Sábado 15 de agosto de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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Em 9 de novembro de 1.869, bem antes de tornar-se o primeiro presidente civil do Brasil, Prudente José de Moraes Barros, decidiu morar com a família na casa da rua Santo Antonio, esquina com a rua Treze de Maio. Durante 32 anos a casa pertenceu ao presidente, morto em 1902. Nesse endereço, o republicano promoveu inúmeras reuniões de onde saíram diretrizes políticas que fizeram à história do País. A planta original do prédio tombado é delineada em “L”, contemplando duas casas em só corpo e um chalé que era utilizado por Prudente de Moraes como escritório de advocacia. A construção, em estilo colonial e imperial, é típica das residências urbanas da segunda metade do século 19. Antes de pertencer ao ilustre republicano, o imóvel pertenceu a José Lobo Albertini e foi adquirido por 10 mil réis. Dezessete anos após a morte do republicano, a casa tornou-se sede da antiga Faculdade de Odontologia “Washington Luiz”, que teve seu nome mudado em 1932 para “Prudente de Moraes”. Foi também escola de Farmácia. Em 1935, a faculdade encerrou suas atividades. Cedida pela família ao governo do Estado, o imóvel foi sede do Grupo Escolar Prudente de Moraes e da Delegacia de Ensino. Somente em 13 de agosto de 1956, seria fundado o Museu Histórico e Pedagógico, que, até 1968, ocupava somente uma sala do prédio. Em 35 anos de atuação, a Sampm (Sociedade Amigos do Museu Prudente de Moraes) empenhou-se pela restauração do prédio da Casa do Presidente e pela conservação do acervo, e para recuperar elementos originais da casa do primeiro presidente civil, tendo á frente a incansável Maria da Glória Silveira Mello, bisneta de Prudente de Moraes. A Secretaria Estadual de Cultura, o Prefeito Barjas Negri, a Secretária de Cultura Rosângela Camolesi além do restauro do prédio e acervo, trazem um conceito inovador para os mais diversos segmentos da população que devem visitar o Museu Prudente de Moraes.
Renata Gava é especialista em Patrimônio Histórico e atualmente Coordenadora Geral do Museu Prudente de Moraes. Renata nasceu em Piracicaba, em 29 de maio de 1978, realizou o curso de História na Unimep, trabalhou no acervo de João Chiarini, no acervo do Museu Profª. Jair Araújo. O Museu Prudente de Moraes é administrado por uma OS (Organização Social), a Candido Portinari, que é um novo sistema do governo estadual na abordagem da cultura. Estruturado em duas áreas distintas e complementares: a administrativa e financeira e a área técnica. Estabelece uma visão atualizada e dinâmica para tratar a cultura, com a participação efetiva dos mais diversos setores da sociedade.
Renata, o acervo do Museu Prudente de Moraes estará á disposição para consultas?
Vamos disponibilizar o nosso acervo para consultas, sob um controle efetivo, que será mais rigoroso se assim for necessário, visando a preservação do mesmo. O acesso é voltado para áreas afins. Através do nosso banco de dados, o interessado a irá escolher o objeto da consulta, realizará a sua pesquisa da maneira adequada, tratando a obra com os cuidados técnicos necessários (uso de luvas, máscaras), haverá uma supervisão técnica presente para ajudá-lo. É interessante observar que os procedimentos para essas consultas são diferentes daqueles adotados em uma biblioteca comum.
Alguns livros do acervo pertenceram a pessoas ilustres?
Alguns livros da área de direito pertenceram ao Dr. João Sampaio, genro de Prudente de Moraes. O Dr. João Sampaio iniciou sua atuação, como advogado, por intermédio de Prudente de Moraes, trabalharam juntos.
Durante o período da reforma do prédio o acervo permaneceu no prédio?
