Foi quando fiz um acordo (com Deus): “Me ajuda aqui que eu vou trabalhar o resto da minha vida, mas não quero mais sofrer!”
Downtown Lafayette e a Riehle Plaza & CityBus EUA.
Essa ideia de ajudar o próximo, eu já tinha e realizava. Fazia sapatinhos, vendia, dava o dinheiro para as instituições. Sapatinhos lindos de crochê, eu ficava muito de repouso, ficava fazendo crochê, tricô, blusas, eu fazia muita coisa.
A senhora é uma pessoa muito forte!
Sou forte! Nos Estados Unidos fiz vários cursos. Minha filha tinha dois anos quando nós fomos para lá, ela estava na escolinha no período da manhã, eu aproveitei esse período para fazer esses cursos na universidade lá. Fiz curso de adoção. Como gosto de escrever fiz um curso de redação, tinha que fazer dois textos por semana, tudo em inglês. Aproveitei o talento que desenvolvi lá para escrever, escrevo toda semana na Gazeta de Piracicaba.
A senhora escreve sobre algum assunto específico?
Escrevo sobre assuntos do cotidiano. Por exemplo, o lixo, eu não aceito papel desnecessário, folhetos, só os essenciais, o segundo passo é a reciclagem. Acho que sou muito rígida. Não permito uma escapadela! Procuro não fazer coisas que depois tenha que consertar. Fazer uma vez só. Nos estados Unidos, li muitos clássicos, inclusive Moby Dick, que no original é uma coisa bárbara, eu era tão disciplinada que li inteirinho! Eu queria aprender inglês! Inclusive tenho um livro que escrevi sobre adoção, mas como é papelada, eu não quis nem publicar. São uns vinte artigos.
A senhora não acha que é interessante publicar esse livro? Pode ser que ajude muitas pessoas.
O custo é muito alto para mim! Eu vou ter que reduzir o meu tempo aqui!
Após cerca de um ano e meio nos EUA a senhora retornou ao Brasil?
Voltamos e na época morávamos em São Paulo. Minha irmã tinha uma loja de cortinas em Lins. No período em que moramos lá, eu queria trabalhar. Minha irmã fez cortinas para o Clodovil, Hebe Camargo. Eu vendia cortinas para ela, assim ela não tinha que ir de Lins para São Paulo!
Como a senhora conseguia contatar esses figurões?
Nós tínhamos parentes que moravam em São Paulo e eram bem relacionados! E tudo era por indicação! Eu suponho que até hoje não tenha ninguém que faça cortinas com essa qualidade. Dura a vida inteira! Minha irmã Yvette Fava era uma artista! Ela ganhou o reconhecimento que merecia. Eu dava a minha cara para quebrar. Lembro-me de que fui vender cortina uma vez, pensei: Como eu vou vender? Não sei nem medir! Nunca peguei um metro para medir cortinas! Expus minhas dúvidas para a minha irmã. Ela calmamente disse-me: “Você vai! Você mede o comprimento e a altura! Depois eu ajudo você!”. Nossa, eu tremia como uma vara verde! Fui até a casa do cliente, no bairro de mansões no Alto de Pinheiros. Depois disso perdi o medo! Comecei a vender! Ela passava para mim os clientes que não requisitavam serviços muito elaborados, porque nesses casos é difícil vender. Tem cortinas que são trabalhos de pura arte! Minha irmã nasceu para isso!
A senhora é muito dinâmica!
Sou! Só que não tenho tempo para mim! Gosto de jogar no computador, gosto de fazer desenho (Ela especializou-se em desenhar rostos de entes queridos, pessoas amigas, com uma perfeição que se assemelha a uma fotografia!). tenho um grupo a “Confraria de 15 Amigas”, que já tem uns 40 anos, toda terça-feira nos encontramos, tomamos um cafezinho, tem o grupo da MUCAPP, as reuniões são aqui. Segunda-feira tenho uma voluntária que fica aqui a tarde, outra voluntária fica na quinta-feira à tarde.
Com isso a senhora espantou o “alemão” (Mal de Alzheimer)?
Acho que sim! Vou fazer 83 anos agora em agosto! Tenho boa cabeça ainda!
