PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 31 de dezembro de 2022.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: JOSÉ DE MARCO ALVES ZINSLY
José de Marco Alves Zinsly nasceu a 1 de dezembro de 1961, no bairro da Lapa, em São Paulo, onde permaneceu até completar cinco anos de idade, quando a família mudou-se para Carapicuíba. É filho de Aracy de Marco Alves, a oirejem do sobrenome originariamente era Demarchi, oriundo do e italiano. Seu pai é José Sebastião Alves. A trajetória de vida do seu pai é bastante interessante. Ele nasceu em Minas Gerais e ainda muito pequeno foi adotado por uma família francesa.
O Professor José de Marco faz uma profunda reflexão do momento atual, das mudanças tecnológicas, uma análise das mudanças de hábitos coletivos dos jovens, as principais causas, a importância da estrutura familiar, cita casos concretos, sem nominar ou identificar os envolvidos. O que vemos é um educador com plena consciência da realidade.
Você permaneceu por quanto tempo em Carapicuíba?
Permaneci por muito tempo em Carapicuíba, em seguida mudamos para Osasco e de Osasco para Piracicaba.
Seus pais tiveram quantos filhos?
Éramos em três, minhas duas irmãs e eu. Sou o caçula dos três, minha irmã mais velha Cristina, infelizmente já faleceu. Hoje somos eu e a minha irmã Regina. Sou casado, minha esposa chama-se Leda. Tenho três filhos: Rafael, Mariana e Daiana. Tenho cinco netos! A minha neta mais velha, a Manuela, já tem 12 anos!
Os seus primeiros estudos foram feitos em qual escola?
Estudei em uma escola pública em Carapicuíba chamada Escola Vila caldas. Hoje ela tem a denominação de Escola Estadual Amos Meucci. Que foi um político da região. A filha dele também foi, minha professora. Estudei lá do prézinho até a sétima série, a antiga sétima série hoje corresponde ao oitavo ano. Depois mudei para Osasco e terminei meus estudos em Osasco. No início continuei meus estudos na escola pública, depois estudei na Fundação Bradesco, na denominada “Cidade de Deus”. Trabalhei no Bradesco, fui bancário durante muito tempo. Aprendi muito lá no banco.
Você chegou a conhecer o lendário banqueiro, fundador do Bradesco, Amador Aguiar?
Quem não conheceu aquele homem? Eu ai da Cidade de Deus em 1984, hoje não sei como funciona. Na época em que trabalhei lá, só existia um restaurante. As mesas eram ocupadas por uma ordem natural de cargos ocupados pelos funcionários, era algo informal, mas natural pela própria convivência no trabalho. Havia um lugar, mais em um dos cantos do restaurante, onde tomava, assento a diretoria do banco. Mas todos almoçavam no mesmo restaurante, e a refeição era igual para todos, independentemente de cargo que ocupava. Com isso era comum encontrarmos diariamente os diretores. Como eu trabalhava na matriz, o diretor do nosso departamento, trabalhava no nosso departamento. Era olhos nos olhos! Com isso todos se conheceram.
Há uma lenda de que Amador Aguiar não usava meias nos seus pés, mesmo em ocasiões formais.
(Risos). Não me recordo disso! Lembro-me claramente dele, mas esse é um detalhe que não me recordo. Ele usava terno. Víamos diretores e supervisores do banco com ternos bem mais impecáveis que os dele! Ele andava bem vestido, mas havia diretores de departamento que o superavam nos trajes. Era o que chamávamos de andar na “estica”. Tecidos importados, cortes bem assentados, feitos por alfaiates hábeis. Amador Aguiar era um homem de hábitos frugais, poucas palavras, valorizava muito a fidelidade, incentivava a educação. Usava o consultório dentário que atendia aos funcionários do banco. No trajeto até o restaurante, ou mesmo em outro local, ele era acessível, conversava com todos, não fazia distinção de classe. Sempre que nos encontrávamos, nos cumprimentávamos. Nunca paramos para bater papo! O tempo dele era muito importante.
Qual era a sua função no Bradesco?