O acervo foi levado para um local permanentemente monitorado e que oferecia segurança para preservar a integridade do mesmo. Houve um grande trabalho de catalogação, organizado por tipologia, envolvendo uma equipe especializada de restauradores, museólogos, fizemos o arvoramento do nosso acervo, a higienização e a pesquisa histórica. Foram cinco frentes de trabalho que estavam coordenando, com grandes profissionais da área. A Organização e Higienização dirigida pela restauradora e conservadora Daisy Stra, na equipe de Catalogação e Arrolamento, tivemos grandes museólogos na supervisão. A Museografia, que implica no espaço expositivo, na cenografia, iluminação, como o acervo será tratado, como será exposto, na contextualização do objeto junto com o texto, nas ilustrações, tudo é feito para pensar no conjunto. Ambiente por ambiente é projetado. A forma de exposição, iluminação, qual o propósito. Foi feito o aforamento, conferida peça por peça, o Estado tem a listagem. Essa relação está em um banco de dados. Sou a coordenadora do Museu Prudente de Moraes, mas é importante destacar que a museóloga Angélica Fabri é a responsável pela direção de todo esse trabalho.
Atualmente qual é o horário de funcionamento do Museu Prudente de Moraes?
Funciona de terça-feira a domingo, no horário das 9:00 ás 17:00 horas, seguindo padrão internacional. A visitação é fechada ao público ás segundas feiras. É quando nós realizamos os trabalhos necessários para a reabertura na terça-feira.
Quanto custa o ingresso para visitar o Museu?
Nada! É curioso, mas algumas pessoas fazem essa mesma pergunta.
O Museu Prudente de Moraes tem projetos voltados á comunidade?
São projetos que vamos desenvolver com a sociedade. São vários níveis de atuação, abrangendo diversas faixas etárias.
Renata, como é “morar” durante o seu período de trabalho na casa em que Prudente de Moraes morou?
Fiz parte da equipe de elaboração do projeto museográfico, coordenado pela Cecília Machado, o Moacir Corsi que tratou a museografia (cenografia, iluminação), e três pesquisadores: Marcelo Cachioni, que tratou a evolução urbana de Piracicaba, a Maira Grigoleto cuidou do lado político de Prudente, e eu cuidei do aspecto político e privado de Prudente. Sou defensora nata de Prudente, a gente sente a energia, há um envolvimento pessoal. Aqui trabalho como coordenadora, participando de tudo, mas na minha casa, no meu final de semana, é estritamente direcionado á pesquisa. Você se envolve, vive ás 24 horas do dia isso tudo.
O que a impressionou em Prudente de Moraes?
O que direcionou o meu foco de pesquisa foi a sua fala dita ao ser eleito presidente da república: “Sou Prudente no nome, Prudente por princípios e Prudente por hábito, sou também Prudente procurando evitar questões pessoais odiosas.” Isso me chamou bastante a atenção, ele mesmo se auto-definia. O seu perfil como pessoa, pai de família e como político. Ele foi sempre muito meticuloso e articulado. Foi um grande propagandista. Sair de um sistema monárquico e passar para um sistema republicano, pode-se imaginar o que isso significou e como foi trabalhar toda uma nação. Teve que ser construída uma imagem, uma identidade. O sentimento de nação teve que ser construído. Essa gigantesca obra não foi só de Prudente, mas ele foi um dos principais articuladores dessa construção, da propaganda do ideal republicano.
A pesquisa sobre Prudente de Moraes foi realizada em que locais?
Ela foi realizada em nível nacional, foi feito um levantamento histórico! Encontramos no Rio de Janeiro muitas informações, em São Paulo, Itu, Presidente Prudente.
Quais são as diferenças de atuação do museu antes e depois da reforma e reestruturação?
Hoje é mais interativo. Ao mesmo tempo em que a pessoa está lendo um texto ela está vendo o objeto exposto, e a tecnologia (vídeo) interage. São informações oferecidas por várias maneiras. Era esse o nosso propósito. Hoje os museus trabalham com essa metodologia.
Qual foi a reação dos visitantes ao encontrarem o museu em sua nova fase?
As pessoas nos procuram para fazer elogios. Procuramos trabalhar com várias frentes de informações, isso não está explicito. Só que as pessoas percebem, elas não fazem uma análise técnica como nós, mas elogiaram muito o trabalho em si. Isso é muito gratificante.
Qual é a importância do Museu Prudente de Moraes para Piracicaba e para o Brasil?