Com toda essa atividade que a senhora tem não sobra tempo ocioso para divagações inúteis!
E como começou a história da A Associação MUCAPP – Mutirão da Casa Popular de Piracicaba?
Lembra-se do Herbert de Souza, o Betinho? Ele lutava para combater a fome, percebi que ter uma casa seria fundamental para o resgate dessas pessoas. Uma determinada ocasião eu estava em uma reunião na ESALQ, na casa do diretor, isso foi em 1993, falei para o professor José Otávio Menten: “- Tenho uma vontade de fazer casa popular!”. Ele disse-me: “Ivani, se você quer fazer isso, no Jardim Vitória fizeram um loteamento, lá é o campo ideal para você fazer as casas!”. Isso foi em uma sexta-feira. Viajamos para Lins, O meu filho é um dos grandes nomes do Agronegócio, ele tem um site denominado “Dr. Agro”. Ele está entre as 10 personalidades de acordo com a revista Forbes no Brasil.A minha filha, Flávia Fava Neves Osório é dentista, ortodontista, ela casou-se e mudou-se para Campinas.
A senhora foi até o Jardim Vitória?
Fui! Fica na saída para Anhumas, Pau Queimado, lá nós fizemos 130 casas, e 83 telhados!
Quando a senhora fala “nós”, quem são as pessoas?
Aí vem a loucura! Cheguei de Lins, meu filho estava começando o mestrado ou doutorado, ele abriu uma prancheta, e disse-me: “
“-Mãe! É muito trabalho!”. Só que me conhecendo ele sabia que eu não iria desistir nunca! Ele perguntou-me o que eu queria fazer. Expus meu objetivo. Ele disse-me que eu teria que contatar umas 20 amigas, eu já era bem relacionada em Piracicaba. Pede para mandar um pouco de dinheiro. Ele foi anotando tudo que eu deveria falar, fazer. Chegando aqui, a primeira para quem eu liguei foi para a Marta Dedini. Perguntei: Marta você me ajuda? Ela disse que ajudava. Isso foi em setembro de 1993, a pessoa tinha a opção de dar 5,00; 50; ou 100 reais por mês. Em janeiro nós entregamos as 4 primeiras casas!
Qual a é área em metros quadrados dessas casas?
O mínimo são 40 metros quadrados.
A senhora tem ideia de quantas pessoas são abrigadas em cada casa?
Geralmente são famílias com muitos filhos. Quando tem meninos e meninas a gente procura fazer mais um quarto para separá-los e dar mais conforto. Hoje em dia estamos mais sofisticados, nós ganhamos muito material. A pessoa não está usando uma cama, manda para mim, eu coloco no grupo: “tem uma cama com tais características!”. Temos uma equipe com cerca de 10 pessoas, são engenheiros, gerentes administrativos, eles acompanham todo o trabalho de campo, os engenheiros acompanham de perto tudo que está sendo feito, orientam.
E quem faz as reformas?
É um processo de autoconstrução! Nós não podemos pagar pedreiros, eles mesmos é que fazem.
Um chefe de família que quer reformar a casa, vocês entram com o material?
E ele com a mão-de-obra! Sob a orientação de um engenheiro. As vezes precisamos dar uma ajuda a mais. Estamos fazendo uma casa para uma moça que é paralítica, ela deve ter uns trinta e poucos anos. No banheiro não entrava a cadeira, fizeram um mutirão e pagaram um pedreiro. Geralmente o morador que está construindo, vai até o respaldo. Quando chega na parte elétrica temos que contratar um eletricista! Hidráulica também! Tem que ser profissional! Cada caso é um caso. As vezes a gente contrata um pedreiro para dar um arranque. A pintura é feita por mutirão. O Carlos Franchi, que foi esportista no E.C. XV de Novembro, muito popular, nos ajuda como engenheiro. As pessoas aparecem, gostam e ficam. O contador por exemplo, que trabalha conosco e tem 31 anos, é o Odair Sabadotti. Todo mundo trabalha como voluntário!
E a senhora é a presidente do grupo?
A gente tem que coordenar tudo isso, a minha cabeça é agitada!