Eu trabalhava no Departamento de Arrecadações. Entrei como office boy, depois fui para escriturário, em seguida assumi uma seção, era sub-chefe de seção, passei a se chefe de seção, e depois fui promovido a chefe de expediente, que tem uma certa semelhança ao sub-gerente das agências. Esse Departamento de Arrecadações era responsável pelo registro de toda a movimentação do banco. Quando eu estava lá, o Bradesco implantou o primeiro cartão magnético do Brasil. Até aquela época eram utilizados cheques. Tudo que o banco recebia ia para esse departamento e a minha seção era a microfilmagem. Microfilmávamos cheques, comprovantes de pagamentos, éramos responsáveis pelos arquivos desses documentos. Quando um cliente precisava de uma cópia de um cheque, ou de algo que ele pagou, esse arquivo era referente as agências do Brasil inteiro, íamos no grande volume de filmes, através do visor de microfilmes procurávamos, achávamos o documento microfilmado, tirávamos uma cópia e encaminhávamos para as agências. Naquela época cada agência tinha um malote, era uma cor entre amarelo e laranja, eram os malotes do Departamento de Arrecadação. Aprendo a manusear todas as máquinas de microfilmagem. Organizar documentação. Escrituração mesmo. O que o banco recolhia tinha que pagar de tributos. Era nós que encaminhávamos para a loja. “Virámos” a noite! Cansei de virar a noite com os funcionários, todos trabalhando muito. Quando por exemplo tinha o pagamento de PIS. Da Receita Federal vinha uma monstruosidade de papelada, separadas por agencia, tínhamos que colocar no malote de cada agencia para que chegasse ao destinatário, hoje está tudo na nuvem, na internet. Naquela época a quantidade de papéis era muito grande. Não tinha condições de guardar fisicamente, eram arquivados através da microfilmagem. Após 5 anos os documentos eram incinerados, permanecia o microfilme por mais alguns anos. Eram gravados duas vezes.
Por quanto tempo você permaneceu no Bradesco?
Fiquei por cinco anos no banco. Quando era feriado em qualquer cidade do Brasil, nós trabalhávamos. Quando era feriado em Osasco nós também não podíamos parar. Isso foi motivo para que os funcionários sentissem um certo descontentamento, era uma situação que poderia ser facilmente resolvida pelo banco, mediante um escalonamento. Houve um crescente descontentamento. Nessa época eu já estava com um pé na área da educação. Se eu quisesse poderia ter feito uma carreira dentro do banco. Quando dei aula pela primeira vez, foi um programa de instrução. Pensei: “É aqui que eu quero estar! ”. Quando trabalhava no banco eu já estava fazendo a faculdade de História, não com o intuito de dar aulas, mas para adquirir conhecimento. Eu era apaixonado por História!
Você fez o curso de História aonde?
Fiz em São Paulo, na Universidade de Guarulhos.
Você tinha que atravessar a cidade de São Paulo?
Atravessava a cidade! Eu pegava da minha casa em Osasco, um ônibus até o centro, do centro eu pegava o trem até a Estação Júlio Prestes, onde pegava um ônibus até Guarulhos. Esse percurso levava pelo menos duas horas para ir e mais duas horas para voltar. Chegava em casa entre meia-noite e meia a uma hora da manhã. Mas valeu a pena!
Como foi o seu ingresso no ensino escolar?
Quando eu estava no banco ainda, nesse período de transição, fiz um concurso público para escriturário, e para ter acesso para ser secretário de escola. Passei no concurso, entrei como escriturário, passei para a ser secretário de escola, com isso eu já estava dentro do ambiente escolar. A primeira escola em que trabalhei chamava-se Tarsila de Amaral, em Osasco. Fiz um concurso, passei no concurso para professor. Dava aula para todas as séries do Fundamental II ao Ensino Médio. A seguir fiz um concurso para coordenador pedagógico. Passei no concurso e assumi a coordenação de uma escola: Escola Estadual Dr. Antonio Braz Gambarini. Fiquei lá como coordenador pedagógico por um bom tempo, era ação direta com o professor. Dava o suporte para os professores. Em paralelo eu dava aulas em algumas escolas particulares. No Gambariri fiquei de oito a nove anos. Apareceu um professor da Unicamp no Gambarini, falando da universidade. Foi quando eu e a Leda resolvemos mudar de vida, saímos de Osasco e viemos para Limeira, a Leda era vice-diretora da escola, ela pedir transferência do cargo dela, eu pedi remoção, que é quando um professor vai de uma cidade para outra, viemos para Limeira para fazer esse curso de Gestão Escolar na Unicamp. Isso foi em 1997, foi quando apareceu a vaga de profissionais aqui no Colégio Dom Bosco, em Piracicaba. Pediram o nosso currículo, o Dom Bosco nos chamou para começarmos a trabalhar em 1998. De lá para cá a Leda ficpu por muitos anos como coordenadora pedagógica. O sonho dela era ser diretora, seu pais também foi diretor e chegou a ser supervisor de ensino. A Leda acabou saindo do colégio e eu continuei. Simultaneamente eu trabalhei em escola pública em Limeira e depois e depois em Piracicaba.
