WILSON ROBERTO TIETZ
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF Jornalista e Radialista joaonassif@gmail.com
Sábado, 23 de maio de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://www.teleresponde.com.br/ http://blognassif.blogspot.com/
O memorável jornalista Geraldo Nunes, já falecido, trabalhou por muitos anos no Jornal de Piracicaba. Um empresário de Piracicaba, também já falecido, estava comemorando o seu aniversário em uma chácara e resolveu convidar Geraldo Nunes para o almoço festivo, isso foi em um sábado. Após encerrar suas obrigações junto ao jornal, o jornalista estendeu o convite a um jovem recém-admitido para também ir á festa. Outras duas pessoas juntaram-se, formando um grupo de quatro convidados para o almoço. Na época Geraldo Nunes tinha uma Caravan, a estrada ainda era de terra. Ao chegarem à porta de entrada da chácara avistaram a maior festança. Por um ato de rebeldia a Caravan resolveu encalhar. Imediatamente os convidados deixaram á festa e foram resgatar o veículo, sem permitir que seus ocupantes descessem. Uma demonstração de extrema cortesia. Com tantas mãos empurrando, logo o automóvel estava em seu leito natural. O jovem jornalista olhou com profundo respeito para Geraldo Nunes e soltou: “-Puxa Seu Geraldo! Eu não sabia que o senhor é uma pessoa tão importante!” Do alto da sua experiência e sabedoria Geraldo respondeu: “-O Jornal de Piracicaba é importante! No dia em que eu não trabalhar mais no jornal e estiver andando a pé, pode ser que qualquer uma dessas pessoas nem me ofereça carona.”. O jovem jornalista se calou. E nunca mais se esqueceu dessa história. O nome desse jovem jornalista é Wilson Tietz. Hoje ele acumula uma longa folha de serviços prestados, vereador eleito em cinco eleições consecutivas exerceu os cinco mandatos na Câmara de Charqueda, em um período de 22 anos. Atualmente é vice-prefeito de Charqueda, Presidente do Conselho de Curadores da FUMEP – Fundação Municipal de Ensino de Piracicaba, Gerente Comercial do Jornal de Piracicaba onde começou a trabalhar no dia 10 de outubro de 1978.
Como a família Tietz foi para a região de Charqueada?A família Tietz estabeleceu-se na região abrangente pelo hoje município de Charqueada, isso foi em 1885. Naquela época os imigrantes ao adquirir um terreno consideravam a água existente no local como fator decisivo para a compra. As casas eram construídas próximas á bica de água, onde houvesse uma nascente. Eles entendiam que havendo água em abundancia o resto eles iriam conseguir. Formava-se uma horta, plantavam frutas, faziam vinho. Havia a cultura de subsistência, plantava-se arroz, feijão milho. O meu bisavô, Júlio Tietz foi o patriarca da família Tietz, o primeiro a vir para o Brasil, a minha bisavó é da família Bombazaro, cujo patriarca chamava-se Jacob Bombazaro, Vieram em uma colonização, deixaram a Europa, onde havia uma crise muito acentuada. Na região de Campinas, em Helvécia, Julio e Jacob conheceram-se, permaneceram por algum tempo, e logo em seguida houve a oportunidade de comprarem uma área de terras no Córrego da Onça. A família Bombazaro adquiriu uma parte e a família Tietz adquiriu outra parte.
Que língua eles falavam?
O Júlio falava alemão. Os Bombazaro eram de origem italiana, em pouco tempo passaram a se entenderem. Moravam próximos, compartilhavam a mina de água, que existe até hoje. No acordo da compra do sítio ficou determinado que mesmo situando-se no sítio dos Tietz os Bombazaro tinham a cessão de uso dessa mina, fato que serviu para a aproximação das duas famílias.
As casas em que moravam eram construídas por eles mesmos?