Como o poder público vê essa atuação?
Apoia! Nós trabalhamos muito, mas sempre de forma discreta. Fazemos aquilo que deve ser feito, da melhor maneira possível. Existem pessoas que fazem coisas inimagináveis, para obter vantagens para si ou para outros. Teve um caso em que um homem se suicidou, atirando-se contra um caminhão na Rodovia Luiz de Queiroz. Sabendo do fato, informei-me junto as autoridades, e descobri que o motorista do caminhão morava em Bauru, entrei em contato com ele e expus o caso, dizendo que a vítima se atirou sob o seu caminhão. Eu tinha informações seguras. Esse caminhoneiro tirou um peso de uma culpa que ele não tinha. Sua alegria foi imensa. Ele andava muito abatido, passou a gritar com alegria. Passado um tempo, fui receber uma medalha de uma Comissão de Ética, quando fui entrar no SESC, uma pessoa que estava na porta disse-me: “Eu conheço a senhora!”. E continuou dizendo: “A senhora fez uma coisa na minha vida, que a mudou totalmente! Eu tinha um funcionário, que estava indo para o trabalho e atropelou uma pessoa e eu seria também responsabilizado. Ele estava ingressando na minha empresa, que estava no seu início de funcionamento, e eu fiquei muito preocupado. O motorista contou que ele não era culpado. Isso tirou esse peso, foi um processo diferente!” Quando entrei, vi que a palestra era sobre:” Ética ou Moral”.
A medalha era para a MUCAPP, se fosse para mim, Ivani, eu não iria. Não deu tempo nem de contar para os meus amigos e para meu marido. O senhor que tinha falado comigo na porta, entrou, e foi fazer a palestra. As pessoas que compunham a mesa falaram, cada um disse alguma coisa sobre a MUCAPP. Chegou a minha vez de falar, como já tinham dito tudo sobre a MUCAPP, lembrei-me do caso do motorista, cujo patrão era o palestrante! Ao terminar a minha fala, ele disse: “- Aqui tem um exemplo de ética! Eu gosto dessa história porque parece que Deus coloca as pessoas bem na hora correta! Em todos os meus artigos eu abordo temas sobre o comportamento humano.
Quantos artigos a senhora tem já publicados?
Sabe que nem sei! Eu publico todos os domingos! Na Gazeta já publico há uns três ou quatro anos, mas tem muitos que eu não publiquei. Tenho um livro intitulado “Construindo casas e reconstruindo vidas. “O meu filho está muito engajado nessa área de publicação, ele deve ter cerca de 100 livros publicados! O dono da Editora Atlas veio aqui e adorou o trabalho. O livro é de 2012, até hoje ele ajuda a MUCAPP. Dizem que eu pego dinheiro até em velório! Não do falecido, claro! O pessoal chega perto de mim e perguntam: “-Você trabalha Ivani?”, eu digo: “Tenho uma ONG!”.
Esse seu namoro com a tecnologia começou quando?
Eu tinha uma pessoa que vinha aqui trabalhar, informatizou tudo!
Isso tudo sai do seu bolso?
O que eu tenho aqui é de 2010, custeado por nós, pela minha família. É uma forma de retribuirmos as graças que alcançamos. É uma forma de retribuirmos as benesses que recebemos.
Não é todo mundo que pensa assim não!
Mas eu penso! Essa moça que trabalhou como voluntária, era uma pessoa muito agradável, o serviço em que ela trabalhava começou a exigir mais, e ela teve que deixar a MUCAPP. Eu comecei a aprender com ela, ela vinha aqui, fazia o trabalho junto comigo e ao mesmo tempo eu ia aprendendo. Aí comecei a fazer sozinha. Tem algumas coisas que eu ainda não domino! Interagir várias planilhas, por exemplo!
Vendo essa mulher com uma determinação incrível, sinto-me à vontade para consolá-la, em tom de brincadeira: “Além da senhora, parece que o Elon Musk também tem dificuldades com planilhas!”.
Com o software Adesk facilitou muito! Mas eu já chorei muito!
A senhora chora?
Claro que choro! Imagine, tenho que fazer algo novo no computador, mas a nossa geração não foi educada para isso, é um mundo novo!