Prudente de Moraes foi o primeiro presidente civil eleito pelo povo. Essa é uma grande importância. No contexto em que vivemos hoje, a República, existe graças também a ele. Temos que passar essa conscientização para a população. Se hoje somos cidadãos com direitos é uma conseqüência da própria República.
Como era Prudente de Moraes como pessoa?
Em relatos, cartas pessoais o que se nota é que era muito amável com os seus filhos. A sua preocupação era de ser uma pessoa correta, uma pessoa exemplar para seus filhos. Isso eu pude perceber nas suas cartas. Sem contestação, era uma pessoa regrada. Temos expostos cadernos de anotações dele. Ele era muito sistemático. Ao mesmo tempo era amável, procurava ajudar as pessoas, ele era uma pessoa justa. Honestíssimo, e não era rico. Eu o considero um grande propagandista da República. Ele acreditou, sonhou e lutou por isso.
Prudente de Moraes faleceu acometido por qual doença?
Pela tuberculose. Ele era uma pessoa sistemática, tinha um autocontrole de saúde imenso. No seu caderno de anotações marcava o seu peso, o peso da sua esposa. Era um homem alto e magro. Afastou-se por um período da vida publica para fazer uma cirurgia de extração de calculo renal. Isso em uma época em que o risco de morrer em uma operação dessa natureza era bastante alto.
Ele tinha alguma fruta preferida?
A jabuticaba! Ele tinha verdadeira paixão por jabuticaba. Nós plantamos simbolicamente, aqui no museu dois pés de jabuticaba, nossa idéia é usá-los para trabalharmos nas ações educativas a serem realizadas pelo museu.
O foco de trabalho do Museu é voltado para quais faixas etárias?
Vamos trabalhar com alunos do curso primário, do ensino médio, pessoas da terceira idade. Dentro de cada projeto iremos desenvolver as atividades pertinentes.
Qual são as reações das diversas faixas etárias em visita ao museu?
As reações mais engraçadas sempre são das crianças. Quando entram no museu elas vêm tudo diferente, observam de forma diferente, tanto os objetos, os textos como as imagens. Ao mesmo tempo em que falam da barba usada por Prudente de Moraes, hoje não é habito o uso de barba. Para uma pessoa de meia idade era usual!
Prudente de Moraes era uma pessoa reservada?
Era bem reservado. Mesmo sendo um homem que foi vereador, deputado provincial, deputado geral, governador, senador e presidente da república. Um dos seus apelidos era “Caipira de Piracicaba”, e isso é que traz admiração, como ele conseguiu chegar a tão grande nível. Deve se considerar que na época Piracicaba era uma cidade com bastante expressão no cenário nacional. Havia um grande número de escravos, isso significava que também havia um grupo maior de pessoas de elite, e a elite era política.
A reestruturação e reforma física do Museu Prudente de Moraes deve despertar maior interesse do público com relação à importância histórica de Prudente de Moraes?
O museu foi feito para a sociedade. Queremos trazê-la para dentro do museu. Estaremos desenvolvendo projetos e programas para que isso ocorra.
Como historiadora, para você, qual é a importância dessa nova fase do Museu Prudente de Moraes?
Eu cursei história focando a minha profissionalização na área da preservação, a minha especialização é em patrimônio histórico. Isso me faz muito feliz em poder estar trabalhando no Museu Prudente de Moraes. E acreditar nessas frentes de trabalho que serão desenvolvidas. Como coordenadora não fico restrita a cuidar apenas do museu, o museu é uma interação, não é apenas uma informação. Ao mesmo tempo em que há uma exposição, existe uma equipe cuidando da preservação. Isso é também uma frente de trabalho. Quando trazemos as crianças ao museu, é outra frente de trabalho, são ações educativas. A criança tem uma visão diferente do adulto. A pessoa de mais idade está focada no objeto, algo que a remete a um tempo que ela viveu. Ela não se atenta á informação. A criança tem o objeto, as ilustrações e faz a ligação desse todo com o texto.
A reserva técnica do museu já está organizada?
Quando falo em reserva técnica, me refiro a guarda de objetos. Ela já está montada, seguindo padrões internacionais.
Museu Prudente de Moraes. Entrada gratuita ao público. Rua Santo Antônio, 641. Informações: 3422-3069.