Seu Júlio era carpinteiro, tinha uma facilidade muito grande em lapidar a madeira. A base para as estruturas das casas era feita com pedras, lavravam a madeira que podia ser cabriúva, araruva. A peroba e o jequitibá eram mais utilizados para fazer as janelas, o acabamento da casa. Os troncos tinham a base maior, arredondado, assim como era encontrado na natureza, essa parte ficava junto ao solo, era então feito um patamar e lavrando a madeira deixavam as suas paredes em forma de vigota com quatro faces semelhantes entre si. As casas eram construídas sem nenhum prego, nem arame, todo o travamento era feito através de encaixes, com um formão realizavam um corte de tal forma que a madeira ao se encaixar já ficava travada. As casas eram feitas de barrote, as paredes utilizavam em sua parte interior o bambu. No ponto em que o tronco deixava a sua forma arredondada para ter cantos retos, era encaixado o madeiramento do assoalho, sempre acima do solo, uma forma de proteção contra a ação de agentes naturais e climáticos.
Qual é o nome dos seus pais?
Sou filho de Antonio Tietz e Geni Balarim Tietz, nasci em 3 de janeiro de 1960. O meu pai trabalhava no Departamento de Estradas de Rodagem. Era uma pessoa que lia muito jornal, ouvinte da Hora do Brasil. Talvez seja um habito adquirido por hereditariedade, Rodolpho Tietz, filho de Júlio Tietz, recebia uma vez por mês o exemplar de um jornal alemão, esse jornal vinha em navio e depois era trazido pelo trem até a estação de Paraisolândia. (N.J. A estação de Paraizo foi inaugurada em 1888, por volta de1940, teve o nome alterado para Paraisolândia). Após retirar o jornal, Rodolpho Tietz reunia-se com as pessoas moradoras no sítio, sentava-se em um tronco de cabriúva, que era uma tora, denominada por eles de banco, ele lia as notícias trazidas pelo jornal alemão.
Houve muitos casamentos entre os membros das famílias Bombazaro e Tietz?
A família Tietz teve muitos filhos homens, e formam uma geração grande, a famlia Bombazaro teve mais mulheres como descendentes, com isso o sobrenome Bombazaro é visto em menor número de pessoas, em decorrência da tradição de prevalecer o sobrenome do pai. A família Tietz é enorme. Houve muitos casamentos entre Bombazaro e Tietz.
Em que escola você iniciou seus estudos?
Estudei na Escola Mista do Bairro Córrego da Onça. É interessante observar que essa escola surgiu quando Rodolpho Tietz cedeu metade de sua casa para ser escola, sem ônus algum para a localidade. Mais tarde, seu filho João Semmler Tietz doou o terreno para a construção de uma nova escola. Ali estudei até o quarto ano, em seguida fiz o ginásio e o colegial em Charqueada, na Escola Estadual Benedito Dutra Teixeira.
Como se deu o seu ingresso na faculdade?
É uma história interessante! Pelo fato do meu pai ler muito, acompanhar os fatos pelos noticiários veiculados pelo rádio, ser uma pessoa muito atenta ao campo da comunicação, o negócio dele era sintonizar o rádio em esportes e noticias, sempre acompanhou os fatos ocorridos na política mundial. Ele incentivou muito para que estudássemos, e o seu sonho era que fossemos jornalistas, ele sempre foi um defensor da profissão de jornalista. Com seu rádio modelo Transglobo onde através de suas faixas de Ondas Médias, Curtas, Longas sintonizava inúmeras rádios no mundo, até em Moscou, ou na Bélgica, onde houvesse sintonia. Ele sempre foi um entusiasta da comunicação! Em 1977, meu pai estava ouvindo a Rádio Difusora de Piracicaba, isso no Dia do Jornalista, o apresentador Edirley Rodrigues estava fazendo uma entrevista com o já falecido jornalista José ABC. Discorrendo sobre a profissão de jornalista, José ABC enalteceu as maravilhas da profissão. O locutor e jornalista Edirley perguntou a José ABC qual era a sua impressão sobre os aspectos financeiros da profissão. Zé ABC, como todos os chamavam informalmente, disse então que ser jornalista é mais uma missão, existe casos de algumas pessoas que ganharam muito dinheiro, mas a grande maioria trabalha por amor a camisa, por paixão, um abnegado. Foi então que ele disse estar surgindo uma profissão nova na área de comunicação: a Publicidade e Propaganda, onde ele via um espaço muito grande, o profissional estaria em contato com o mercado. Na época nem se falava marketing, dizia-se que ia trabalhar com “reclame” (N.J.: Anúncios publicitários). Depois disso, meu pai disse mim e para o meu primo José Edvaldo Tietz o que tinha ouvido no rádio, e que deveríamos conversar com o Zé ABC. Na época éramos garotos, tínhamos 17 anos de idade. Com o ônibus da Viação Trevisan, viemos os três para Piracicaba, e fomos conversar com o Zé ABC. Assim ingressamos na área de publicidade. Prestamos o vestibular na Unimep, fomos aprovados e passamos a estudar. Em 10 de outubro de 1978 vim para Piracicaba.
