PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 23 de janeiro de 2016.
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
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Sábado 23 de janeiro de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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ENTREVISTADO: ANTONIO (TONY RODRIGO) RODRIGUES
ENTREVISTADO: ANTONIO (TONY RODRIGO) RODRIGUES
Antonio Rodrigues nasceu a 1º de setembro de 1940 na cidade de Andradas, no Estado de Minas Gerais, é filho de Manoel Rodrigues e Ana Teixeira Rodrigues, que tiveram treze filhos sendo que Antonio é o mais novo. Seus pais eram de Amarante, Portugal. No Brasil chegaram em 1912, desceram no porto de Santos, e dedicaram-se ao cultivo agrícola. È interessante ressaltar que Manoel e Ana já se conheciam em Portugal, mas namoraram e casaram-se no Brasil, em Jacutinga. Permaneceram em Andradas até 1942. Antonio Rodrigues reside em Piracicaba, é além de tudo um artista no violão e dono de uma voz que deixa toda e qualquer platéia maravilhada. Sempre solicito, canta pelo prazer, participou de grandes programas em televisão e rádio. Gravou musicas em Compact Disc (CD). É um artista completo que por opção pessoal seguiu a carreira profissional em outra área, que também envolve muita técnica e arte, a de modelista. É um dos grandes nomes da história da indústria automobilística nacional. Casado em segundas núpcias com Lina Valentim Rodrigues.
Você nasceu em Andradas e foi criado em que cidade?
Nasci em Andradas e fui criado em São Paulo. Fomos morar na Vila Alpina. Mudamos para São Caetano do Sul onde meu pai adquiriu um terreno e construiu uma casa. , estudei na Escola Dom Benedito Alves de Souza. Minha primeira professora foi Maria Soledade. O ginásio eu estudei no Instituto Rocha Pombo.
Você já estava trabalhando?
Comecei a trabalhar aos nove anos, tinha que ajudar a família. Meu pai fez uma caixinha de engraxate, eu ia para o campo de futebol e exercia minha atividade. Ia almoçar em casa, depois ia para o Clube da General Motors, havia jogo de boliche, eu ficava levantado pinos até umas quatro ou cinco horas da tarde. Eram pinos de madeira. Fiz isso até os doze anos, fui trabalhar em uma loja cujo proprietário era do São Caetano Esporte Clube. Eu gostava de jogar bola ele acabou me levando para treinar no time. Jogava como ponta esquerda. Só parei porque aos 17 anos tive um acidente durante um jogo, um adversário com chuteiras com cravos atingiu minha perna. Permaneci 45 dias em casa me recuperando, foi um corte extenso. Passei a jogar ping-pong, hoje denominado de tênis de mesa, no SESI em São Caetano. Fomos campeões intermunicipais, ganhamos o campeonato do ABC e região: São Bernardo, São Caetano, Diadema , Piraporinha e Ribeirão Pires. Como exercício individual, pratiquei natação. A GM – General Motors tinha um grupo de escoteiro, participei desse grupo. Comecei a freqüentar o SENAI, passei a trabalhar na Aços Villares, naquele tempo ficava-se seis meses na Escola SENAI e seis meses na fábrica. E a noite eu estudava o colegial. Na Escola de Desenho 28 de Julho fiz o curso de desenho técnico. Isso em uma época em que havia fila para entrar nas salas de aula colocava-se um a mão no ombro do colega da frente, cantava-se o Hino Nacional. No Dia da Bandeira cantava-se o Hino à Bandeira. Fiz o curso SENAI durante o dia e também o SENAI a noite, onde fiz o curso de modelação, na Escola Castro Alves C-22, no Cambuci. Quando me formei na minha carteira de trabalho colocaram como “Aprendiz Qualificado”.
Da Villares você foi trabalhar em que empresa?
Fui trabalhar na Ford. No inicio tive que desempenhar funções diferentes da que pretendia: eu queria ser modelador. Nessa época surgiu o Renault, Dauphine, Gordine, ajudei a montar todas as máquinas da linha de montagem, eu sempre ia ao Departamento de Engenharia, queria saber quando passaria para a modelação. Até que em um dia no Departamento de Estilos da Jeep Willys estavam precisando de um modelador. Permaneci lá quase 10 anos, já pertencia a Ford. No Departamento de Estilos trabalhei desde 1963 até 1967.
O que fazia o Departamento de Estilos?