A Leda, sua espsa é natural de qual cidade?
Ela nasceu em Piracicaba, ela e sua família moravam no Bairro Monte Alegre, em uma daquelas casas que permanecem ainda. Ela cresceu aqui, quando o pai e a mãe fizeram pedagogia aqui, decidiram mudar para São Paulo. Minhas duas cunhadas são professoras também. A família da Leda é toda ligada a educação.
Vocês trabalharam na mesma unidade do Colégio Dom Bosco em Piracicaba?
Quando ingressamos a Leda foi ser Coordenadora Pedagógica na Unidade Cidade Alta, foi trabalhar com ensino Fundamental-II, e eu fui ser Coordenador de Disciplina no Assunção. Permaneci um ano nessa função. Quando iniciamos já havia alunos e alunas. O Colégio Dom Bosco sempre foi uma unidade pertencente e administrado pelos Padres Salesianos, sendo frequentando por muitos anos só por alunos. O Colégio Nossa Senhora da Assunção era frequentado só por alunas. A inauguração do prédio aconteceu no dia 15 de agosto de 1883.A escola era administrada pelas irmãs de São José, na época lideradas por Madre Theodora de Voiron. Em 1987 o Colégio Dom Bosco. Passou incorporou a unidade, hoje funciona com o nome Dom Bosco Assunção.
De Coordenador de Disciplina como você passou a lecionar?
Um professor estava com um problema de saúde, estava faltando muito, a Coordenadora pediu-me para ficar em algumas salas. Cheguei na sala, vi em que ponto eles estavam, disseram que havia atividades para corrigir. Comecei a corrige as atividades juntamente com os alunos, no final do ano, a Coordenadora, que hoje é a Diretora Pedagógica dos três colégios disse-me: “Vai ter uma vaga, vamos aumentar o número de professores, você quer assumir como professor´ Era tudo o que eu queria”
Pela sua experiência, a tecnologia, de certa forma colocou os alunos de diferentes origens em um nível similar de conhecimento?
Essa é uma abordagem complexa. Tudo depende do foco para qual o aluno está naturalmente voltado, do meio social em que vive, cada um tem a sua própria personalidade. Mas quando o assunto abordado é de interesse comum, a tecnologia ajuda muito. AO Método Salesiano de Educação tem ferramentas e meios que visam a formação do aluno em amplo aspecto. O ensino não é restrito a métodos mecânicos. Esse diferencial irá pesar muito na formação e na vida futura do aluno. Cada aluno tem uma peculiaridade, esse é o segredo: entender o aluno.
Como educador, a observação de cada aluno vai além do ensino intelectual?
Sem sombra de dúvida! A Pedagogia Salesiana busca a formação do indivíduo em todos os aspectos. É de conhecimento comum que uma grande parte das famílias estão em crise, muitas não sabem ou não admitem. Só que o reflexo dessa crise irá refletir na vida do jovem. É fundamental que ele tenha uma visão ampla de que cada ação sua gera uma consequência imediata com reflexos no seu futuro. A responsabilidade do professor é ensinar, a Pedagogia Salesiana, assim amo algumas que atuam em linha semelhante, tem como propósito dar ao jovem o máximo de recursos, sem que exima a família ou responsável, do seu papel de educar pelo exemplo. Um detalhado estudo, sobre a influência da tecnologia sobra as gerações, classificou-as As gerações X, Y, Z e Alpha e suas característica:
1940 -Bbaby boomers – Surgiram após o fim da segunda guerra mundial, onde os soldados voltaram para casa e conceberam bebês numa mesma época. Daí o termo em inglês, “explosão de bebês”.