Ao mudar-se para Piracicaba, qual foi a forma encontrada para manter-se em comunicação com a família que havia ficado no sítio em Charqueda?
No sítio não havia telefone, em Paraisolândia tinha um telefone daqueles que usavam manivela, pedia-se para a telefonista fazer a ligação. Correio era um meio muito precário. O meu primo Edvaldo que também veio para Piracicaba, o seu pai havia conseguido para ele um emprego de empacotador nas Lojas Riachuelo. Fui até a Rádio Difusora, falei com o apresentador Ary Pedroso, disse-lhe que precisava arrumar um trabalho para poder pagar a faculdade. Ele passou a anunciar através do rádio a minha disponibilidade para trabalhar. Eu ficava na Praça José Bonifácio esperando. E assim foram semanas de espera. Um dia passou pela praça um amigo de Charqueada e disse que a Caterpillar estava precisando admitir funcionários. Foi o período de implantação da empresa em Piracicaba. O Gallani estava entrevistando os candidatos, fui selecionado e passei a trabalhar na Caterpillar como ajudante de montagem, seis meses depois eu estava na inspeção de máquinas. Eu precisava fazer horas extras e a Caterpillar valorizava muito as pessoas que trabalhavam aos sábados, domingos. Nesse tempo eu morava com a minha tia Pina. O meu primo Edvaldo foi trabalhar no jornal “O Diário”. Nós já nos tratávamos um ao outro chamando de “compadre”. Ele me disse:
“-Compadre, tem uma vaga no Diário”! Fiz um teste, passei, e então surgiu uma grande interrogação da minha vida, eu estava ganhando o suficiente para pagar a escola, sobrava um pouco, só que no jornal estaria trabalhando no campo que estávamos estudando. Consultei meu pai, ele deixou a decisão por minha conta. Quando fui pedir a minha demissão recebi uma contraposta muito interessante, bastante atraente. Acabei indo trabalhar no Diário, de onde saí alguns meses depois. Decorridos algum tempo, fui trabalhar como porteiro no Edifício Orsini. Eram seis horas de jornada no prédio, a noite fazia a faculdade, sobrava um tempo. Fui até o Jornal de Piracicaba, onde encontrei Salmeirão Aires, o “Psiu”. Ele trabalhava na Philips e aos sábados coordenava a área de assinaturas. Ele disse-me que precisava realizar uma ação de vendas de assinaturas do Jornal de Piracicaba em Charqueada. Aceitei o desafio e fiz um bom número de assinantes na cidade.
Assim você passou a ser um elemento comercial do Jornal de Piracicaba?
Comecei a vender assinaturas para o Jornal de Piracicaba. Ganhava o suficiente para integralizar a mensalidade da faculdade. Mudei meu horário como porteiro no prédio, da meia noite até as seis da manhã, entrava na faculdade ás sete horas da noite e saía ás onze horas da noite. Tinha um apartamento vago no décimo terceiro andar, colocava um colchãozinho e dormia. Comia no Restaurante do Peixinho que ficava em frente ao prédio. Durante o dia vendia assinaturas do Jornal de Piracicaba. Era uma jornada louca! Isso foi por uns seis meses. Em outubro de 1978 passei a trabalhar como funcionário na área de publicidade.