Na época para sair um carro novo na rua demorava-se três anos, um especialista em desenho recebia sugestões do carro desejado, ele então desenhava aquele carro. Ai vinha para o modelador, geralmente diziam: “-Queremos que voce faça isso aqui em escala 1 por 5”. Ou seja, exatamente igual, só que em tamanho cinco vezes menor. As rodas eram torneadas em madeira, com dois pauzinhos fazíamos a longarina, colocava-se um pedaço de compensado em cima, fazíamos uma gaiola, colocávamos longarinas onde é o capô, o teto, em cima daquilo colocávamos um barro especial que colocado em estufa ele amolecia, era preenchida a superfície além do limite, o que estava no papel era feito em escala 1 por 5, saia direitinho.
Tem que ter uma mão de escultor para fazer, ou seja, tem que ser artista?
Entra arte, técnica, o artista não trabalha bem com medida, trabalha mais com proporção. Vinha um desenho para nós com comprimento, largura, bitola, altura, por exemplo, a altura com relação ao chão era padrão. Assim como a altura do para choque, dos faróis, altura do teto.
E as curvaturas?
As curvaturas íamos sempre nos baseando nas medidas do comprimento, largura e altura, dentro da altura máxima fazíamos uma longarina que chegava ao teto, na linha de centro. Depois fazíamos mais duas linhas coordenadas, uma de cada lado em relação a linha de centro. Acompanhando o desenho. Para fazer as curvas tínhamos ferramentas próprias, espátulas, uma infinidade de curvas francesas, era uma escultura técnica.
Tinha que ser artista para fazer isso tudo?
Eu não me considerava um artista. Na modelação voce faz o desenvolvimento de superfície. Tem que ter noções de raios. Uma vez fizemos o modelo de um carro cujo emblema era o Diabo montado no garfo. Fizemos o protótipo, naquele tempo havia uma exposição de carros no Ibirapuera. Não foi aprovado porque o chassi era tubular. Quando a pessoa subia em uma calçada com o carro não conseguia abrir a porta. O Departamento de Estilos no Brasil começou naquela época. Os carros que chegaram aqui foram o Dauphine, Gordini. O Simca veio depois. Da Ford fui para a General Motors onde trabalhei por quatro anos, depois fui para a Chrysler onde trabalhei por cinco anos. Quando trabalhei na Simca fizemos o Dodge Polara, era um carrinho bonito, forte. Na GM fui o primeiro funcionário a ser admitido como Modelador de Estilo. Entrei como Modelador Senior. Lá eu trabalhei de 1967 até 1972.
Modelador de Estilo era uma figura rara na época?
Não existia! Tanto que quando fui para a Chrysler fui como supervisor, a Simca estava sob o comando da Chrysler, fui buscar modeladores conhecidos meus, que já eram do ramo. Se anunciasse a vaga não aparecia ninguém. Na GM trabalhei na criação do Opala, o nome faz referência a uma pedra, o mentor desse nome foi um designer chamado Carlos Alberto de Oliveira. O diretor de engenharia disse que íamos inventar um carro aqui. Eu dava estimativas: vai demorar tanto tempo, quero tantas horas, preciso disto, o pessoal que estava junto comigo se empenhava para entregar tudo no prazo pré estabelecido. Lembro-me que na Chrysler ia vir o painel de instrumentos do Dodge Charger, estávamos aguardando a vinda do painel, julgaram que não tínhamos condições de fazer um painel de luxo, compatível com o carro. Sugeri que fizéssemos um painel, para mostrarmos que também, sabíamos fazer. A nossa equipe fez o painel, utilizando o material que era da época, os americanos vieram, fizeram uma palestra de umas duas horas, quando acabaram a apresentação, mostramos nosso painelzinho, ficaram encantados, o nosso painel é que acabou sendo adotado. O painel que eles fizeram tinha muito aço bisotado, muita coisa que brilhava, e dentro do carro não se pode colocar elementos que dê reflexo com a luz, tanto durante o dia como a noite. Nós tínhamos um painel todo de madeira, naquele tempo usava-se o jacarandá e por dentro colocamos cerejeira, com todos os relógios marcadores muito bem posicionados. Na época não existia computador, era tudo feito na prancheta. Atualmente até as pranchetas são motorizadas. Naquela época era tábua formando a prancheta pantográfica e a famosa régua “T”. Era maravilhoso na época, eu gostava. Na Ford tínhamos um desenhista, Hans, ele trabalhou depois na revista Medicina e Saúde, no Hospital das Clinicas eles pegavam um coração, um pulmão, o Hans desenhava com absoluta perfeição e riqueza de detalhes. O Hans era o responsável por todos os desenhos da revista. Era uma sumidade. Para automóvel também ele era muito bom, quando ele chegou o Brito já estava lá.