A que horas a senhora acorda?
Em torno de 7:30 horas. Eu adoro ler o jornal! Leio a Folha de São Paulo, meu pai lia, meu sogro lia, então me acostumei a ler com ela. Por um período mudei, depois a tradição venceu! Eu gosto de ler! Sinto necessidade de ler! Todos os dias faço as palavras cruzadas da Folha, sudoku.
A administração é uma tarefa que exige experiência e dedicação?
Temos que ser muito objetivos! Versáteis! Estamos com 20 casas em andamento, qual cor vamos usar? Vamos usar tintas da cor “SEMIDÃO”. Piso? Pode ser piso tradicional ou cacos de granito. As casas ficam bonitinhas! Vamos nos aperfeiçoando!
Os programas de casas populares motivados pelo poder público podem adotar critérios mais objetivos?
O sistema de construção e distribuição de casas populares feitos pelo poder público tornam-se muito complicados. Recentemente foram inaugurados prédios populares, mas de muito bom gosto, bem-acabados, na Avenida Laranjal Paulista. Fui convidada para a entrega aos moradores. Um dos critérios que procuro utilizar é o de manter a pessoa no local de origem dela. Por exemplo, ela tem um terreno, ela vende aquele terreno para ir morar em um prédio desses, ela dificilmente irá se acostumar. Nós procuramos melhorar a casa em que ela já mora, para não perder as relações de vizinhança! Geralmente ela está lá há cerca de 30 anos, nós procuramos melhorar a casa, às vezes até no centro da cidade melhoramos uma casa! Nós vamos melhorar onde ela já está, para ela é ótimo! Ela não irá sair de lá para um apartamento de 40 metros quadrados! Ela está acostumada com árvores, com a vizinha que vem ali, conversa, vai naquele pequeno armazém que já usa há muitos anos, pertinho, ela não irá mudar!
Não irá abalar o seu cotidiano tradicional!
Tem casos interessantes! Como o da Dona Zéfinha. Uma mulher com uma história triste, mas com muita garra. O marido dela veio com a família: ela e três filhas. Logo em seguida ele voltou para o Nordeste para ficar com uma prima dela. Com as filhas ela ficou morando em um porão. Foi despejada do porão, até que foi nesse loteamento. Fizemos uma casa para ela, logo no começo das nossas atividades. Ela era danadinha! Eu percebi que a metragem aumentou um pouquinho, quando foi medir, o engenheiro ficou bravo! Eles tinham cavado o alicerce, concretaram, já prontinho, um pouquinho maior. Nós fizemos a casa na frente do terreno. Eles têm que pagar um pouquinho por mês. Quando eu ia lá receber, vi que Dona Zefinha construiu uma casinha atrás, para a filha que se casou. Ela era empreendedora! Mais tarde ela fez uma outra casinha no fundo do terreno! Nessa casinha, morou um filho que agora está abrigando-a, ela deve estar com cerca de 84 anos. Como o terreno é em declive, embaixo o filho fez para ela um apartamento muito bom. Fui visita-la, após 30 anos! Atualmente ela alugou aquele complexo que tinha feito antes, ela vai lá, todo mês, receber dos seus inquilinos! O neto trabalha no Cartório, ele que me disse: “A senhora fez a casa da minha avó”.
Qual é o valor que eles pagam, aproximadamente?
O valor da entrada era em torno de 30 a 40 por cento. É significativa e principalmente educativa. Eu digo: “Se você não pagar, vai deixar outra pessoa sem uma casa, porque ela poderia estar aqui no seu lugar. Por sua culpa ela não está! Veja a importância de você contribuir todo mês!”. Uso da psicologia na linguagem que a pessoa entende. O mal que ela estará fazendo se não agir corretamente. Muitos pagam a casa inteira. São valores variáveis: R$ 200,00, R$ 100,00; R$ 20,00; R$ 10,00 por mês.
A senhora têm a interferência de alguma liderança política ou religiosa da comunidade que busca levar algum tipo de crédito ou vantagem?
Eu não escuto! Faço ouvidos moucos! Já quiseram associar o nosso trabalho com muita coisa. Existem sim, pessoas de muito boa vontade que agem junto a um mutirão.