Como funcionário efetivo, qual foi um dos primeiros trabalhos realizado por você?
O José ABC estava trabalhando em cima da edição de Natal. Comecei a trabalhar junto aos comerciantes do Mercado Municipal. Bolei uma foto da fachada do mercado, fiz um layout, e saí vendendo. O primeiro anuncio vendi na Banca da Maria Portuguesa. Por duas semanas trabalhei no mercado e fechei a página. Parti para uma outra de auto-escolas, fiz outra página com postos de gasolina, eram segmentos que não havia ninguém trabalhando. Criei um segmento. Para a edição de Natal consegui vender várias páginas. Fiz o “Palpitão” no jornal, que era o resultado da loteria esportiva. Fui criando e agregando. No final de 1978 trouxe o Edvaldo para o Jornal. Ele criou um meio de publicidade segmentado, fez o comércio da Rua Boa Morte. Trabalhamos como sócios, dividíamos as nossas comissões! Trabalhamos por mais de quinze anos juntos.
Até hoje vocês se tratam por “compadres”?
Nós éramos compadres por brincadeira, depois passamos a sermos compadres de verdade, ele até foi meu padrinho de casamento. Em batizados de nossos filhos um foi o padrinho do filho do outro.
Como foi o seu ingresso na vida pública?
Entrei através do Ari Pedroso, do Tim que é o Antonio Vicentim Neto lá de Charqueada. O Tim sempre foi um estudioso de política. Ele tinha uma lojinha, e ali era o comitê político da cidade, lá estiveram o João Hermann Netto, Orestes Quércia, Ari Pedroso. Alguns detalhes chamavam a atenção no Tim: tinha uma visão muito precária, era estrábico, além de ser surdo e gago! E era político! Foi o meu grande mentor político. Ele me ensinou muito. Lembro-me de uma passagem bastante interessante. O Tim como presidente do diretório político cuidava de todas as documentações do partido. Na época o seu partido era o MDB. Era uma época em que se aproximava a eleição para prefeito e vereadores, elegia-se um vereador com 130 votos. Um dia chegou um cidadão, com sotaque dos naturais do nordeste do país e disse para o Tim: -“Eu queria ajudar um candidato, tenho uma família grande, são 150 votos! Só que preciso construir uma casinha, necessito que esse candidato me ajude a construir uma casa!” O Tim, gago, perguntou-lhe se realmente tinha os 150 votos, e se queria construir uma casinha, porque ele tinha um negócio melhor para ele. Tim entrou por uma porta em direção ao fundo da casa. Eu fiquei lá na lojinha, junto com o cidadão. O homem estava todo entusiasmado, devia estar pensando que o Tim fora tomar alguma providencia para concretizar a sua oferta. Logo depois o Tim voltou, com o livro de ata e as fichas de filiação. E disse ao detentor dos possíveis 150 votos: “Você tem 150 votos, você está eleito! É só assinar a ficha e sair candidato! Você não precisa ajudar ninguém!”. Na verdade não havia voto nenhum, fora tudo fruto da imaginação daquele sujeito.
Como eram os pronunciamentos do Tim?
Ele tinha um carisma muito grande. Tinha muito conhecimento, sabia como redigir um ofício, foi ele quem me ensinou a solicitar as primeiras reivindicações. Ele foi por diversas vezes vereador em Charqueada, inclusive o plenário da câmara eu sou o responsável por ter dado o seu nome, Antonio Vicentim Neto. Nos seus pronunciamentos ele gaguejava, e isso criava uma expectativa pelos seus pronunciamentos. Ele colocava os termos de uma forma muito hábil. Tinha os admiradores do conteúdo da sua fala. Foi um grande mestre da política em Charqueada.