É uma parte da história automobilística do Brasil que poucos conhecem.
Há fatos interessantes, curiosos. Uma vez o Charles de Gaulle presidente da França veio nos visitar, o Interlagos é uma versão do carro francês Alpine, o Presidente Castelo Branco deu um carro Interlagos de presente para Charles de Gaulle, era um monstro de homem, tinha quase dois metros de altura, como iria entrar naquele carro esportivo? Ele só ameaçou entrar, abriu a porta, a cabeça dele batia. Ele agradeceu, disse que ia dar a seu filho. Dali a uns dois meses saiu uma brincadeira: Castelo Branco foi visitar Charles de Gaulle, ganhou uma gravata! Era sabido que Castelo Branco tinha pescoço muito curto.
Na General Motors você participou de grandes projetos?
Fizemos o projeto do caminhão Chevrolet Brasil, da Veraneio. A famosa caminhonete Marta Rocha era importada e montada no Brasil. Feito aqui foi a F-100 da Ford. A Chevrolet fez a C-10, C-14, D-20 que é fabricada até hoje. Deixei a indústria automobilística, em 1975 houve a crise do petróleo, fecharam cinco fábricas da Chrysler: da Argentina, Colombia, Venezuela, Brasil. Quando me chamaram para ir trabalhar na Chrysler eu já não queria trabalhar na indústria automobilística. Queria trabalhar em um local menos fechado, fui trabalhar com vendas na Melhoramentos, na Abril Cultural. Um funcionário da Chrysler foi duas vezes me procurar em casa, decidi ir até lá. O Celso me levou até a sala do chefe do departamento, era Pedro Falcone, um argentino que tinha trabalhado comigo na General Motors e havia aprendido muito conosco. Fui convencido a trabalhar, entrei como supervisor, com um salário substancial, veículo da empresa, começamos a caçar pessoas de talento no mercado, montamos um departamento de estilo na Chrysler, em frente a Volkswagen, na Via Anchieta. Trabalhei para a Volkswagen, fiz a maquete da Variant e acho que da Kombi também. Para a Mercedes-Benz fiz um para choque de plástico para caminhão, fiz uma versão de plástico, naquele tempo eram para choques de ferro. Fiz um modelo e um protótipo.
A Kombi não veio com o projeto pronto da Alemanha?
Veio, só que ela sofreu umas modificações, era muito fraca, sofreu modificações nas colunas, tubulação, suspensão, recebeu inclusive uma entrada de ar, era muito abafada.
Há profissionais das mais diversas áreas envolvidos na produção de um veículo?
Na Ford tínhamos três decoradoras: uma cuidava da parte de estofamento, outra da parte externa e outra das cores. Havia um painel enorme, com, por exemplo: tons de verde, tons de todas as cores. Com isso ela tinha uma enorme variedade de opções.
Voce trabalhou em outras empresas com modelação?
Após ter trabalhado na indústria automobilística trabalhei na Modelação Atlântica, na Fast Ship, uma indústria de barcos de corrida e iates, pertencente ao Grupo Souza Ramos. No caso de barcos a aerodinâmica é primordial, tanto as quilhas, como diversos componentes que influenciam muito. A minha participação era só na parte externa, na aparência.
Da Fast Ship você foi para onde?
Fui para Nova Iorque, Estados Unidos, trabalhar em carpintaria naval. Lembro-me bem de que fui preparado para o frio, com roupas e bota forrada com lã, quando desci estava com a temperatura de 40 graus centigrados. Eu tinha um sobrinho que morava lá, ele tinha insistido muito para que eu fosse para lá. Ele era engenheiro na Laminação de Metais no ABC e a esposa era secretária executiva. Lá eles trabalhavam como diaristas, ganhavam um salário bem maior do que aqui onde eram profissionais qualificados.
Quanto tempo você permaneceu nos Estados Unidos?
Fiquei um ano e oito meses. Eu já conhecia o inglês técnico, lá trabalhando com americanos, voce passa a pensar em inglês e não tem alternativa a não ser falar em inglês. Fui fazer um curso de inglês lá e a diretora da escola tinha morado em Goiânia por nove anos.
De lá você foi para que local?
Voltei ao Brasil, comprei um apartamento na Vila Prudente. Em 1991 decidi vir para o interior, adquiri uma chácara em São Pedro, era terra nua, fiz o projeto da casa, construí, enquanto não ficava pronta fiquei hospedado na casa da minha irmã a uns 300 metros. Fiz a cerca, buraco, poço. Fiz toda parte de hidráulica, alvenaria.