1969- Geração X- São os filhos dos Baby Boomers. Surge já fazendo uso dos recursos tecnológicos promovidos por sua geração
1980 -Geração Y – Foi a geração que se desenvolveu em uma época marcada pelo avanço da tecnologia e prosperidade econômica.
1995 – Geração Z Compreende os nascidos entre 1990 a 2010 e está ligada intimamente à expansão exponencial da internet e dos aparelhos tecnológicos.
Geração alpha – Nasceram depois de 2010 e já ganharam atenção suficiente para se tornarem tema de documentário. A grande diferença entre a nova geração e a Z (nascidos nos anos 90) é a interação com a tecnologia desde o nascimento – quem nunca viu um bebê que mal consegue andar, mexer com a maior naturalidade num smartphone? Eles parecem muito mais inteligentes do que nós. As relações humanas são a base da estrutura familiar. A Tecnologia é altamente benéfica, desde que usada com discernimento. Grande parte da humanidade está em crise. As relações dos jovens hoje são soltas, sem compromisso nenhum, “queimaram etapas” essenciais para um relacionamento sadio, essa velocidade impede que haja um conhecimento maior, estabelecem um objetivo e rapidamente alçação, isso em qualquer relacionamento deixa um vazio muito grande. Estão perdidos e facilmente influenciáveis. No mundo virtual não tem tristeza, não tem limites, se surgir algo desagradável é só desligar o aparelho e vida que segue.
Temas complexos são tratados com banalidade?
Os pais e orientadores não tem força para opinar. Assuntos de alta complexidade viram modinha. Os exemplos das consequências desastrosas são inúmeros. Tem um autor que eu gosto muito, uso nas aulas de sociologia, como ferramenta para compreender as relações humanas, que é o Zygmunt Bauman ele elaborou toda uma teoria, onde ele parte do princípio de que nós estamos vivendo ainda na modernidade e o mundo é como se fosse água, tudo é líquido, as pessoas perderam as referências de tudo! Aquilo que eu falei da família, da escola, das empresas, as relações são líquidas, não tem mais nada sólido! O Bauman afirma que se afrouxaram aquelas relações que eram remanentes. A água é isso, vai ocupando todos os espaços.
A seu ver, para onde caminha essa juventude?
Abordamos muitos pontos negativos. Vamos falar de pontos positivos. Essas duas gerações, tanto a Z como a geração alpha, a geração Z já está no ouro do trabalho, as empresas descobriram ali um caminho para o crescimento. Esses jovens dessa geração Z que já estão no mercado de trabalho, eles são extremamente criativos. Eles estão sendo absorvidos pelo mercado de trabalho e o mundo do trabalho vem mudando por causa disso. É uma galera criativa, uma galera que não aceita nenhum dogma, não aceita nenhuma verdade, e por isso mesmo se tornam em excelentes funcionários, excelentes gestores das empresas. É uma juventude que está aberta, a Z é uma transição da tecnologia, e essa que vem agora, a alpha nascida depois de 2010 será mais avançada. A minha neta de 4 anos de idade sabe mexer no celular melhor do que eu! Eu para aprender a digitar fiz uma escola de datilografia! Essa juventude nem sonha em ir a uma escola de datilografia! E digitam muito mais rápido do que a gente! O celular dessa juventude é como se fosse uma extensão do corpo! Eles não se fecham como algumas gerações anteriores se fechavam em algumas verdades! Esses jovens são protagonistas, são mais democráticos. Aceitam pensamento plural.
Você tem um exemplo prático para citar?
Vou dar um exemplo pontual. Um excelente aluno nosso na ´área de exatas, temos o habito de todos os anos convidar ex-alunos para fazer uma palestra, esse aluno tinha cursado Engenharia Mecânica na Unicamp, foi quando ele me disse que não estava trabalhando como engenheiro, ele disse que estava no mercado financeiro, coordenando uma equipe que compra dividas de bancos. Alguém faz uma devida com um banco, por exemplo, a ser paga em 24 prestações, essa empresa em que o engenheiro trabalha, compra a dívida do cliente, adquire por menos da metade do valor, e vai recebendo os valores do devedor. Ele foi uma pessoa que a vida toda se preparou para ser um grande engenheiro mecânico, estudou em uma das melhores universidades do Brasil, e foi atuar no mercado financeiro! A meu ver, essa geração poderá ter muitos problemas no campo pessoal. Crises existenciais. Como tudo para eles é passageiro, nada é definitivo, eles trocam de parceiro como você escolhe uma mercadoria no mercado. Tem pontos positivos e negativos, a sociedade vai ter que enfrentar isso.