Diante de muitas solicitações de pretendentes a uma casa, como a senhora faz a triagem?
A MUCAPP não tem propaganda! Através das redes sociais, do site, quando a pessoa interessada descobre o endereço ela vem pedir. Nossa capacidade é de 1,7 casa por mês. Em média são 20 casas por ano. É só isso que podemos fazer! A demanda é maior! Essas casas e apartamentos que são construídos pelo poder público, são dotados de infraestrutura como água, saneamento básico, energia elétrica, e benefícios normais; A meu ver, falta uma infraestrutura básica comercial para que a pessoa não tenha que se deslocar para adquirir produtos de consumo imediato. Os próprios moradores fariam a implantação dessas facilidades. Sem a interferência de pessoas estranhas à comunidade.
A senhora que morou nos EUA viu a diferença, são bairros afastados uns dos outros, com vida própria. No Brasil as cidades são extensas e aglomeradas. Agora estão surgindo os condomínios residenciais mais afastados uns dos outros.
Infelizmente lá existem muitas favelas. Na periferia de Las Vegas, ali você conhece bem a realidade! Isso tem ocorrido em muitos países. Gosto muito de assistir o programa Record News, ali eles fazem entrevistas com “crème de là crème” ( Expressão que significa o melhor do melhor), só que no sentido utilizado, soa como “As maravilhosas cidades que nos são apresentadas como totalmente perfeitas, também tem suas mazelas, e é um dos tópicos que o programa aborda. Lugares que às vezes nem imaginamos existir em países do chamado Primeiro Mundo).
Um fator inovador vem ocorrendo. A longevidade faz com que os filhos tenham que cuidar de seus netos e de seus pais. Os filhos que já estão com 50, 60 anos, têm que cuidar dos pais que estão com 80 anos, e já estão dando trabalho, e tem que cuidar dos netos que estão com 5, 6 anos. Os filhos, pais dessas crianças, estão desempregados! Sobra para os avós pagarem as escolas dos netos! O que acontece com essa geração, que eu falo “serie liner! (Gerações X.Y.Z), eles querem estudar nas melhores escolas, e esquecem que se fizessem um curso profissionalizante, ganhariam muito mais! Hoje já não tem pedreiro! Não tem pintor! Eletricista! Não tem mão de obra! Isso porque o pessoal sonhou lá em cima e agora não consegue entender! Agora com a tecnologia em evidência cada dia aumenta a demanda desses profissionais de base.
Qual será a solução?
Vivemos um período em que de forma geral o bem material está acima da espiritualidade. Não se pensa mais em Deus. E Deus é o próximo! Não adianta mentalizar Deus como um Ser que está lá em cima! Deus está presente naquele ser humano que está sofrendo! Quantas pessoas já colocamos dentro de uma casa!
Existem outras entidades não governamentais que têm essa iniciativa de proporcionar um teto para famílias necessitadas?
Eu não concordo com o jeito com que eles fazem! Realizam às vezes uma campanha para uma coisa que aquela pessoa nem usa! Fazem uma campanha enorme! Oneram a sociedade! Com isso a sociedade estará dando uma coisa que não vai ser usada! Tem muitas obras em Piracicaba que gastam 90% em estrutura! Com isso, pessoas que estão fazendo um trabalho diferente, como por exemplo eu faço, não encontram espaço na sociedade para receber dinheiro, os que dão são poucos. E tem que dividir para muitos! Quantas obras existem em Piracicaba!
Qual é o grau de satisfação de uma pessoa que recebe uma casa através da MUCAPP?
É muito grande!
Depois que a pessoa toma posse da casa, a senhora já retornou?
Claro que sim! Inclusive para receber! Minha regra de vida em tudo: “Olhe para seu guarda-roupa, um terço que usa, um terço que não usa e outro terço que atrapalha! Veja por exemplo: A sociedade como um todo, tem um terço das pessoas que trabalham, um terço que não trabalham e um terço que atrapalham! O que a MUCAPP quer fazer? Trabalhar com esse terço que não trabalha. Ali, naquele contato de dia-a-dia, o processo de construção às vezes demora dois anos, ainda mais que é pelo sistema de mutirão, se a gente conseguir que essa pessoa ascenda um pouquinho socialmente, tudo irá melhorar :os filhos irão para a escola, a família terá novas oportunidades.