Como iniciou o seu gosto pela música?
Comecei quando tinha doze a treze anos. Fui coroinha na Matriz Nova de São Caetano do Sul. Depois passei para a Cruzada Eucarística, fui da Liga Católica. Eu ia para a Congregação e às vezes cantava no coro da igreja. Durante dez anos fui coralista do Coral Clássico e Folclórico Baccarelli do maestro Silvio Baccarelli a sede era na Rua Nazareth, no Ipiranga.
Que voz você faz?
Sou segundo tenor. Estudei com meu ex-sogro. Um dia estava mexendo nas minhas coisinhas, ele disse-me: “–Toninho! Você toca bem! Voce conhece musica?” Ele passou a me ensinar aquela Bona (método completo para divisão musical). Eu gosto de compor, naquele tempo já tinha escrito alguma coisa, ele me levou a Chantecler, mostrei umas musicas, gostaram, me mandaram para o Morumbi, para a Bandeirantes, fui falar com o maestro Cocho, ele me deu um cartão para falar com o Caetano Zama. Arrumaram-me para cantar nas emissoras associadas cantei na Rádio Clube de Santo André, na Rádio Cacique de São Caetano. Fui crooner da Orquestra Carinhoso do maestro Osvaldo. Tive uma dupla sertaneja famosa em São Paulo chamava-se Rodrigo e Rodrigues. O meu parceiro chamava-se Madiel Rodrigues Figueiredo. Tivemos um programa na Radio São Paulo durante uns quatro anos, chamava-se “Recital Sertanejo”. Voltei a cantar sozinho. No meu primeiro casamento não tive a felicidade de ter filhos, no meu segundo casamento tive dois filhos. Eu cantava em uma casa chamada Cana Verde, no bairro Santa Cecília. Comecei a cantar musicas de Milionário e José Rico, Miguel Aceves Mejía, Pedro Vargas. A casa encheu outra vez. A Lilian Gonçalves um dia passando lá viu aquele tumulto todo, ficou escutando eu cantar, convidou-me: “Vai lá ao meu restaurante!”. Fui, cantei no Bastidores, na Biroska I , Biroska II, na Toca, trabalhei com ela por uns seis meses.
Ganhava bem?
Dava para levar. O que mais me desanimou é que meus filhos estavam crescendo com o pai ausente. Um dia eu disse a meu parceiro que tocava guitarra, era um boliviano, disse-lhe que assim que terminasse o contrato iria parar. Ele era proprietário da empresa CIMA, era uma indústria que vendia perfis de alumínio para serralheiro. Ele ofereceu emprego como vendedor. A oferta foi boa, aceitei. Eu cantava no Clube Piratininga, onde havia a Festa Baile. O Agnaldo Rayol e Francisco Petrônio cantavam lá. Conversei com o Agnaldo, ele me convidou cantamos juntos “Galopeira”. Passei a trabalhar com a Promel que fazia fechaduras, assim tive duas representações. Tornei-me evangélico, aos poucos fui deixando o meio musical. Cheguei a vender musicas, compostas por mim.
Quantas composições você tem?
Umas 300 ou mais.
Tem algum motivo que desperta uma determinada inspiração?
O problema do compositor é o tema. O que mais rola no mundo é a música romântica. A música reflete o grau de escolaridade, de cultura. Infelizmente estamos perdendo valores importantes. O ritmo não é tão importante, o fundamental é a mensagem que a musica transmite.
Você cantou e várias emissoras de rádio e televisão.
Cantei na Record, foi onde conheci Thais de Almeida Dias, como jurada, na Cultura, Tupi, Rádio Clube de Santo André, Rádio Cacique de São Caetano. Vendi uma música que eu tinha composto, o cantor que adquiriu a musica é famoso e fez muito sucesso, não posso revelar nada da negociação. porque tenho um contrato assinado que inclui o sigilo total. Quando vendi tinha uns vinte anos.
Você participou de shows abertos?
Participei com shows onde cantaram Wilson Simonal, Luiz Fontana, Dino Franco, Tião Carreiro, Abel e Caim, Os Vips. Cheguei a fazer shows em Rorâima, Barretos, Porto Velho, Jaboticabal, Rio Preto, Inhandiaára. Uma vez eu estava cantando uma música de Agnaldo Thimóteo, ele estava presente com o irmão dele Major e o Mitta. Ele disse: me: “Olha, irmãozinho, você não sabe como é emocionante alguém cantar a música da gente! Voce conhece a malandragem da musica, você tem jeito”. A música não é só cantar.