Muitos comportamentos podem mudar?
Nunca houve tantas adolescentes fazendo cirurgias plásticas! Elas não fazem para sentirem-se melhor, fazem cirurgias para os outros! Para se enquadrar no estereótipo da sociedade.
Voltando a falar do José de Marco, você pratica algum esporte?
Eu tive um acidente praticando esporte, há alguns anos, tenho uma prótese interna na perna esquerda. Até alguns anos atrás, cria um pouco, jogava futebol, hoje por conta da idade o futebol não dá mais. Gosto de jogar sinuca, os meninos na escola ficam muito bravos comigo porque tem o jogo de pebolim, e eu jogo muito bem pebolim, sinuca. Eu gosto de brincar com a criançada no pátio. Como hobby tenho a leitura, muita leitura.
Que palavras você diria aqueles que estão deixando de ser jovens e entrando na vida adulta?
Primeiro, olhar para trás e ver aquilo que o deixou feliz na juventude. Quando você vê que vivenciou momentos de felicidade, é uma forma de mantê-los sempre. A pessoa as vezes, na medida em que fica com mais idade, deixa de brincar, esses dias postei um vídeo que provocou inúmeros contatos, ligações por telefone, mensagens. Estávamos assistindo futebol, todos os meus netos estavam aqui, as crianças dos vizinhos, perguntaram-me: “Vovô, podemos ir na chuva? ”. Disse-lhes: “ Lógico que podem! Foram todos para a chuva, sentaram na guia, na enxurrada, correram na água. Jogar água um no outro. Esses momentos, aqueles que estão entrando na fase adulta não podem perder. São momentos mágicos! A segunda coisa que considero importante é olhar para o outro na perspectiva de se ser confidencial na vida do outro, hoje mesmo, logo pela manhã, me ligou a menina que é Coordenadora da Pastoral, um habito que ela tem quando tem algum problema ela me liga, para vermos se dá para agirmos, buscarmos soluções muitas vezes com o apoio de entidades de serviço como Rotary e outras similares. A solidariedade é fundamental! E leitura, ler muito, acho que os livros nos permitem uma viagem que leva a reflexão do nosso cotidiano. Portanto devemos permanecer com o coração de criança, para ver as coisas belas da vida, não se enferrujar, e ao mesmo tempo adquirir conhecimento, para que o conhecimento mantenha o máximo possível nos momentos de felicidade, daquilo que é positivo. Sempre na perspectiva do outro. Ninguém consegue ser feliz sozinho. Minha netinha mais nova, de quatro anos, quando anoitece ela procura a lua, as estrelas para olhar. Olha para as plantas, para as flores. A vida é curta, passamos pela vida sem olharmos para as coisas belas que ela nos oferece. Se você consegue se manter uma criança, um adolescente, e valorizar essas coisas belas a vida fica muito mais prazerosa.
Você é um entusiasta da educação, da formação do indivíduo.