A Rezecom é a empresa que faz a nossa contabilidade. São cinco sócios, estão estabelecidos na Cidade Jardim. A nossa contadora tinha falecido, isso foi há uns três anos, quando fomos visitar a Rezecom encontramos algumas pessoas conhecidas, conversamos, e o assunto ficou a ser estudado por ele. Logo fomos chamados, entrei em uma sala agradável, eu tremia, esperando pela resposta. Um dos sócios apresentou-nos uma pessoa e disse: “-Este moço, que trabalha conosco, quer ajudar a senhora!”. Perguntei-lhe o que o levava a fazer esse serviço voluntário. A resposta foi: “Porque a senhora fez a minha casa!”. Na hora houve uma comoção das pessoas presentes, as lágrimas derramando pelos rostos. Conforme o desenrolar da conversa, eu lembrei-me. Ele tinha uns 12 anos de idade. A família tinha um terreno de 12 metros de largura, do lado esquerdo morava a sogra, ela deu um terreninho para a nora, quando eu estava saindo, pensei: “Não vai dar certo!”. Tem a sogra, se acontecer qualquer coisa a nora vai ser prejudicada. Tinha três molequinhos, olhavam para mim com aquele olhar de esperança. Conversei com outra voluntária, a Maria Olinda. Passado um tempinho, tivemos outra reunião. A Maria Olinda tinha feito um trabalho de campo, e viu que aquela família era muito organizada. Apesar do risco em potencial de ocorrer algum problema, ela aceitou o encargo da ONG construir a casa. Se eu usei muito a primeira pessoa é porque estou narrando, mas não faço nada sozinha, a ONG é composta por pessoas que trabalham há anos, decidimos em conjunto. E todos trabalham e muito. De mãos dadas, formamos um grupo fabuloso. São aproximadamente 40 pessoas envolvidas. Todas muito comprometidas com o nosso objetivo. Temos cerca de 400 pessoas que colaboram com a ONG. Uns dão R$ 5,00; outros dão R$ 20,00; há os que dão R$ 100,00. O importante é que estão participando.
Quando vi esse moço, lembrei-me daquele menino me olhando com uma cara de piedade. Ele, agora adulto, chorava muito. Todos choravam naquela sala.
A senhora deve ter muitos casos interessantes!
Tenho sim! Tenho casos de arrepiar! Esses casos são os meus artigos que publico na Gazeta, no meu face book particular: Ivani Olivia Fava Neves. Todos os meus artigos estão lá. Para essas 400 a 500 pessoas que estão no meu mailing, uso whats App. É uma cadeia de voluntários que permanecem. O Odair vem me trazer os dados, quando tenho todos os dados, passo para a Vera Zandoval, a Vera junta mais documentos, notas fiscais, faz uma pasta. A Sueli Mazza está em uma diretoria, mas ela organiza toda aquela documentação. Ela coordena, quem fazia isso era eu. Se tiver que levar ao Cartório é a Sueli que faz isso. Da Sueli vai para o Odair também. Ele faz os boletos, tem gente que não quer passar pix. A Mariolinda que controla . Temos a conta no banco, esse voluntário que foi Gerente no Banco Santander, confere todos os DOCS, todas as entradas, todas as saídas. Esse rigor cria a confiança.
A senhora faz a diferença!
Eu faço a minha obrigação! Eu recebi esse talento. E procuro multiplicar. Por que eu perdi três meninas? O que eu iria fazer? Não teria tempo! As coisas vão se encaixando! “As melancias nas carrocerias dos caminhões, vão se acomodando.”. As coisas aparecem para você, e não se pode perder aquela oportunidade.
Você pode dar R$ 10,00 por mês para a MUCAPP. Faz um pix anual de R$ 120,00. Esse dinheiro eu GARANTO QUE SERÁ BEM UTILIZADO.
ANTES DEPOIS
ANTES DEPOIS
ANTES DEPOIS
ANTES
DEPOIS