Parece que não, mas é um diferencial a Prática Pedagógica Salesiana! Todos com quem converso e não conhecem a pedagogia salesiana, a primeira coisa que me perguntam é: “Como você um cidadão livre, trabalha em uma instituição religiosa, não tem limite lá? Eu gosto quando me fazem essa pergunta. O criador da Pedagogia Salesiana; Dom Bosco, viveu no contexto da unificação italiana, período de guerra, derramamento de sangue, o Garibaldi lutando, ele era extremamente radical. Lutou aqui no Brasil também, na Revolução Farroupilhas. Esse padre viveu esse momento da Itália, período em que a Igreja perdeu todas as suas terras, durante a consolidação da unificação, as igrejas foram saqueadas, destruídas. Quando chegaram no oratório desse padre, os revolucionários começaram a arrastá-lo para fora, para bater nele. E os lideres chegaram e disseram: “Nesse não! ”“ Isso porque ele já vinha construindo o seu método de ensino que hoje está presente no momento, que se sustenta em três premissas básicas. Que tem muita proximidade com Rousseau, a mesma visão de escola de educação. Primeiro o carinho, há que se ter o carinho, você não pode educar alguém se esse alguém não reconhece que é amado por você. Essa troca tem que ter: o carinho. Outra coisa que é fundamental: o uso da razão. Esse padre na época foi poupado porque ele já tinha consolidado que a racionalidade e a razão eram importantes. Quando olho uma escola do SENAI hoje, eu vejo o projeto de Dom Bosco. Ele foi o primeiro padre a ter escola profissionalizante naquela época. Ele pegava os meninos de rua, levava para o Oratório, ensinava uma profissão, depois ele ia arrumar emprego para esse menino. Ele fez dentro da Itália o primeiro contrato de trabalho. Por mais que o tempo tenha passado, esses princípios de carinho, razão e a questão da religiosidade estão presentes nas Escolas Salesianas. Ele nunca foi radical, tanto que a Igreja Católica por um período proibiu que ele ministrasse sacramentos. Ele foi perseguido pela própria Igreja. Rousseau também aceitava a religião, mas na sua fase adulta. Ou seja a diferença entre Rousseau e Dom Bosco era em que fase da vida o indivíduo deveria optar pela religião, Dom Bosco defendia a ideia da criança já aceitar. Uma parte da sociedade ainda tem uma romanização do que é a escola essa visão tira um pouco a racionalidade. A escola em si, sempre foi e tem que ser conservadora. Como a sociedade busca enquadrar a juventudes naquele modelo, ela é por excelência conservadora. Essa visão romantizada, as vezes faz com que os políticos não olhem para a educação como deveriam olhar. Eles temem que se a escola caminhar no mesmo passo que a sociedade possa levar um caos na sociedade. A família espera que a escola eduque seus filhos para serem bem-sucedidos e não para criar indivíduos revolucionários. Isso não significa que a escola possa ter em alguns momentos debates e reflexões que estejam na frente da sociedade. Nós temos que dar ferramentas para o aluno, como ele irá usa-las no futuro é uma decisão dele. Não estamos aqui para doutrinar ninguém.
Como você vê a Escola Militar?
Eu estou fazendo uma experiência. Aqui em Piracicaba tem um cursinho para militares e futuros militares, que funciona com toda prática pedagógica militar. O que eu vejo nessa escola é o que eu via na minha escola, e que faço questão de cobrar no Colégio Dom Bosco. Pelo menos nas datas mais importantes. Eles não entram na sala de aula sem cantarem o Hino Nacional. Ele tem aulas de ginástica, como no passado nós tínhamos. As Escolas Militares trazem um princípio de respeito mútuo. Tanto que tem um projeto assinado pelo nosso ex-governador, que dava a possibilidade de militares ajudarem nas escolas públicas. Infelizmente em algumas escolas públicas o excesso de liberdade ultrapassou todos os limites, gerando a libertinagem.
O Dom Bosco Assunção segundo alunas de muitas décadas passadas era muito rígido.
O Cocego Dom Bosco tem disciplina! Temos dois coordenadores de disciplina, se o aluno não se manter como deve, é feito um relatório, enviado para os pais, o objetivo não é punir a criança ou o jovem, é para que eles compreendam que para viver em sociedade é necessário ter e obedecer a regras básicas.
Como educador experiente, de forma sintética, como explicar ações irracionais com arma de fogo, ou arma branca, principalmente ocorridas nas escolas americanas?
Quando houve o Referendo sobre armas de fogo no Brasil, levei no colégio para debater com alunos e pais um sociólogo que era a favor do armamento, o proprietário de uma loja que vende armas, e levei mais duas pessoas contrárias ao armamento, fizemos essa discussão. Claro, continuamos o debate em sala de aula. A questão básica é que os EUA estão passando por uma crise brutal que não conseguimos enxergar da mesma forma que como enxergamos as crises daqui. Essa crise nos EUA é que leva aquelas ações que acompanhamos e de vez em quadro. As crianças, os adolescentes, gritam e se não são ouvidos, acabam cometendo ações como essa.
Atualmente você tem quantos alunos?
Posso afirmar em uma conta rápida que são 680 alunos. Acho que todos os anos me convidam para ser paraninfo ou homenageado é porque começo a dar aulas para eles no oitavo ano e vou até o terceiro ano quando ingressam em curso superior.